O FBI prendeu o músico Michael Smith sob acusação de usar inteligência artificial e robôs para fraudar serviços de streaming como Spotify, Apple Music e YouTube Music. Segundo os investigadores, o esquema rendeu US$ 10 milhões a ele (aproximadamente R$ 55,7 milhões, em conversão direta).
O músico e outras duas pessoas, que não tiveram suas identidades reveladas, teriam usado IA para gerar centenas de milhares de músicas. As canções eram colocadas nas plataformas e tocadas por contas de robôs. O dinheiro dos direitos autorais ia parar no bolso dos golpistas.
“Smith roubou milhões [de dólares] em royalties que deveriam ter sido pagos a músicos, compositores e outros detentores de direitos de canções tocadas de modo legítimo”, disse o promotor Damian Williams, responsável pelo caso, em um comunicado. Segundo o FBI, esta é a primeira vez que as autoridades encontram um golpe em streamings envolvendo IA.
O homem, que tem 52 anos e mora no estado da Carolina do Norte, será processado por fraude eletrônica, conspiração para fraude e conspiração para lavagem de dinheiro. A pena pode chegar a 20 anos de prisão para cada uma das três acusações.
Fraude precisava de “tonelada” de músicas
Segundo o comunicado do Departamento de Justiça dos EUA, Smith começou a trabalhar no golpe por volta de 2018, em parceria com o CEO de uma empresa de música gerada por inteligência artificial e com um promotor musical. Estas duas pessoas não tiveram suas identidades reveladas.
De acordo com as investigações, o golpe começou com canções escritas pelo próprio Smith. No entanto, ele notou que precisaria de muitas obras para não levantar suspeitas. Em um email enviado para estas duas pessoas em 2018, o músico escreveu: “Precisamos de uma tonelada de músicas para driblar as políticas antifraude que estes caras estão usando”.
Smith começou a gerar centenas de milhares de músicas usando apenas IA. As faixas tinham informações criadas de modo aleatório. A Justiça dos EUA revelou algumas delas. Entre os artistas falsos, estavam “Calm Force”, “Calypso Xored” e “Camel Edible”, e “Zygophyceae”, “Zymoplastic” e “Zyzomys” eram exemplos de títulos de canções.
Além de gerar as canções, Smith criou as contas de robôs para tocar as canções nos serviços de streaming. Segundo o Departamento de Justiça dos EUA, foram milhares de cadastros deste tipo, feitos com emails comprados. Alguns eram até mesmo assinantes de planos familiares dos serviços de streaming.
Estas contas ficavam conectadas em diferentes aparelhos e tentavam não tocar muitas vezes uma única música, simulando o comportamento de um usuário real, para evitar os mecanismos das plataformas contra reproduções artificiais.
De acordo com as investigações, em um email, o acusado calculou ser capaz de gerar 661.440 reproduções falsas por dia, o que renderia US$ 1.207.128 por ano em royalties (cerca de R$ 6,7 milhões, nos valores atuais).
Plataformas tentam combater abusos
Fraudes deste tipo não são novas: há seis anos, playlists com faixas curtíssimas eram reproduzidas 24 horas por dia, rendendo US$ 1 milhão em royalties a golpistas. Uma plataforma foi acusada de empregar táticas similares, mas negou veementemente estar envolvida.
Nos últimos anos, as empresas do setor adotaram diferentes táticas para evitar este tipo de esquema. O Spotify, por exemplo, parou de pagar royalties a faixas com menos de 1 mil reproduções. Além disso, para coibir a prática, quem é pego fazendo streaming artificial recebe cobranças por faixa.
Já a Deezer removeu de sua plataforma as chamadas faixas “funcionais”: ruído branco, barulho de chuva, sons de máquinas e similares. Este era um caminho fácil para golpes, já que existe muita procura por este tipo de conteúdo e é relativamente fácil produzi-lo.
Como afirma a Justiça dos EUA, os maiores prejudicados nisso são os artistas legítimos. Na hora de “dividir o bolo” dos royalties, eles acabam ficando com uma fatia menor do que merecem, já que parte do dinheiro vai para o bolso dos golpistas.
A IA generativa pode complicar o cenário nos próximos anos. As ferramentas permitem criar faixas mais complexas do que barulho de chuva ou ruído e em uma quantidade muito maior, o que tende a dificultar o trabalho das plataformas para evitar este tipo de fraude.
Com informações: Ars Technica, The New York Times