Três anos após o início da pandemia que forçou o home office nas empresas, a discussão sobre o melhor modelo de trabalho ainda não foi superada. Se de um lado há profissionais que se recusam a trabalhar em empresas que não permitem o trabalho remoto, do outro, executivos e empresários começam a demonstrar incômodo em relação à ausência dos funcionários no ambiente corporativo. Entre as justificativas estão a perda do chamado fit cultural e até de queda na eficiência dos profissionais.
No exterior, o movimento é liderado pelas big techs. Recentemente, Mark Zuckerberg movimentou as redes sociais com um post sobre o futuro da Meta, conglomerado que abarca companhias de tecnologia como o Facebook – que fundou em 2004 -, Instagram e Whatsapp. No texto, ele elencou os objetivos para 2023, em uma espécie de “carta aberta” aos funcionários, e explicou quais caminhos deverão ser tomados para uma guinada “mais eficiente”, nas palavras do executivo.
Além do cortes de vagas, redução no volume de contratações e cancelamentos de projetos com baixa prioridade, ele também encorajou os funcionários a encontrarem mais oportunidades de trabalho com os colegas presencialmente. Segundo Zuckerberg, isso tem a ver com produtividade.
“Em nossa análise inicial, que vai demandar ainda mais estudos, percebemos que tanto engenheiros que começaram a trabalhar conosco de maneira presencial e depois foram para o modelo remoto quanto os que se mantiveram no escritório tiveram melhores performances em relação aos que iniciaram a jornada de maneira remota”, disse ele, em comunicado.
Essa mudança para mais trabalho presencial, visando produtividade, não é peculiaridade só da Meta. Após concluir a compra do Twitter, Elon Musk aboliu o trabalho remoto, obrigando os funcionários – que restaram após a onda de demissões – a estarem presentes nas respectivas sedes – seja da rede social ou da Tesla (empresa de carros elétricos). No comunicado aos funcionários, ele teria dito que o home office já não é mais aceitável.
Outro exemplo veio do mercado financeiro. O JP Morgan anunciou na quarta-feira, 12, que orientou seus diretores administrativos a trabalhem todos os cinco dias úteis da semana no escritório. Com isso, o banco encerra oficialmente o modelo híbrido de trabalho para os executivos administrativos, adotado pela instituição ao longo da pandemia de covid.
“Nossos líderes desempenham um papel crítico no reforço de nossa cultura e na administração de nossos negócios”, destaca o banco, em comunicado enviado para os funcionários por e-mail. “Eles devem estar visíveis no local, devem se reunir com os clientes, precisam ensinar e aconselhar e devem estar sempre acessíveis para feedback imediato e mensagens improvisadas.”
No Brasil, o movimento também tem ganhado corpo. A XP Investimentos, por exemplo, já sinalizou que o modelo de trabalho à distância não tem ajudado a empresa. Em março, o fundador da companhia, Guilherme Benchimol, se encontrou com analistas do mercado e admitiu que contratou demais nos últimos anos e que o modelo de trabalho remoto prejudicou o desempenho da empresa.
A instituição chegou a iniciar um projeto, durante a pandemia, de mudança de sede, para uma complexo em São Roque, chamado Villa XP. O espaço seria um local para os funcionários se confraternizarem e interagirem. A ideia remetia ao modelo de sede da Apple, em Cupertino, no Estados Unidos. Hoje o projeto está sendo reestruturado, segundo entrevista de Benchimol ao InfoMoney, que faz parte do grupo.
Para o diretor executivo do PageGroup, Lucas Oggiam, o movimento de empresas de grande porte tende a ditar o ritmo dos negócios em determinados setores. Na opinião do executivo, o home office será cada vez menos visto neste ano e nos próximos. Isso porque as companhias têm seguido para modelos de trabalho híbrido, com um, dois ou três dias em casa durante a semana, ou até mesmo regimes presenciais.
“Mais de 95% das empresas para quem a gente recruta trabalha com o modelo híbrido, com exceção daquelas funções que efetivamente as pessoas precisam exercer presencialmente. Então, nos parece que o caminho vai continuar sendo esse”, diz.
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Para especialistas na área de recrutamento, a dificuldade de adaptação às transformações do mercado podem criar obstáculos na contratação de talentos e de retenção de profissionais-chave. Eles destacam que é preciso avaliar com cuidado a questão da produtividade quando o assunto é trabalho presencial.
Além disso, as empresas têm de considerar os custos com o retorno ao escritório, como energia, alimentação, vale-transporte de funcionários e até mesmo locação de espaço, que podem pesar muito no balanço para as companhias. E o trabalho presencial pode se tornar ainda mais caro se os colaboradores estiverem insatisfeitos.
Uma das coisas que Oggiam, do PageGroup, destaca é a adequação de espaços físicos para as empresas. “Muitas companhias reduziram o espaço que tinham, por exemplo, na Faria Lima, que saíram de dois andares e se mantiveram com apenas um.” Para o executivo, as empresas precisam encontrar o equilíbrio. “Ter pedidos de demissão porque a pessoa não está satisfeita (por conta do deslocamento ao trabalho, por exemplo) torna-se uma dor de cabeça gigantesca. O maior custo dentro de uma empresa é não ter a pessoa certa na cadeira certa”, conclui Oggiam.
O Estadão consultou as big techs sobre o assunto. Apple, Meta e XP afirmaram que não iriam comentar o tema. A reportagem não conseguiu contato com o Twitter. Amazon e Microsoft explicaram que o trabalho híbrido tem sido a tônica nas companhias, sendo que o remoto pode ser oferecido em áreas específicas de cada empresa.
Como saber qual o modelo de trabalho ideal para a empresa?
Para entender o que precisa ser considerado na hora de uma empresa decidir qual modelo de trabalho é o ideal, o Estadão pediu para o PageGroup e para a Robert Half elencarem pontos que necessitam atenção neste tema. Confira os principais a seguir:
O primeiro ponto é entender que tipo de empresa se quer construir, qual a cultura organizacional será implementada e qual o objetivo eu tenho. É preciso entender como o trabalho híbrido, remoto ou presencial se encaixa dentro de tudo isso.
Quem é seu cliente? É necessário saber qual a expectativa que o cliente tem em relação ao serviço que vai ser prestado e se é possível executá-lo de maneira remota. O tipo de função vai ser determinante neste tema
Conheça o seu público interno: antes de escolher um modelo de trabalho. É importante entender as necessidades e desejos dos funcionários da empresa. Isso pode ser feito por meio de pesquisas, rodas de conversa, entrevistas de contratação ou de desligamento.
Considere as características da empresa: infraestrutura, localização e facilidade de acesso da empresa também são fatores importantes a serem considerados ao escolher um modelo de trabalho.
É importante avaliar o que outras empresas do mesmo segmento estão fazendo em relação ao modelo de trabalho. Observe a movimentação, mas considere o contexto em que a empresa está inserida. O que funciona para uma big tech pode não funcionar para uma empresa de química no interior de São Paulo, por exemplo.
Com base em informações nesta linha, explica o gerente da Robert Half, Leonardo Berto, a empresa deve fazer uma matriz de risco para avaliar as vantagens e desvantagens de cada modelo de trabalho em relação ao negócio, ao perfil do público interno e aos objetivos da empresa. E ele também ressalta que é importante lembrar: o modelo de trabalho escolhido não precisa ser definitivo e pode ser adaptado conforme as mudanças nas necessidades da empresa e do mercado. “A flexibilidade é essencial para garantir a competitividade da empresa”, diz.
Fonte: Terra