Lançaram negócios em residências universitárias, com heranças das famílias, multiplicaram fortunas à boleia da tendência tecnológica do momento. Um deles, tem segurança permanente.
Como é que uma empresa de ares condicionados pode gerar um milionário da inteligência artificial (IA)? Na verdade, a explicação é simples: no fim dos anos 60, quando viajou pela primeira vez de Taiwan até Nova Iorque para trabalhar numa empresa do setor, o pai de Jensen Huang decidiu que os dois filhos iriam estudar para os Estados Unidos.
Jensen Huang lidera a NVIDIA, cujas ações valorizaram 200% em 2023
“Nos anos seguintes, a minha mãe ensinou-nos inglês para nos preparar”, contou o fundador da NVIDIA ao programa Mad Money, da CNBC. “Não sabia nada de inglês, mas todos os dias escolhia aleatoriamente dez palavras do dicionário, pedia-nos que as soletrássemos e que explicássemos o significado.” E foi assim que, aos 9 anos, Jensen Huang foi viver para a América, onde viria a fazer-se multimilionário – primeiro dividiu casa com um tio, aos 10 anos mudou-se para uma residência no Kentucky, cujas casas de banho limpava todos os dias para ganhar algum dinheiro.
No mês passado, a NVIDIA tornou-se pela primeira vez a terceira companhia norte-americana mais valiosa em Bolsa, atrás da Microsoft e da Apple e à frente da gigante Google. Porquê? Porque depois de ter liderado o mercado das placas gráficas, tornou-se uma das empresas mais importantes noutro setor: a produção de chips utilizados em modelos de IA, como o do ChatGPT, que também fornece à Meta, Spotify, Google, Amazon e Microsoft.
A ascensão meteórica da NVIDIA é uma das evidências de que a inteligência artificial está a tornar os ricos ainda mais ricos, diz a Bloomberg. O ano passado, as 500 maiores fortunas do mundo aumentaram mais de 110 mil milhões de euros – 96% deste valor deve-se a participações em empresas ligadas à inteligência artificial. E se a NVIDIA foi a empresa que mais valorizou (apesar de continuar a valer muito menos que a gigante Meta, de Mark Zuckerberg), vários outros nomes estão a ganhar (muito) dinheiro com a tecnologia do momento.
A fortuna daquele que foi o mais jovem CEO da Fortune vale 104 mil milhões de dólares (95 mil milhões de euros)
Um deles é Michael Dell, que a 1 de março se tornou a 12ª pessoa mais rica do mundo – a sua fortuna ultrapassou, pela primeira vez, os 100 mil milhões de dólares. Porquê? Porque a sua Dell Tecnologies Inc. vende cada vez mais servidores utilizados pela IA.
E aproximadamente metade da fortuna de Michael resulta da empresa que fundou quando ainda estava na faculdade a tentar estudar Medicina, um sonho dos pais – e não seu, como explicaria quando aos 19 anos largou tudo para gerir um negócio que, logo no primeiro ano, faturou perto de 200 mil euros.
Dell foi sempre precoce: aos 7 anos comprou a sua primeira máquina de calcular; ainda estava no secundário quando ganhou 18 mil dólares num único ano a vender assinaturas de jornais; mas foi na faculdade que a sua vida mudou para sempre – a partir do quarto da sua residência, começou a comprar computadores à IBM e a personalizá-los com mais memória e discos maiores.
Teve tanto sucesso que, um dia, o colega de quarto empilhou o stock de computadores junto à porta do dormitório e Michael percebeu que tinha que se mudar para um apartamento maior. Nos primeiros tempos, usava os tetos altos para esconder peças dos pais, que ainda acreditavam que terminaria o curso de Medicina. Não aconteceu.
Em 1984, no primeiro ano completo da empresa, a Dell faturou 6 milhões; foi posta em Bolsa quando Michael tinha 23 anos; em 1992, aos 27, o fundador tornou-se o mais jovem CEO de uma empresa do Fortune 500 (índice que reúne as empresas mais valiosas do mundo); quando tinha 29 a Dell faturou pela primeira vez mil milhões de euros. Pelo meio – Michael tem, agora, 59 anos – houve vários prémios de CEO e de empreendedor do ano.
Quando Lisa Su chegou à presidência da Advanced Micro Devices, as ações da empresa valiam menos de 2 dólares – estão, agora, a mais de 200
Entre os novos milionários – que só se tornaram muito muito ricos com a IA – está uma prima de Jensen Huang, Lisa Su, que lidera a Advanced Micro Devices (AMD), concorrente da NVIDIA. O ano passado, depois de o valor das ações da empresa ter duplicado, a fortuna da empresária nascida em Taiwan disparou para 1,1 mil milhões de euros. Um feito que também lhe valeu vários prémios – até porque em 2014, quando assumiu a presidência, a AMD estava à beira da bancarrota.
Os novos bilionários da IA
Tal como o primo, também Su saiu da China para os Estados Unidos, no seu caso aos 3 anos e com os pais. Aos 7, quando começou a desmontar controlos remotos dos carros do irmão, talvez já fosse possível prever que teria futuro como engenheira.
Chegou à liderança da AMD depois de 13 anos na IBM e em 2019, foi a CEO mais bem paga das 500 maiores cotadas americanas – recebeu 54 milhões de euros. Nenhuma mulher o tinha conseguido antes. Razão suficiente para, numa festa em sua casa, quando pôs 30 convidados a experimentar o Just Dance na sua consola Xbox One (com chips da AMD) ter escolhido para si própria o hit I Will Survive. “Saí-me muito bem”, comentou.
Quem também se tem saído muito bem é Alex Karp, CEO e cofundador da Palantir, especializada em mineração de dados (o que permite que as empresas trabalhem com um enorme volume de informação). Com clientes como o FBI, a CIA e a National Security Agency (NSA), a Palantir tanto pode ser usada para prevenir emboscadas no Iraque, localizar membros de um cartel de droga mexicano ou rastrear os hackers que se tentaram infiltrar no computador do Dalai Lama.
O cofundador da Palantir foi eleito uma das pessoas mais influentes da inteligência artificial pela revista Time
Os exemplos – todos reais – permitiram a Alex Karp (que diz ser filho de uma artista e de um pediatra “hippies”, que em miúdo o levavam a manifestações anti-Reagan) entrar no clube dos multimilionários, com uma fortuna de 1,8 mil milhões de euros. O que também tem custos: Karp admitiu várias vezes ter segurança 24 horas por dia. “Não há nada pior para reduzir a tua capacidade de flirtar com alguém”, disse numa das entrevistas em que falou do tema.
Texto: Ana Taborda