Tania Cosentino, 57 anos, CEO da Microsoft, é uma workaholic confessa. Diz que, se deixarem, trabalha 24 horas por dia. Corrigindo: ela trabalha muito e estuda muito. Desde que chegou à multinacional americana, há três anos, tem se dedicado a aprender sobre a empresa, sobre o setor e sobre tudo o mais que aparecer pela frente. “Não tenho medo de fazer pergunta estúpida”, diz. “E aceito convites até de coisas que não conheço para me forçar a aprender sobre diferentes temas.” No dia em que conversamos, ela estava se preparando para participar de um painel sobre agro inteligente. “Exercitar o cérebro aos 57 anos é espetacular”, diz a executiva, que é casada com Carlos, namorado dos tempos da faculdade de engenharia elétrica.
Desde que chegou à Microsoft, Tania tem liderado no Brasil a profunda transformação cultural pela qual a companhia passa no mundo: deixar de ser uma empresa que vende produtos em caixinha para vender soluções na nuvem. “Ao contrário de algumas empresas que nasceram digitais, a Microsoft é uma jovem senhora com mais de 45 anos. Não é uma millennial”, diz. A CEO diz que é seu papel reforçar todos os dias valores como obsessão pelo cliente, colaboração e diversidade. Ela acredita que a liderança eficaz é aquela que lidera pelo exemplo e tem consciência de que está sendo observada.
Para navegar nesse novo mundo de inteligência artificial, internet das coisas e metaverso, Tania conta com mentores internos, técnicos da empresa que ajudam a entender as tecnologias e o mercado. Ela conta que esteve numa festa de aniversário de um amigo que aconteceu no metaverso. “O negócio em 3D, graficamente falando, ainda é bastante básico, mas foi um evento”, avalia. Para quem quer entender o que significa essa palavra que Mark Zuckerberg colocou no dicionário global, ela recomenda dois jogos: Minecraft e Fortnite. Mas alerta que ainda não sabemos quais impactos essas novas tecnologias terão na nossa vida. “Como a gente vai inserir o metaverso na jornada do consumidor?”, pergunta, deixando a resposta no ar.
Paulistana, Tania vem de uma família que não podia pagar escola particular no ensino médio. Por isso, aos 14 anos, foi estudar na Escola Técnica Federal de São Paulo. Aos 16, já era estagiária na Siemens. Quando olha para o passado, diz que aquela adolescente jamais imaginaria chegar a presidente de uma empresa como a Microsoft. “Eu tenho muito orgulho do que conquistei na carreira, mas principalmente dos amigos que conquistei nessa jornada”, diz. Sempre de cabelos muito curtos e sorriso largo, Tania diz que preserva amigos de todas as empresas por onde passou. “Eu não cheguei aqui sozinha.” A seguir, os principais trechos da entrevista concedida a Época NEGÓCIOS.
Como é ser presidente da Microsoft Brasil?
É apaixonante, porque eu faço realmente o que gosto, tenho um propósito e isso me dá muita energia. Cheguei aqui há três anos sem dominar o mercado. Ainda tenho que aprender muito, e aprendo todos os dias. Exercitar o cérebro aos 57 anos é espetacular. O meu desafio é levar a empresa a um outro patamar de crescimento – e estou levando. Preciso acelerar a transformação da Microsoft para que ela possa transformar os seus clientes. Não existe zona de conforto, estou sempre olhando para o próximo passo. Preciso conhecer tecnicamente a oferta, entender a estratégia da empresa, traduzir essa estratégia para o mercado local, ver como gera impacto. É cansativo, eu tenho que confessar. É pesada a agenda. Mas é excitante, apaixonante e desafiadora.
Como foi entrar num mercado que você não conhecia?
Eu não vou dizer que eu não conhecia, porque esse setor de tecnologia era um cliente da Schneider Electric (onde Tania trabalhou por 19 anos), uma empresa que também estava entrando no mundo da transformação digital. Mas, dada a velocidade de transformação do nosso mercado, da nossa tecnologia, eu não posso dizer que estou confortável. Tenho muita coisa nova para aprender todos os dias. Eu conheço melhor o mercado? Sim, e o mercado me reconhece [Tania está na mais recente lista dos Executivos de Valor, do jornal Valor]. Isso diz muita coisa, mas não posso me acomodar.
