Ao longo de quatro anos, a equipe do projeto buscará desenvolver cadeias de valor e inovação sustentável em três localidades do bioma amazônico: Marajó, Transamazônica e Xingu.
Para o lançamento do componente Marajó do projeto, a equipe técnica da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Embrapa Amazônia Oriental e Embrapa Agroindústria de Alimentos participou de palestras, visitas técnicas e diálogos na cidade de Portel (PA), no final de novembro, em paralelo com a V Feira de Ciências do Rio Acutipereira. “Temos uma dívida histórica com o Marajó, e pretendemos trabalhar intensamente para a inclusão social decorrente do desenvolvimento sustentável. Para transformar as realidades amazônicas, precisamos de uma atuação cada vez mais orquestrada de instituições governamentais e não-governamentais, por isso estamos hoje aqui. Contem com a Embrapa”, discursou na abertura o chefe-geral da Embrapa Amazônia Oriental, Walkymário Lemos.
O projeto Sustenta Inova objetiva desenvolver e implementar práticas agrícolas sustentáveis, desenvolver cadeias de valor na Amazônia, com foco na conservação da biodiversidade, redução do desmatamento, restauração da paisagem, mitigação e adaptação às mudanças climáticas, em alinhamento com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). A ideia é expandir as contribuições para o desenvolvimento sustentável obtidas com o projeto Bem Diverso, executado no período de 2016 a 2021, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) com recursos do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF). “Com base no legado no Projeto Bem Diverso, funda-se o Sustenta e Inova. Seu sucesso está baseado no engajamento das comunidades e dos atores locais em suas atividades.
Iniciamos as ações da segunda fase no Marajó, a partir de uma Rede de Desenvolvimento Local Sustentável já formada por mais de 80 pessoas, de seis diferentes municípios de três Estados e do Distrito Federal, 19 entidades, 11 pontos focais de comunidades, 16 facilitadores, sei gestores locais, 12 jovens comunicadores e 40 representantes institucionais, colaboradores e membros de comitês”, relata Anderson Sevilha, pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, e líder do projeto.
Transformar vulnerabilidades em oportunidades
Os 19 municípios das cidades da região do Arquipélago do Marajó reúnem uma população em situação de extrema vulnerabilidade social e econômica, reconhecidos como detentores dos menores índices de desenvolvimento humano (IDH) do Brasil. Para chegar à região, isolada do resto do Estado do Pará, são necessárias pelo menos 16 horas de barco, partindo de Belém. Na zona rural, onde vive a maior parte da população, as casas estão sobre palafitas às margens dos rios, sem saneamento ou serviço de energia elétrica.
“Durante anos, a principal atividade econômica baseou-se na extração e comercialização de madeira com a derrubada da floresta Amazônica. A cidade de Portel nasceu com a fundação da companhia Amacol, uma serraria dirigida pelos americanos. O impacto desta atividade intensiva ao longo de décadas ocasionou forte desequilíbrio ambiental, levando as populações a buscarem alternativas de cunho sustentável após o fechamento da empresa. Daí a importância do trabalho da Embrapa na região”, afirma Raimundo Nonato Teixeira, pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental.
Pelo projeto Bem Diverso, desde 2016, a Embrapa vem atuando na região a fim de desenvolver as capacidades das comunidades e juventudes locais com vistas à conservação, manejo e restauração de espécies e ecossistemas, processamento de frutos nativos, acesso ao mercado, às políticas públicas e ao crédito. Um dos principais resultados do projeto pode ser observado na Comunidade Santo Ezequiel Moreno, da cidade de Portel: a cooperativa Manejaí. Construída sob palafitas, o Centro de Manejo do Açaí, criado pela própria comunidade, abastece a única escola da localidade pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). O Sistema Agroflorestal, com espécies nativas e produtivas, implantado na comunidade e fomentado pela cooperativa, abastece a maior parte dos alimentos servidos na alimentação escolar, composta principalmente por açaí, tambaqui, camarão, mandioca e frutas nativas como taperebá, cupuaçu e bacuri.
