Sem medo de mudança, nascidos entre 1996 e 2012 esperam que empresas tenham preocupações climáticas e sociais e valorizam equilíbrio entre vida pessoal e profissional
A geração Z, cuja postura diante do trabalho pode ser vista por alguns como menos engajada, está, na verdade, se mostrando cada vez mais exigente ao considerar uma vaga de emprego. Nascidos entre 1996 e 2012, esses jovens estão mais atentos a temas como saúde mental e sustentabilidade, buscando oportunidades que reflitam essas prioridades. Os dados são da pesquisa Deloitte Global 2024 – Geração Z e Millennials.
“A principal preocupação da geração Z no mundo é com mudanças climáticas e impactos sociais”, afirma Marcos Olliver, sócio da Deloitte responsável pela área de pessoas e propósito, em entrevista a Época NEGÓCIOS. No Brasil, a lista de prioridades desses jovens traz mudanças climáticas, custo de vida, discriminação e saúde mental, nessa ordem. “Essa geração se identifica com uma empresa pelo seu propósito, seja para questões climáticas ou sociais, e busca alinhar esse propósito com o seu próprio”, diz.
De acordo com o estudo da Deloitte, que entrevistou 22.841 jovens de 44 países, essa geração não apenas prioriza questões ambientais e sociais ao escolher empregadores — buscando empresas comprometidas com a sustentabilidade e a diversidade (72%) —, mas também valoriza aspectos como flexibilidade no trabalho (56% dos entrevistados), oportunidades de crescimento (63%), propósito (70%) e saúde mental.
Para Mônica Vargas, superintendente nacional de operações e atendimento do CIEE (Centro de Integração Empresa-Escola), diferente das gerações anteriores, a Z está menos conectada com a estabilidade e mais focada na qualidade de vida. “A estabilidade sai do primeiro plano para dar lugar ao bem-estar, à preocupação ambiental e à ideia de estar bem consigo e com o ambiente ao redor.
Equilíbrio entre vida pessoal e profissional
Segundo a pesquisa da Deloitte, a geração Z prioriza oportunidades de desenvolvimento e aprendizado para impulsionar seu crescimento profissional, sendo esse o principal fator na escolha de um emprego, seguido pela busca por equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, enquanto as questões financeiras ocupam a terceira posição. Para 25% dos jovens dessa geração, um bom equilíbrio entre vida profissional e pessoal é uma das principais razões para escolherem uma empresa para se trabalhar.
“Embora o salário seja importante, priorizo a qualidade de vida”, declara Adriane Lima, 28, advogada no setor de contratos administrativos do TJ-SP. “Não aceitaria uma vaga em um ambiente de alta pressão psicológica, mesmo que o pagamento fosse maior”, segundo ela. “Quando eu advogava, era comum trabalhar 12 horas diárias, o que afetava minha rotina. Agora consigo manter essa divisão, valorizo muito poder cumprir meu horário sem necessidade de horas extras”.
“Sinto que a geração Z se submete muito menos a abusos”, disse Brenda Safra, 23, estudante de Pedagogia e autônoma na área de comunicação.
Para Marcos, sócio da Deloitte, essa diferença geracional fica em evidência: “Caso a geração Z perceba que não há esse equilíbrio, eles saem e buscam uma outra oportunidade. Assim como outras gerações, eles querem desenvolvimento e crescimento, mas dão muito peso ao equilíbrio de vida e trabalho. Ao contrário das gerações anteriores, que às vezes permaneciam mesmo em ambientes de alto estresse, a geração Z valoriza essa questão e pauta sua carreira nisso”.
“A geração Z não vive para o trabalho como as gerações passadas. Antes, produtividade era vista como quem doava mais tempo para a empresa; para a geração nova, é um conceito mais objetivo de entrega”, completou Mônica, da CIEE.
Sem medo de mudança
Com todas essas novas expectativas e prioridades da nova geração no trabalho, é importante reconhecer as principais razões para que esses jovens saiam de uma empresa: falta de reconhecimento, ambiente de trabalho não inclusivo e desejo de flexibilidade.
“Prefiro horários flexíveis, mas é essencial que não exijam trabalho aos finais de semana. No meu estágio, preciso cumprir seis horas diárias, mas sem horário fixo de entrada ou saída, contanto que as seis horas sejam cumpridas. Esse tipo de flexibilidade é importante para mim”, afirmou Enzo Casagrande, estudante de Ciência da Computação e estagiário em engenharia de dados.
Enzo também disse que a forma que uma empresa trata seus funcionários seria um motivo para que ele pedisse demissão. “Em um dos meus estágios anteriores, o ambiente era extremamente tóxico. As pessoas eram hostis, ninguém tinha voz ali dentro, e o escritório já foi palco até de brigas físicas entre colegas de trabalho”, contou, “Acabei tendo que pedir para encerrar o contrato”.
“Essa é uma geração que não tem medo de mudança como as anteriores, então para eles não é um problema sair de uma empresa que não respeita seus valores e procurar outra oportunidade”, explicou Mônica, “Porém, ficar pouco tempo em uma empresa pode prejudicar o jovem, pois ele ainda precisa passar pela curva de aprendizado, essencial para desenvolver suas habilidades e compreender a cultura organizacional. Sem esse tempo, ele pode não alcançar a maturidade necessária para apresentar resultados, que geralmente aparecem no médio ou longo prazo”, pondera a especialista.
Papel das empresas nesse novo cenário
Diante das novas exigências da geração Z, as empresas têm a responsabilidade de se adaptar a um novo cenário. Conforme a Deloitte, 75% do pessoal da geração Z considera que o engajamento comunitário e o impacto social de uma organização são fatores importantes ao considerar um potencial empregador. “As empresas precisam entender que os jovens de hoje buscam trabalhar para organizações que realmente se importam com a sociedade”, ressaltou Marcos Olliver.
“Essa geração valoriza muito programas de qualidade de vida, voluntariado e empresas que oferecem essas iniciativas, então é vital que elas adotem práticas sustentáveis e que isso seja parte de sua identidade”, explicou Mônica Vargas, “Sempre que a empresa apresenta isso como um benefício, ela atrai a atenção da geração Z, ganhando tanto em atratividade quanto em retenção, que cada vez mais se mostra um desafio”.
A adoção de políticas de reconhecimento e valorização também é crucial, visto que 51% dos jovens sentem que não são reconhecidos adequadamente. “Existe essa ideia de que a geração Z não quer trabalhar, ou que não sabe trabalhar, mas a verdade é que nós sabemos, queremos e gostamos de trabalhar, desde que sejamos respeitados e reconhecidos”, diz Brenda.
Por Alice Labate