O conceito de sustentabilidade social está cada vez mais presente nas discussões arquitetônicas contemporâneas à medida que a valorização dos usuários — por meio de necessidades subjetivas e não estáticas — tem se tornado protagonista no momento da concepção projetual. A sustentabilidade social na arquitetura trata, portanto, de projetar e construir edifícios e espaços urbanos que promovam o bem-estar, a inclusão e a coesão das comunidades. Ela se concentra na criação de ambientes que viabilizem interações sociais positivas, apoiem diversas necessidades e melhorem a qualidade de vida geral das pessoas que habitam e usam esses espaços. Uma arquitetura socialmente sustentável considera os aspectos sociais, culturais, econômicos e de saúde de uma comunidade, com o objetivo de enfrentar os desafios sociais e proporcionar benefícios de longo prazo aos moradores.
Em linhas gerais, a sustentabilidade social na arquitetura vai além da estética e da funcionalidade para focar no impacto do ambiente construído nas pessoas que o utilizam. Nesse sentido, é fundamental mapear e compreender as necessidades e desejos dos seus usuários finais. Para isso, o envolvimento da comunidade por meio de abordagens colaborativas no processo de projeto se torna uma estratégia importante que auxilia na criação de espaços mais adequados à realidade e suas demandas.
A participação popular nos projetos arquitetônicos e urbanos não é uma novidade, já que, desde a década de 70 muito se tem debatido sobre o tema. Entretanto, pouco parece ter avançado no sentido metodológico e nas formas de expressão, uma vez que a maioria dos processos de projeto aplicados continuam seguindo o posicionamento hegemônico do pensamento intelectivo que fomenta o autoritarismo do arquiteto como — senão o único — o principal tomador de decisões.
Nesse cenário, o processo participativo vem na contramão do individualismo, oferecendo ao usuário um papel ativo durante a elaboração do desenho ao compartilhar as decisões e os caminhos que o projeto eventualmente seguirá. Entretanto, gerenciar a participação coletiva no processo de projeto, principalmente quando se trata de edificações de grande escala que podem e devem atender inúmeros perfis de usuários ao mesmo tempo, se torna um desafio muito mais metodológico do que teórico. Em vista disso, é importante compreender que para efetivar a participação dos usuários leigos no projeto é fundamental oferecer-lhes os meios para acessar os códigos que são sendo apresentados, para que possam entender o que está sendo proposto e, consequentemente, contribuir com a ideia. Caso contrário, o projeto participativo será apenas uma manipulação para legitimar as decisões do arquiteto e de outros técnicos envolvidos no processo.
Na era da interatividade a qual estamos vivendo, são inúmeras as possibilidades tecnológicas de interação às quais os usuários são constantemente expostos e invocados a participar. Muitas delas estão sendo incorporadas no processo participativo de projeto na forma de plataformas virtuais de armazenamento de dados, jogos online que mostram de maneira mais amigável as propostas arquitetônicas e urbanísticas, entre outros. No entanto, alguns métodos mais convencionais ainda são muito importantes para traçar estratégias participativas de projeto. Vale ressaltar, porém, que cada projeto é distinto e requererá a capacidade de flexibilização e adaptação ao seu contexto específico.
Algumas estratégias, por exemplo, focam no levantamento das necessidades dos usuários por meio de encontros e conversas. Nelas, técnicas como rodas de conversa, contação de histórias, construção de mapas para a compreensão do local em questão e o teatro temático que reproduz possíveis vivências no espaço, podem ser vistas. Seu foco está principalmente na definição do propósito do projeto e na simulação de usos e apropriações futuras.
Os workshops comunitários e as oficinas também são considerados nos processos participativos de projeto, proporcionando ambientes para exposição das ideias dos usuários e discussões sobre diferentes pontos de vista, reunindo membros da comunidade, arquitetos, urbanistas e outras partes interessadas. Enquanto os workshops são definidos por uma abordagem mais expositiva, as oficinas oferecem também atividades mais lúdicas ou tarefas de criação conjunta. Elas aproximam os membros da comunidade do processo projetual tradicional, permitindo que contribuam diretamente com ideias e sugestões. Os participantes podem usar ferramentas interativas como maquetes, croquis ou simulações virtuais para explorar as opções de projeto. Essas abordagens mais lúdicas têm se mostrado muito efetivas nos processos participativos devido a legitimidade das simulações da realidade as quais fazem com que os participantes visualizem melhor os problemas e idealizem estratégias para resolvê-los.
Nessa gama de possibilidades metodológicas, as autoras do texto O processo de projeto participativo: algumas considerações sobre o método correlacionam as abordagens bem-sucedidas com quatro pontos: 1. visão, relacionada à observação do contexto real e a introdução de referências; 2. audição, por meio de workshops e oficinas que democratizam o saber; 3. fala, na tomada de decisões em conjunto e na construção de narrativas; e 4. tato, com jogos e tarefas de construção coletiva que incluem maquetes e outros elementos representativos.
Alejandro Aravena, o estúdio chileno ELEMENTAL, é um expoente quando se trata de processos participativos de projeto. A técnica da equipe, focada principalmente na criação de projetos habitacionais para população de baixa renda, pode ser dividida em três etapas. A primeira é a comunicação das restrições aos usuários como fatores orçamentários, índices construtivos, possibilidades de acabamentos etc. A segunda trata-se do momento em que são tomadas decisões em conjunto, quando equipe técnica e os usuários discutem e chegam em consenso sobre diretrizes gerais. E, por fim, a participação bidirecional em todo o processo em uma troca constante que retroalimenta o desenho. Os momentos de atuação do grupo técnico como workshops ou discussões guiadas são considerados gatilhos de processos mais longos desenvolvidos pelos próprios moradores em grupos menores durante as semanas. Em algumas situações também são utilizadas maquetes ou modelos tridimensionais físicos.
Independentemente da técnica ou metodologia aplicada, é importante ressaltar que no processo participativo de projeto o principal papel do arquiteto é correlacionar inúmeros fatores e demandas que vão desde a especificidade geográfica do terreno até os gostos e interesses pessoais dos usuários. Além disso, para os arquitetos que se propõem a atuar em processos participativos é importante que estejam atentos a geração de ambientes que favoreçam a escuta e a interação, oferecendo uma presença sensível e comprometida com a troca.
A riqueza dos projetos desenvolvidos com a participação comunitária é visível tanto construtivamente, com a incorporação de técnicas e materiais regionais e ancestrais, quanto emocionalmente, percebido no apreço e no sentimento de pertencimento que a população tem pelo espaço. Projetos que transcendem a função pragmática e contribuem para o fortalecimento de comunidades mais resilientes, equitativas e prósperas.
Fonte: Garch Daily