Como você faz para se manter um passo à frente?
Eu sou muito curiosa. Uma coisa bacana da companhia é o que chamamos de ‘growth mindset’, que é baseado no conceito da Carol Dweck, uma psicóloga americana de Stanford, autora do livro Mindset: A nova psicologia do sucesso (lançado no Brasil pela editora Objetiva). O Satya (Satya Nadella, CEO global da Microsoft desde 2014) trouxe esse pensamento de que a gente tem que buscar sempre o crescimento, estar aberto a novos aprendizados, não ter medo de assumir riscos, não ter medo de errar. Mas é preciso gerar aprendizados. Isso faz parte da cultura da companhia, vivo isso todo dia. Eu consigo entrar em uma reunião e sair dela refletindo o que aprendi, o que poderia ter feito diferente. Eu me preparo para cada evento com muita intensidade. Aliás, eu aceito convites até de coisas que não conheço, para me forçar a aprender sobre diferentes temas. Eu pergunto muito, não tenho medo de fazer pergunta estúpida. Mesmo sendo a líder da companhia, não tenho vergonha de falar para o meu time : “Me ensina”. Tenho vários mentores técnicos aqui dentro, pessoas que têm prazer em ensinar e compartilhar conhecimento. Isso é muito gostoso.
O que mudou na Microsoft nestes três anos?
A companhia vem se posicionando no mundo da nuvem. Mas, ao contrário de algumas empresas que nasceram digitais, a Microsoft é uma jovem senhora com mais de 45 anos. Não é uma millennial. A gente vem de uma cultura de venda de produtos em caixinha e tem que passar para uma cultura de venda de soluções de negócios. Isso requer um trabalho de transformação cultural muito grande. E isso não é algo que saia de uma apresentação no PowerPoint. Preciso trabalhar todos os dias. E sei que as pessoas estão me avaliando, conferindo se minhas ações refletem ou não a cultura da empresa.
Somos uma das empresas mais valiosas do mundo, mas o que nos trouxe até aqui não garante sucesso para os próximos 10–20 anos. Provoco constantemente toda a equipe a se transformar, a buscar mais conhecimento, a ir além. Aí, vem aquela pergunta: o que mais eu poderia fazer? Legal, ganhamos esse pedido, vamos comemorar. O que mais eu poderia fazer para entregar mais valor ao cliente? O que eu posso fazer diferente na próxima vez? Tento fazer essas provocações para que a gente consiga uma trajetória de crescimento financeiro, de geração de receita e de valor para a companhia.
A Microsoft também assumiu em 2020 compromissos ambiciosos com a área ambiental: ser negativo na geração de carbono até 2030 e negativar emissões históricas até 2050. Também vamos implantar a economia circular em embalagens plásticas e em microeletrônicos e preservar ecossistemas. Preciso fazer com que isso seja traduzido em cada ação de cada funcionário no campo; preciso embutir neles os conceitos de sustentabilidade. Como um vendedor que vendia Office e Windows até bem pouco tempo vai vender a jornada de sustentabilidade? É essa a transformação que estou conduzindo. O crescimento na receita vem como consequência.
Você diria que a Microsoft é hoje uma empresa de software as a service?
É um serviço pay as you go. A caixinha eu compro, pago, vou ficar com ela usando ou não. Com o pay as you go posso cancelar a assinatura no dia que cansar de ler aquela revista. Se a Microsoft deixar de oferecer valor para o cliente, ele tem outras opções de mercado e pode migrar. Não existe mais o cliente cativo. Tenho que conquistar o meu cliente todos os dias, agregar valor para o negócio dele. Porque a tecnologia não é o fim, mas o meio de se obter algo. Como eu mostro que a minha opção é a melhor, a mais completa, a mais adaptável ou a mais segura? Cibersegurança e privacidade de dados são dois requisitos importantíssimos no mundo da transformação digital. A assinatura é a beleza da democratização do acesso à tecnologia: qualquer empresa de qualquer tamanho pode ter acesso a tecnologia de ponta pagando exatamente pelo tamanho do uso dela.
Como é a sua rotina para fazer a transformação digital acontecer?