Outro resultado do projeto que vem impactando a vida dos agroextrativistas locais é a adoção do manejo de mínimo impacto de açaizais nativos, uma prática orientada pela equipe técnica da Embrapa Amazônia Oriental, que não apenas promove a conservação da Floresta Amazônica, como também a faz mais produtiva. Segundo o pescador e extrativista, Alcindo Morais, da cidade de Muaná no Marajó, desde que abandonou a prática de cultivo intensivo, chamada de açaização, – que diminui a diversidade das espécies da fauna e da flora, causando graves problemas ambientais – e começou a seguir o manejo sustentável tem obtido melhores resultados. A adoção da BRS Pai d´Égua, um cultivar de açaí para terra firme com suplementação hídrica desenvolvido pela Embrapa, também foi um diferencial. “Eu acreditei na Embrapa, muitos não acreditaram. Agora, observo que a planta se desenvolve mais, os cachos são maiores, além de coletarmos na safra de julho a dezembro, também coletamos na entressafra de março a junho, com maior segurança. Estou muito satisfeito”, relata.
Agregação de valor à cadeia de produção de açaí e de outras espécies nativas
A maior parte dos açaís coletados pelas comunidades extrativistas da região é vendida in natura. Uma das atividades previstas no projeto Sustenta e Inova é gerar práticas de agregação de valor e aprimorar o processamento do açaí nativo em estruturas de beneficiamento mínimas a serem instaladas nas próprias comunidades ribeirinhas e também em uma planta industrial da cooperativa Manejaí a ser instalada no município de Portel, no Pará. A ação impactará as famílias que residem em Projetos Estaduais de Assentamentos Agroextrativistas (PEAEX) do Estado do Pará, uma região onde está presente marcante valor histórico cultural, vulnerabilidade social e grande biodiversidade. Apesar das dificuldades, a região vem avançando no acesso às políticas públicas e na participação de lideranças comunitárias nas ações de desenvolvimento sustentável. “Após o diálogo com os parceiros e com as comunidades, identificamos uma demanda de capacitação em boas práticas para pequenas plantas industriais de processamento de açaí, popularmente conhecida como “batedeira” na região norte, e a elaboração de proposta uma mini-planta de processamento de açaí que possa ser instalada em cada comunidade, a fim de garantir um produto seguro e com qualidade para o consumidor“, conta Fénelon do Nascimento Neto, pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos. Para a instalação dessas unidades, a Cooperativa contará com o apoio técnico da equipe de agroindustrialização da Embrapa. “São estruturas de diferentes portes e com objetivos distintos. As batedeiras, que podem beneficiar 200 kg de açaí, por exemplo, fornecem o produto para consumo diário pelas famílias, enquanto que a planta industrial, que terá uma capacidade de processamento de, no mínimo, 1000 kg de fruto por dia, fornecerá polpa de fruta congelada para comercialização no município e também para fora”, afirma Virgínia da Matta, pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
O desenvolvimento de novos produtos, como forma de agregação de valor às fruteiras nativas, é outra vertente de contribuição da equipe para agroextrativistas, manipuladores (batedores), técnicos agrícolas, agentes da vigilância sanitária e integrantes da comunidade escolar, como professores e merendeiras. “Nós assumimos um compromisso com a comunidade, e queremos deixar um legado, que possa reverter no desenvolvimento sustentável e na melhora da qualidade de vida da região”, afirma Fénelon do Nascimento Neto, pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos. A ideia é que os protocolos de boas práticas, validados por pesquisadores da Embrapa, sejam adotados em toda a cadeia de produção de açaí do campo até a agroindústria, beneficiando as famílias extrativistas da região. A publicação “Boas práticas na cadeia de produção de açaí” disponível gratuitamente para download reúne essas informações. Para acessá-la, clique aqui.
Prospecção de espécies nativas com potencial para empreendimentos sociais
Outra ação prevista pelo Projeto Sustenta Inova é a prospecção de espécies nativas com potencial comercial, para que possa compor um portfólio de produtos da biodiversidade na Central Amazônia, a ser implementada nos mesmos moldes da Central da Caatinga e da Central do Cerrado, em operação a partir da execução do Projeto Bem Diverso.
A Comunidade Monte Hermon, da cidade de Portal, já produz de forma artesanal os óleos de copaíba e andiroba para fins medicinais, e agora está estruturando uma pequena agroindústria para expansão da produção. “Observamos nas visitas técnicas realizadas que há um grande potencial de expansão e agregação de valor de espécies nativas na produção de óleos para uso alimentício, cosmético e farmacêutico. Inicialmente vamos realizar um diagnóstico da qualidade dos óleos copaíba e andiroba produzidos na região, a fim de melhorar a qualidade e, em seguida, promover uma troca de experiência entre as comunidades do Marajó e da cooperativa Grande Sertão de Montes Claros, Minas Gerais, para a produção de óleo de buriti, chamada de miriti, muito abundante nas cabeceiras dos rios”, relata Renata Borguini, pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Fonte: Embrapa Agroindústria de Alimentos