segunda-feira,25 novembro, 2024

O que se aprende em uma Faculdade de Jogos Digitais?

O sonho de trabalhar com o desenvolvimento de jogos fez parte do imaginário de muitas crianças e jovens nos anos 90, quando a mídia ainda era desconhecida para grande parte da população. Hoje, apesar de a plataforma ainda ser de nicho, multiplicou-se o número de pessoas que enxergam no video game uma forma de se realizar profissionalmente.

Apesar de muita gente que tem esse sonho ser consumidora ativa de jogos eletrônicos, é comum não saber como funciona uma escola de jogos. Afinal, um aluno que estuda sobre game passa o dia inteiro jogando? Para sanar essa e outras dúvidas, o Voxel conversou com professores da Faculdade Méliès e preparou uma série de matérias sobre o tema.

Nesta primeira parte, nós conversamos com os desenvolvedores de jogos e professores da Méliès, Rafael Lucio de Matos e Lia Fuziy, que explicaram que, sim, um estudante na área vai jogar o dia inteiro. Mas há um adendo importante a se fazer sobre isso.

Faculdade Meliès

Sala de aula na Faculdade Méliès. (Foto: Faculdade Méliès/Divulgação)

“Você vai jogar o dia todo, mas vai jogar o dia inteiro o mesmo jogo. O aluno vai jogar a mesma parte que está quebrada inúmeras e incontáveis vezes. Tudo para que aquele trecho seja corrigido e para que seja possível levar o projeto adiante”, pontua o professor.

Quais matérias um aluno de jogos estuda?

Fuziy pontua que o mercado de desenvolvimento de jogos está se ampliando cada vez mais e que há diferentes métodos didáticos. No caso da Faculdade Méliès, ela é uma instituição de ensino que pensa a formação de maneira integral.

“Além da questão técnica, de programação, artística e de design, por exemplo, nós formamos o estudante na parte de gestão. A ideia é oferecer ferramentas não só para que seja possível entrar em uma empresa, mas para abrir o próprio negócio caso deseje”, diz a professora.

Sobre a grade curricular, uma pessoa que pretende trabalhar com jogos digitais estudará temas como:

  • Arte 2D: desenvolvimento de conceitos artísticos para jogos em Pixel Art, por exemplo.
  • Fundamentos da Programação: nessa aula, o aluno aprende o fundamento da Programação, formulando conceitos de linguagens de programação, além de reconhecimento de métodos de solução de problemas.
  • Game Design: a disciplina de Game Design visa introduzir para os alunos o universo de desenvolvimento de jogos. Durante as aulas são apresentados conceitos para entender quais são os elementos que constituem um jogo e como esses elementos são organizados para que ele possa funcionar e ser capaz de engajar seus jogadores.
  • Modelagem: workflow para modelagem de assets visando produção de levels, bem como a produção de personagem; diferenças entre assets modulares e props.
  • Roteiro: estudo sobre a história do desenvolvimento das bases da linguagem audiovisual, além da teoria e prática laboratorial do roteiro, da decupagem e da montagem audiovisuais para Cinematic.
  • Engenharia de software: nessa aula o aluno aprende a importância de projetar um jogo, identificando seu escopo e seu processo de desenvolvimento.
  • Animação digital: explorar, dentro de um ambiente virtual 3D, os 12 Princípios da Animação.
  • Level design: nessa aula o aluno aprende a fazer análises de jogos e sua concepção. Além de planejar, documentar e criar fases.
  • Luz, textura e shader: conceitos de Iluminação realtime; conceitos de materiais e shader PBR; workflow para criação de texturas voltada para jogos: Texturas Modulares, Texturas Unicas e Trim Sheet.

Na Méliès, há ainda uma disciplina chamada de Projeto Integrador. “A matéria serve para reunir o conhecimento que os alunos estão aprendendo em todas as outras aulas. Ela está presente em todos os semestres e deixa o curso interdisciplinar o bastante para que todos possam entender como os assuntos se intercalam durante a produção de um jogo”, argumenta Matos, que leciona o assunto.

O professor também defende a importância de aliar o conhecimento teórico com o prático. Ele comenta que por causa disso, a cada semestre os alunos produzem um game diferente, já que a experiência faz que os estudantes entendam os desafios técnicos e práticos de se trabalhar com jogos digitais.