A gente trabalha todos os dias os pilares fundamentais da nossa cultura: obsessão pelo cliente, colaboração entre as equipes e a diversidade e inclusão. Se o cliente é diverso, eu preciso ter diversidade. Se quero ser mais inovadora, preciso ter mentes diferentes pensando. Reforço essas mensagens todos os dias. E acredito em liderar pelo exemplo, com consistência. Não é só top-down. Se uma equipe trouxe um negócio diferente, vem falar para o resto da organização. Se trago um cliente para falar, quero saber o que a gente fez de diferente, como a gente impactou. Isso gera um aprendizado contínuo. O papel do líder é dar clareza, mesmo não sendo uma coisa fácil no mundo atual.
Tania, já faz alguns anos que você entrou de cabeça na questão da diversidade. Como nós estamos evoluindo neste tema?
Eu venho trabalhando com os temas de sustentabilidade e diversidade desde 2008, antes que eles ficassem tão evidentes. O que eu vejo é que o nível de conscientização aumentou muito nesses quase 15 anos. Explicações que eu tinha que dar em 2008, 2010, 2015, eu não preciso dar mais. Muitas empresas se empenharam, mas é triste ver que os avanços são muito lentos, os resultados numéricos são baixos ainda. Eu continuo sendo uma das poucas mulheres executivas neste país. Em fóruns de discussões, em painéis de negócios e em grandes eventos ainda não tem mulher falando. E, infelizmente, a pandemia nos trouxe um retrocesso na equidade de gênero [segundo o Fórum Econômico Mundial, a pandemia acrescentou 36 anos ao tempo necessário para reduzir a disparidade entre homens e mulheres, que passou de 99,5 para 135,6 anos].
Qual a responsabilidade das empresas nesse retrocesso? Elas não deveriam dar mais suporte às mulheres?
Sim e não. As empresas também passaram por um processo desconhecido, com o qual ninguém sabia lidar. Muitas não estavam preparadas, tiveram que comprar máquinas e equipar funcionários para trabalhar de casa. Então, a prioridade era a continuidade do negócio. Outras quebraram. Depois de um tempo, as que sobreviveram começaram a pensar nos funcionários. Eu tenho o privilégio de trabalhar na Microsoft, que tem uma estrutura grande, é uma empresa global, foi capaz de colocar uma série de ferramentas à nossa disposição, inclusive em relação à saúde mental. Já tínhamos consultas gratuitas com psicanalistas e psicólogos, mas ela aumentou o número de consultas a que tínhamos direito. E nos deu uma série de licenças remuneradas para cuidar de um parente que ficou doente, por exemplo. Não são todas as empresas que conseguiram arcar com isso. E a mulher, durante a pandemia, teve que lidar com a casa, com as crianças na escola online e com o trabalho. Ficou muito complicado para ela.
E dividir às vezes a mesma sala com o marido e com o filho.
O mesmo computador com o filho, muitas vezes. Então, foi muito complicado para todo mundo. O que a gente faz para retomar o caminho da equidade? Precisamos olhar para as nossas mulheres. Precisamos educar melhor os nossos meninos e meninas para que cresçam numa geração mais inclusiva. E fazer com que homens e mulheres trabalhem juntos dentro e fora de casa.
Tania, as mulheres estão mais mobilizadas, mas você acha que finalmente os homens estão participando da conversa?
Sim e isso começou em 2014, quando a ONU Mulheres criou o HeForShe e falou que era preciso trazer o homem para a conversa. Na sua grande maioria, é o homem que contrata, promove e demite. Ele precisa entender como incluir a mulher, como identificar a síndrome da impostora e entender porque ela se interessa ou não em subir para o próximo degrau na carreira. Precisa olhar a diversidade e inclusão como um todo na sociedade. Quando vemos a realidade refletida em feminicídios, violência contra o grupo LGBTI+, vemos que o Brasil é sim um país muito preconceituoso. E aí tem que trazer o homem para entender essas particularidades, senão a gente não avança.
Outro dia, eu estava conversando com uma colega desenvolvedora aqui da Microsoft e ela falou que as nossas vagas não eram inclusivas, já que diversos requisitos espantavam as mulheres. Ela contou que trouxe uma colega para uma vaga para a qual não teria se candidatado. Pois a moça veio e depois de poucos meses ganhou um prêmio global, porque fez a diferença no negócio. Então, precisamos sempre estar atentos para sermos mais inclusivos. Se você recebeu 100 currículos de homens para uma vaga e apenas cinco de mulheres, é preciso verificar porque a mulher não se enxerga na vaga. Precisamos de ações concretas, porque eu não vou viver 137 anos, e gostaria de ver uma evolução bacana antes de morrer.
