Gerar um ser humano definitivamente não é um trabalho simples. Educar, entender os limites e oferecer tudo aquilo que for necessário para o subsídio desse ser é mais difícil ainda. A maternidade não é apenas uma condição fisiológica da mulher, trata-se de uma construção social com diversos aspectos históricos e culturais envolvidos. A ideia de que uma mãe deve sempre colocar o seu filho em primeiro lugar, deixando de lado toda a sua individualidade é algo que produz um movimento de culpabilização muito forte nas mulheres.
A chegada de uma criança não muda somente o corpo das mães, mas a parte psíquica também. É nesse momento que se faz necessário um acompanhamento psicológico, para não deixar com que possíveis abalos emocionais afetem a saúde daquela mãe e, consequentemente, do seu bebê.
A psicóloga especialista em psicologia perinatal e mestranda em psicologia pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Isadora Soeiro, relata que esse campo de atendimento ainda é muito novo. Segundo ela, alguns estados já vêm pedindo que psicólogos estejam presentes na sala de parto.
“Eu mesma não tive contato com essa temática enquanto estava na faculdade. Comecei a me interessar por essa área quando estava atuando no Hospital da Mulher em Fortaleza. Lá tive contato com um número grande de mães, vi como funcionava a UTI neonatal e fui me apaixonando pelo tema. Vi o quão importante é um acompanhamento psicológico durante esse período. Desde essa experiência eu senti a necessidade mergulhar nesse tema cada vez mais”, diz.
Um psicólogo perinatal também auxilia pós o nascimento. De acordo com a especialista, o Blues Puerperal é algo que ocorre com frequência, também conhecido como tristeza materna. Trata-se de uma alteração no humor da mulher durante os primeiros dias após a chegada do bebê, mas não é considerado um transtorno psíquico. É possível observar um humor triste, um choro inexplicável, alterações no sono e no apetite. Diferentemente da depressão pós-parto, o blues puerperal é mais leve, vai se resolvendo naturalmente e não se faz necessário o uso de medicação. Quando existe uma suspeita de depressão pós-parto o assunto é outro.
A depressão precisa ser tratada, pois gera uma repercussão muito grande na saúde mental da mulher, podendo dificultar o vínculo e até mesmo o desenvolvimento daquela criança. Após a pandemia houve um aumento significativo no número de casos de depressão pós-parto. É preciso ficar atenta, pois quando ocorre um caso de depressão na primeira gestação, existe uma maior possibilidade de acontecer novamente na segunda, diz a profissional. Isadora confirma que é possível sim ser feita a utilização de medicamentos antidepressivos no pós-parto, mas com acompanhamento de um psiquiatra que possa adequar a medicação para esse momento.
Vivência Materna
A professora e mãe, Luana Lira, relata que quando se tornou mãe passou a se sentir culpada por tudo, até mesmo por coisas que estavam fora de seu controle, mas que hoje, graças ao acompanhamento psicológico, consegue administrar melhor esse sentimento. Ela conta que a terapia foi algo extremamente necessário, principalmente pelo acúmulo de problemas que surgiram durante o período pandêmico.
Devido às dificuldades durante a gestação, a jovem professora precisou parar com a faculdade e retornou com os estudos em 2021. Isso fez com que ela participasse do ensino híbrido, uma fase que Lira descreve como exaustiva.
“Foi muito conturbado gerenciar tudo, terminei o curso com muita dificuldade. Sempre enquanto eu estava estudando, ele estava aprontando alguma coisa. Eu renunciei a muita coisa, fazia o que dava. As coisas ficavam um pouco bagunçadas em casa. Naquele momento eu tive que escolher, e eu escolhi priorizar os meus estudos, até para poder dar um futuro melhor para o meu filho”, diz. Luana Lira se formou em pedagogia pela UFMT e, atualmente, trabalha em sala de aula.
Segundo ela, o processo terapêutico é algo fundamental na vida de uma mãe.
Chegada inesperada
A jovem de 22 anos, também pedagoga, designer e mãe, Luana Godoy, relata que sua vivência com a maternidade possui altos e baixos. Ela tinha apenas 18 anos quando descobriu a gravidez que, até então, não tinha sido planejada. “Eu havia acabado de passar para o curso de biologia na UFMT. Esse curso era o meu sonho, mas era integral. Foi um choque, ser mãe definitivamente não estava nos meus planos. Na hora eu soube que precisaria parar tudo, pois não seria possível manter o ritmo acadêmico que eu estava planejando levar”, relembra.
A designer diz que durante a gravidez enfrentou um forte período depressivo, mas que buscou se reerguer em prol do bem-estar do filho. Para que isso acontecesse, ela precisou iniciar uma outra faculdade.
“Eu iria ter o bebê e não queria ser uma mãe ruim, então fiz o possível para melhorar, ser uma boa mãe e não desistir de mim. Usei a minha nota do Enem e consegui uma vaga em uma universidade particular em um curso de meio período. O curso escolhido foi pedagogia. Quando meu filho nasceu, troquei para semipresencial. Dessa forma eu não precisaria desistir de estudar. Me esforcei muito, passei dias chorando e me questionando o porquê de estar fazendo aquilo, mas hoje estou feliz por estar formada”, relata.
Godoy conta que após o nascimento do filho passou a ter oscilações de humor e que alguns anos mais tarde obteve o diagnóstico de transtorno de bipolaridade. Ela reforça sobre a importância do tratamento psicoterapêutico.
A chegada da maternidade, seja por meio de uma gestação ou adoção, não precisa significar a perda da individualidade. Essa ideia disfuncional que existe na nossa sociedade pode ser revertida. Para isso é preciso que procuremos entender as diversas realidades e possibilidades de ser mãe e mulher e busquemos conscientizar sobre a importância do acompanhamento psicológico durante a maternidade.
Por: Victória Oliveira