quinta-feira,21 novembro, 2024

Os desafios da indústria automobilística frente à transição energética

O debate sobre o futuro de qualquer setor produtivo precisa passar pelo tema da transição energética. Isso é particularmente verdadeiro para o setor automotivo, surgido há mais de 100 anos, quando a discussão ambiental não existia como hoje, e nem consolidado o uso quase que exclusivo de combustíveis fósseis. Para sobreviver no século 21, a indústria automobilística precisa oferecer soluções eficazes para reduzir as emissões de carbono.

O dióxido de carbono (CO2) emitido pelos carros não é exatamente prejudicial à saúde humana – exceto, é claro, em concentrações muito elevadas –, mas ele é o mais prevalente dos chamados gases de efeito estufa (GEE). Eles são responsáveis por contribuir para o aquecimento do planeta e, com isso, aumentar os desequilíbrios climáticos que ameaçam desde a viabilidade de terras agrícolas até a sobrevivência de espécies animais. 

De acordo com o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU, o setor de transportes é responsável por 15% de todas as emissões globais diretas de CO2, segundo os dados mais recentes, referentes a 2019. Isso faz do setor a quarta maior fonte de emissões de GEE. Do montante, os veículos rodoviários (carros, motocicletas, caminhões, ônibus) respondem a quase 70% das emissões, enquanto a navegação e a aviação por aproximadamente 11% cada. Os outros 9% são oriundos do transporte ferroviário, demais meios de transporte e emissões indiretas.

Globalmente, veículos elétricos leves têm se consolidado como uma solução tecnológica à medida que as montadoras passam a produzir cada vez mais como resposta às demandas, às políticas e à regulamentação. Ao mesmo tempo, os biocombustíveis são complementares à eletrificação no transporte rodoviário e oferecem oportunidades de redução relevante de emissões de carbono no curto e médio prazos, principalmente em países em desenvolvimento.

O Brasil se destaca na segunda área. Atingimos um nível satisfatório de produção de etanol e biodiesel, o que no caso do etanol se reflete no crescimento exponencial da quantidade de veículos Flex e vice-versa. Esse tipo de automóvel foi introduzido no mercado nacional em 2003. Vinte anos depois, há 47 milhões de carros Flex circulando no país, o que representa cerca de 40% da frota total, de acordo com dados do sistema RENAVAN (Registro Nacional de Veículos Automotores). Só na última década, o crescimento foi de 110%. O VW Gol foi o primeiro modelo de carro a adotar a tecnologia. 

Embora contribua para a redução nas emissões de GEE, é preciso que o motorista de um veículo Flex, de fato, abasteça com álcool, o que nem sempre é vantajoso economicamente. A regra que vale é: o uso do etanol só é vantajoso quando o custo equivale a 70% ou menos que o valor da gasolina.

Segundo os dados de preços de combustíveis da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), desde 2019 o uso do etanol foi em geral vantajoso em 61% das vezes na região Sudeste. Entre as razões está a sazonalidade da lavoura de cana.

Já com relação aos veículos elétricos ou híbridos, o mercado nacional ainda engatinha, apesar de um crescimento relevante nos últimos anos. O estoque atualmente não passa 0,1% do total da frota.

O potencial de mitigação das emissões de GEE só se concretiza se a eletricidade vier de fontes renováveis. O país, como sabemos, tem acionado com muito mais frequência as usinas termelétricas. Logo, um aumento abrupto na frota brasileira de carros elétricos poderia produzir efeito contrário ao desejado, levando, hipoteticamente, a uma piora nos níveis de emissões.

O uso de combustíveis alternativos e a popularização dos carros elétricos são soluções promissoras, mas ainda insuficientes para que vejamos resultados concretos. A eficácia depende de um conjunto de mudanças em toda a cadeia produtiva do setor energético.

O que se percebe é que a indústria automobilística tem buscado saídas para minimizar o impacto no quadro global das mudanças climáticas, mas não tem soluções mágicas, unilaterais. Vencer o desafio ambiental exigirá um esforço coletivo, envolvendo todos os setores da sociedade.

Por: Flávio Passos e Keyi Ussami

Redação
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