O que você costuma dizer às jovens que querem seguir seu caminho?
Eu digo: confie no seu taco. Acredite em você, mas trabalhe duro, porque as coisas não caem do céu. Se você não plantar, não colhe. Mas também não precisa carregar nenhum fardo sozinha. Se a mulher carrega a família, filho, mãe, sogra, emprego nas costas, não vai crescer profissionalmente. Peça ajuda. Construa a sua rede de suporte em casa e na empresa. Busque mentores que vão te ajudar a dar o próximo passo na carreira. São coisas que eu não sabia que precisava quando era mais jovem. Eu não tive um mentor com quem me aconselhar. É importante ter alguém que dê apoio e que fale bem de você.
Você tem atuado como mentora de outras mulheres ou de outros homens?
Há muitos anos eu sou mentora de homens e mulheres. É muito legal porque é uma troca: você acha que está ensinando, mas na verdade está aprendendo mais do que está ensinando. É uma troca de experiências, uma conversa, uma relação de confiança. Sempre que saio de uma conversa de mentoria acabo fazendo reflexões sobre o que a gente discutiu. “O que eu aprendi com essa experiência?”
Você mencionou que tem mentores técnicos aí dentro da Microsoft. Também tem mentores mais sêniores?
Sim, tenho mentores de negócios que me ajudam a navegar dentro da complexidade da organização. E tenho um coach que já virou meu amigo, pois está comigo há muitos anos, que me ajuda a refletir sobre os pontos que preciso desenvolver. Há sempre pontos a melhorar.
Quais são as tecnologias que a gente tem que prestar atenção para os próximos anos?
Fala-se muito em inteligência artificial, mas ela ainda é pouco usada. Vamos ter revoluções na área da medicina, desde o diagnóstico de uma doença até a seleção de tratamentos mais adequados para diferentes doenças. Também falamos de produção inteligente de ponta a ponta, aí entra a inteligência artificial com o IoT, com realidade mista…
É a indústria 4.0?
A indústria 4.0 está começando a virar realidade. O 5G é uma tecnologia que vai impulsionar muito a indústria 4.0 nas fábricas e também no agronegócio, que pode ser ainda mais produtivo. Vamos ver cada vez mais empresas se perguntando como consumir menos matéria-prima, como emitir menos CO2, como produzir mais com menos e melhor qualidade. A gente usa a realidade mista para a segurança no trabalho, para a segurança de ativo, para desenho de projeto, para a simulação. Não estou falando de tecnologia do futuro, mas algo que já existe e pode ser melhor aproveitado. A gente passou pela aceleração da transformação digital com a pandemia. Aquele foi o nível 1, agora precisamos subir para o 2 e o 3, que é fazer o uso pleno dessa inteligência artificial. Isso vai trazer uma revolução para nós.
E o metaverso?
A gente está vivendo um pouco do metaverso na Indústria 4.0, quando se fala em gêmeos digitais [do inglês digital twin, que significa criar uma cópia digital exata de um objeto ou sistema]. Imagine um dispositivo qualquer que tem uma curva de performance esperada. Na hora que você conecta o IoT deste dispositivo, começa a captar sinais dele em tempo real: os desvios em relação à vida útil esperada, se há um desgaste antecipado, se você tem que trocar ou não. Isso traz ganhos de produtividade significativos para uma indústria. Isso é um pouco do que já existe de metaverso. Agora, o que nós estamos desenhando é o futuro. Como a gente vai inserir o metaverso na jornada do consumidor? Como vou envolver o cliente nessa jornada? Eu preciso ter a minha loja Microsoft dentro do metaverso para vender Surface, vender Xbox? Não sei. São coisas que a gente vai descobrir na evolução da tecnologia. Eu já fui a uma festa no metaverso 3D, super fofo.
Como assim?