“No primeiro semestre, normalmente os alunos e alunas trabalham em um jogo analógico. Depois eles passam para um em 2D, depois 3D e assim vai ficando mais complexo. A ideia é que as matérias e a ‘mão na massa’ façam todos eles ter uma visão em 360 graus”, salienta o professor.

Faculdade Meliès

Workshop de jogo realizado na Faculdade Méliès. (Foto: Faculdade Méliès/Divulgação)

“Na área de jogos, o portfólio é o carro-chefe de um profissional. Então evoluir e ir aperfeiçoando é a porta de entrada para entrar de vez no mercado. Por causa disso, entendemos que é essencial que eles já comecem o curso fazendo games próprios”, complementa a professora Fuziy.

Qual é o perfil de quem quer desenvolver jogos?

Apesar das quatro décadas, a indústria de games ainda sofre com estereótipos. É comum que pessoas que não consomem com frequência a plataforma imaginem que todos que trabalham no setor são os típicos nerds que adoram computação, matemática e outros temas da área de Exatas. Os professores Méliès fazem questão de desmistificar o assunto.

“No primeiro semestre nós temos estudantes de todos os tipos possíveis. Temos pessoas que acabaram de sair do colégio e que gostam de jogar video game. Tem gente que estava em outra área, gente que não gostou do curso que estava fazendo e acabou saindo, gente que viu que [o mercado de jogos] está crescendo. A maioria dos estudantes são jovens, mas não é incomum estudantes de 30 e até mais de 40 anos”, lembra Matos.

Faculdade MelièsEventos na Faculdade Méliès (Foto: Faculdade Méliès/Divulgação)

Lia Fuziy faz um recorte de gênero e adiciona que apesar de a maioria dos estudantes serem homens, o público feminino tem marcado presença. Ela cita, inclusive, que as mulheres já são maioria no público gamer, principalmente quando o mobile é considerado, segundo a Pesquisa Game Brasil (PGB).

“Ainda temos uma defasagem histórica, mas tem aumentado e muito o interesse das meninas em jogos. E nós queremos mostrar para as jovens que elas podem, sim, desenvolver. Para isso, nós temos iniciativas como a ‘Change the game’, que é um programa que teve quase 1,5 mil participantes na última edição. Nele, elas recebem mentoria e são incentivadas e apoiadas a fazer presença na indústria”, afirma a professora, que é uma das mentoras do programa.

Quais habilidades um estudante de games precisa ter?

Os docentes da Faculdade Méliès também concordam que há poucos (ou quase nenhum) requisito para uma pessoa começar a estudar o desenvolvimento de games. Enquanto Fuziy cita que é preciso ter muita força de vontade, Matos defende que nenhum conhecimento técnico é exigido para um iniciante.

“Ao contrário do que muita gente pensa, não é preciso necessariamente saber fazer conta ou já ser um programador. Qualquer pessoa que se interessa por praticamente qualquer área do conhecimento consegue começar na graduação de Jogos Digitais. O que nós queremos dizer é que a indústria está aberta para gente criativa, que conhece história, que gosta de resolver problemas, que quer aprender sobre negócios, que gosta de escrever, que curte desenhar e muito mais. Cada habilidade é importante na hora de desenvolver um jogo, já que cada pedacinho fica por conta de uma pessoa”, ele afirma.

“Nós temos uma aluna que tinha se formado em Biologia e depois começou o curso de Jogos Digitais. No jogo dela, ela colocou peixes brasileiros, por exemplo. Isso mostra como um aluno pode usar um know-how que já tem para trabalhar fazer um game. Nós também temos gente de Arquitetura e Edificações que acabam trabalhando com Level Design, por exemplo. Ou seja, nenhum conhecimento é perdido e mesmo alguém que tenha pouca ou nenhuma base pode aprender muito”, finaliza Fuziy.

Faculdade Meliès/DivulgaçãoEvento reúne alunos e professores na Faculdade Méliès. (Foto: Faculdade Méliès/Divulgação)

Esta é a primeira parte de uma série de matérias que o Voxel desenvolveu em parceria com a Faculdade Méliès. Para saber mais, acompanhe o nosso site e nosso Twitter!

Por Carlos Palmeira

Redação
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