Em entrevista ao jornal espanhol El País, o professor da Universidade de Oxford afirma que a sociedade terá de discutir se a IA se trata de uma nova espécie, e defendeu que as decisões em relação à tecnologia não fiquem sob controle apenas dos desenvolvedores da IA

Conhecido por suas aulas bem-humoradas, o matemático londrino Marcus du Sautoy, 58, professor de Compreensão Pública da Ciência na Universidade de Oxford, utiliza todas as ferramentas à sua disposição para aproximar as pessoas da ciência — jogos, música, teatro e até truques de mágica. Ele se considera um “tecno-otimista”, e mesmo assim fez um alerta para os perigos da inteligência artificial.

Em entrevista à jornalista Verónica Garrido, do periódico espanhol El País, du Sautoy afirma que existe a possibilidade de que a IA se torne consciente em algum momento. “Nesse ponto, acho que talvez tenhamos que falar sobre uma nova espécie”, disse ele. Nesse cenário, o matemático acredita que a humanidade teria que considerar conceder direitos à IA da mesma forma que os direitos dos animais.

“Penso que teremos de nos perguntar se estamos a desenvolver uma nova espécie, se isto é uma evolução daquilo que estamos fazendo, ou se teremos de considerar uma nova espécie híbrida, o que é provavelmente a perspectiva de integração inteligência artificial em nossa própria espécie. Elon Musk está considerando a ideia com a Neuralink. A sua resposta à ameaça existencial da inteligência artificial é que não, devemos tornar-nos nela, devemos integrar a inteligência artificial e os humanos, o que irá gerar novos dilemas filosóficos, sociais e jurídicos no futuro”, explicou.

Por enquanto, ele acredita que a humanidade está numa fase de mudança e que mesmo os profissionais da indústria ficaram surpresos com o quanto a IA é poderosa. “Você realmente precisa entender como [a IA] funciona para utilizá-la de forma eficaz, porque ainda é preciso entender que funciona estatisticamente, no sentido de que ela entende quais são as palavras mais prováveis ​​para seguir os parágrafos que já viu. E isso nem sempre lhe dará coisas que são necessariamente verdadeiras, então você tem que ser muito cético em relação ao que parece incrivelmente convincente”, acrescentou.

Questionado se a consciência da IA pode chegar em breve, ele disse que não. “Acho que a consciência está muito distante. A consciência num computador será provavelmente muito, muito diferente da nossa consciência, e esse será um dos problemas interessantes: se conseguiremos saber quando sabemos”.

Poder na mão de poucos

Marcus du Satoy ainda alertou para o fato de que, neste momento, as decisões sobre os rumos da IA estão nas mãos dos desenvolvedores tecnológicos. “O poder está principalmente nas mãos daqueles que estão na indústria e que desenvolvem estas ferramentas, e é por isso que temos de integrar a sociedade na tomada de decisões, e é por isso que o governo deve estar envolvido”, defendeu. “Não podemos deixar que apenas os criadores das ferramentas decidam como elas serão regulamentas”.

Apesar disso, ele se diz ainda muito otimista do ponto de vista técnico. “Acho um pouco fantasiosa a narrativa distópica de que seremos aniquilados como sociedade. Não creio que seja aí que reside a verdadeira ameaça. Penso que é uma ameaça à democracia e penso que são nessas áreas que devemos ter cuidado. Somos muito maleáveis, facilmente influenciados pelas coisas, e essas ferramentas são muito boas para nos desviar. Então, acho que é aí que vejo a ameaça, não como uma ameaça existencial à nossa espécie”, disse.

Texto: Louise Bragado, Época NEGÓCIOS