Era uma festa de aniversário de um amigo durante a pandemia. Eu entrei na festa, passava no meio das pessoas, ouvia as conversas dos diferentes grupos. Foi muito divertido. O negócio em 3D, graficamente falando, ainda é bastante básico. Encontrei o meu amigo, dei feliz aniversário, ele me levou para o nosso grupo de amigos. A gente se via pelas câmeras, não era com avatar. Então, já existem experiências. No futuro, vai ser totalmente imersivo. Não sei se esse mundo totalmente imersivo vai ser legal, pois gosto do mundo real. Eu tenho medo do que isso pode mexer com as nossas cabeças. Eu tenho alguns medos pois o uso que você faz da tecnologia pode ser fantástico e pode ser nefasto ao mesmo tempo.
O que a idade trouxe de bom?
Sabedoria, resiliência e entender que não vamos conseguir tudo. Aprendi que a gente vai engolir sapos durante toda a vida. Só que, quando você fica mais velho, aprende a fatiar os sapos para engolir sem que nenhum ossinho entale na sua garganta. Aos 40, estava no início da minha ascensão executiva, tinha necessidade de estar com tudo na ponta da língua. Hoje, acho que tenho o direito de perguntar, tenho o direito de não saber, mas também tenho o direito de dar a minha opinião em muita coisa, por causa da experiência, pelo que vivi. Quando a gente é jovem, principalmente a mulher, se cobra demais, quer ser perfeita em tudo. Hoje, me aceito do jeito que sou. E me cuido mais, porque entendo que a vida está passando muito rápido. Eu não acho que tenha a idade que tenho. Por isso, abuso da minha idade. Continuo comendo como eu comia há 20 anos. Eu preciso controlar mais, cuidar mais do corpo. Eu tive crise dos 50, mas não tive nos 40…
Você teve crise aos 50?
Estava me achando mais velha, mais feia; acho que era porque eu tinha engordado um pouquinho, mas já consegui emagrecer. Agora, estou muito bem comigo mesma, eu estou feliz. Na pandemia fiquei em crise porque eu percebi que podia morrer. A Covid mexeu com a minha cabeça e me fez pensar no futuro. Eu vejo gente mais velha com problemas de saúde, a demência batendo na porta, e isso me assusta. Estou tentando me cuidar hoje para ter uma vida minimamente bem fisicamente e mentalmente. Quero bater os 100 anos. Hoje, a tecnologia me permite.
Você acha que chega aos 100?
As mulheres da minha família são longevas. Minha mãe tem 84 e não cuidou do corpo como deveria. Está lá meio devagar, meio travada, porque o corpo trava quando a gente não se exercita, tem problema de articulação, de artrose, essas coisas, mas a mente dela está ativa, é ácida, mandona, não aceita que ninguém mande nela. Eu quero ter aos 94 essa mente ativa que ela tem aos 84 e com o corpo um pouco mais ativo do que ela. Se eu ficar doente, prefiro já ir embora antes. É realmente muito triste ver pessoas próximas da gente com demência. Se tem uma doença que me assusta é a demência. A pandemia me deu esse senso de finitude, que eu posso morrer antes. Meu pai morreu com 59.
Você é casada há muito tempo, né?
Eu e o Carlos estamos juntos desde 1987 – estudamos juntos na faculdade – e casados desde 1995. Nós não temos filhos.
Você gosta da idade que você tem? Está confortável com ela?
Eu estou confortável e gosto de falar a idade. Eu gosto que mulheres com 50+ entendam que elas podem chegar a qualquer lugar, mas precisa se preparar. A gente está disponibilizando uma plataforma de treinamento para requalificar a mão de obra no Brasil. Até 2030, o Brasil precisará requalificar 45 milhões de profissionais, porque a inteligência artificial vai desempregar essas pessoas. Eu preciso trazê-las para o meu mundo de TI, que tem um gap de mão de obra incrível. Lançamos esse programa que se chama Conecta Mais Microsoft, que oferece três trilhas de treinamento diferentes. Também é uma plataforma de emprego: nós temos parceiros de negócios com vagas em aberto que vão buscar primeiro na plataforma.
Você pensa em parar em algum momento?
Eu estou com 57, pensando qual será o meu próximo passo na Microsoft, discutindo carreira lá dentro. É muito legal poder viver isso. Neste momento, não penso em parar, mas vai chegar o momento da aposentadoria compulsória. Espero que demore bastante. Mas aí tem a terceira via, que é participar de conselhos de administração. Já sou conselheira voluntária em alguns lugares. Então, parar? Nunca. Reduzir a velocidade? Com certeza em um determinado momento, mas não agora.
Fonte: Época Negócios