Pelo segundo mês consecutivo, o Brasil teve recorde de mortes por Covid-19 em dois terços de seu território: 18 das 27 unidades federativas registraram recordes de óbitos em abril. O mês é, de longe, o pior desde o início da pandemia: foram registradas 82.401 mortes pela doença.

Os dados foram apurados pelo consórcio de veículos de imprensa junto às secretarias de Saúde do país.

Acre, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Piauí, Rio Grande do Norte, São Paulo e Tocantins estão em seu segundo mês consecutivo de recorde nas mortes registradas. Minas Gerais registra recordes consecutivos desde janeiro.

Já Bahia, Paraíba, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima e Santa Catarina – que tiveram recordes em março – registraram menos mortes em abril e não voltaram a bater recorde.

Uma exceção ao resto do país é o Amazonas, que teve uma queda de 47% no número de mortes registradas de março para abril e de 78% em relação a janeiro – quando teve o maior número de óbitos registrados em toda a pandemia no estado (veja gráfico abaixo).

Para a cientista Ester Sabino, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), há quatro motivos que contribuíram para queda nas mortes registradas no estado: o lockdown que foi feito em Manaus, a vacinação, alguma proteção contra reinfecção ou, ainda, o fato de muito da população vulnerável do estado ter morrido antes na pandemia.

Mas a pesquisadora afirma que ainda não é possível dizer qual deles é o mais importante – inclusive porque a vacinação no estado só ganhou força em fevereiro.

“Dá pra perceber um pouco a vacinação, mas eles também fizeram um lockdown duro quando começou a piorar a situação. A gente está tentando entender qual a faixa de reinfecção – se uma pessoa previamente infectada está imune à próxima variante ou protegida. Ela pode ter uma parte da proteção. Aí, você abaixa o número de casos e, se tiver a proteção da infecção anterior, ainda ajuda mais”, avalia Sabino.

Sem previsões

Os especialistas ouvidos pelo G1 afirmam que não é possível dizer que a diminuição vista nas mortes no Amazonas vá ocorrer no resto do país – como foi o caso com o surgimento da variante P.1, detectada pela primeira vez em Manaus e que, depois, se espalhou para o resto do território.

“Uma visão muito rápida parece exatamente isso, [mas] cada local tem uma demografia, uma curva epidêmica, os determinantes sociais, os recursos dos serviços. Então não dá para identificar um marcador: o Amazonas. E, particularmente, o Amazonas é muito diferente do resto do país, até no clima”, pondera o epidemiologista Airton Stein, professor e pesquisador da Universidade Federal das Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).

“A vigilância epidemiológica tem que definir as políticas de acordo com o que está acontecendo em cada local”, completa.

Ele lembra, ainda, que o país não adotou barreiras no deslocamento interno de pessoas.

“É claro que, como é uma doença infectocontagiosa e no Brasil não tem limites de transporte, não tem nenhuma dificuldade de uma pessoa sair de um local para outro dentro do país. Se está ocorrendo um pico epidêmico num local, isso facilmente acaba interferindo com uma outra região”, diz Stein.

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A médica e especialista em saúde pública Ligia Bahia, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), lista 3 maneiras de combater a pandemia: vacinas, testes e máscaras.

“Se usar uma estratégia combinada – da máscara de boa qualidade, testes e vacina – conseguiria ter uma redução [no número de mortes]. Não estou falando nem mais em isolamento social. Estou falando de máscaras de boa qualidade, testes e vacina”, destaca.


“Precisaria muito mobilizar a estratégia da testagem, porque nós vimos que as pessoas continuam trabalhando – entregadores, motoristas – garantir uma segurança para essas pessoas, inclusive para retorno das aulas”, afirma Bahia.

Sem essas estratégias, diz a pesquisadora, não há perspectiva de diminuição nas taxas de transmissão e nem dos óbitos.

“Por enquanto, a gente não tem essa previsão – não pode dizer que vai diminuir. Porque a gente tem um número de doses de vacina muito insuficiente – a previsão sempre diminui, nunca aumenta. A gente mal tem teste para diagnóstico, não tem teste para rastreamento. E, também, as máscaras de boa qualidade não são distribuídas para a população”, lembra.

“Essas taxas de transmissão não vão diminuir, porque a gente não está fazendo nada para bloquear. A gente não tem estratégia de bloqueio, então a previsão em maio continua sendo ruim”, conclui Bahia.

Ester Sabino, da USP, diz que os estudos de modelagem calculam números diferentes de mortes para maio. Alguns parâmetros, diz a pesquisadora – como a reinfecção e se as novas variantes causam ou não uma doença mais grave – ainda são desconhecidos.

“É difícil, demora um pouco para acertar, principalmente quando a gente não tem certos dados. Como o vírus mudou seu jeito de ser, é difícil pôr os parâmetros e dizer o que vai acontecer”, avalia.

Falta de vacinas

A alta nas mortes em abril foi acompanhada pela falta de doses de vacina pelo país, que fez cidades de 18 estados interromperem a aplicação.

O Ministério da Saúde também diminuiu a quantidade de doses previstas para maio: o Brasil deve ter disponíveis 34,5 milhões de doses, em vez de 46 milhões anunciadas inicialmente. A redução é de 25%.

Ao todo, apenas 15,6 milhões de pessoas receberam ambas as doses de alguma vacina no Brasil. O total corresponde a cerca de 7% da população brasileira.

“A gente está num ritmo de vacinação muito inadequado para o nosso contexto epidemiológico, [que é] muito perigoso. Podia estar vacinando muito mais rapidamente, mas não. O que a gente pode esperar – com as coberturas vacinais mais completas e a segunda dose – é que diminua muito o número de mortes”, afirma Ligia Bahia, da UFRJ.

Na quinta-feira (29), o Brasil recebeu a primeira remessa de vacinas da Pfizer, de um milhão de doses. Assim como as outras duas que já eram usadas no país – a CoronaVac e a de Oxford – a vacina da Pfizer também é aplicada em duas doses.

Metodologia

O dado referente às mortes de abril foi calculado somando-se as mortes diárias vistas no mês; os números de mortes dos outros meses de 2021 foram determinados da mesma forma.

As mortes registradas nos meses de 2020 foram calculados com uma metodologia um pouco diferente, mas cujo resultado é o mesmo: subtraindo-se o total de mortes visto no último dia de um mês do total de mortes visto no último dia do mês seguinte (por exemplo: total de mortes em 31 de agosto – total de mortes em 31 de julho = total de mortes em agosto).

O consórcio de veículos de imprensa começou o levantamento conjunto no início de junho. Por isso, os dados mensais de fevereiro a maio são de levantamentos exclusivos do G1. A fonte de ambos os monitoramentos, entretanto, é a mesma: as secretarias estaduais de Saúde.

Outra observação sobre os dados é que, no dia 28 de julho do ano passado, o Ministério da Saúde mudou a metodologia de identificação dos casos de Covid e passou a permitir que diagnósticos por imagem (tomografia) fossem notificados. Também ampliou as definições de casos clínicos (aqueles identificados apenas na consulta médica) e incluiu mais possibilidades de testes de Covid.

Desde a alteração, mais de mil casos de Covid-19 foram notificados pelas secretarias estaduais de Saúde ao governo federal sob os novos critérios.

Fonte: G1

Foto:

Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

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