Janessa Leoné começou seu negócio com US$ 10 mil (cerca de R$ 49 mil na cotação atual). A marca que leva seu nome agora fatura mais de oito dígitos por ano, diz ela (ou seja, mais de US$ 10 milhões ou quase R$ 500 milhões), a partir de Los Angeles, a cidade da moda e do glamour. Mas o negócio ainda é autofinanciado e está mais orientado para uma missão que ela escolheu e que diz não abrir mão: produtos vindos da agropecuária regenerativa, no caso, de lãs regenerativas.
Vale registrar como se deu o início de sua caminhada. Quando Janessa se formou em literatura inglesa na Universidade de San Diego em 2009, conseguiu um emprego como babá e começou a estudar para o teste de admissão na faculdade de direito. Mas uma viagem a Paris mudou sua vida, ao descobrir a beleza dos chapéus artesanais locais. Decidiu então que queria elevar esse artesanato de qualidade para uma categoria ainda ignorada. Em 2013, ela lançou chapéus e alguns acessórios de couro. Mas nos últimos 10 anos, Janessa construiu uma marca totalmente focada na regeneração. “Não é fácil. Esta não é a maneira típica de fazer negócios. Mas não consigo me imaginar fazendo isso de outra maneira”, diz ela.
Janessa cresceu no sul da Califórnia e passou anos lutando contra problemas crônicos de saúde. O sistema de saúde local, diz ela, era bom em duas coisas: tratar da saúde e de casos de emergência, mas não restaurar a saúde. “O corpo é uma máquina bem projetada que pode curar a si mesma se receber os nutrientes certos.” Então, para se curar, ela recorreu aos alimentos e à natureza. Ao comer alimentos mais ricos em nutrientes, ela descobriu a agricultura regenerativa. “A forma como os alimentos são cultivados afeta os nutrientes contidos neles. Quanto mais ricos os solos, mais nutritivo será aquele pedaço de fruta ou vegetal.”
Assim, a construção de uma marca com mentalidade regenerativa percorreu um caminho incomum. “Já era amante dos animais, estava interessada em alimentos ricos em nutrientes. E também estava interessada em slow fashion. Todos os caminhos me apontaram para a agricultura regenerativa. É uma maneira mais lenta de fazer as coisas, com certeza. Mas assim como eu poderia curar meu corpo, a terra também poderia ser curada e devolver mais dividendos.”
Com a orientação e o apoio de Rachel Cantu, que foi vice-presidente de supply chain da Patagônia por cinco anos, Janessa decidiu construir uma cadeia de suprimentos do zero para todos os materiais utilizados nos seus produtos. E ela adicionou mais um item importante à sua linha: suéteres de lã feitos de lã regenerativa que é produzida, obtida e transformada inteiramente em fio, nos EUA.
Para isso, ela se conectou com Jeanne Carver, da Shaniko Wool Company, no estado do Oregon. Jeanne estava trabalhando com fazendeiros como ela para criar um grupo de propriedades rurais praticantes de agropecuária regenerativa. Para se qualificar a fazer parte do grupo, uma fazenda precisa mostrar que já está incorporando práticas regenerativas (rotação de cultivos e de pastagens, manejo de animais e muito mais). Além disso, eles teriam que fazer parte do RWS (Responsible Wool Standard ou Padrão de Lã Responsável), certificação para criadores e vendedores de lã que visa melhorar o bem-estar dos ovinos e das terras onde pastam. Marcas e organizações como H&M, Kering, Patagónia e Outdoor Industry Association adotam o RWS.
Para estes pecuaristas, seria benéfico vender e a lã a marcas como Janessa Leone, em vez de vender como commodity, mas ainda não existem empresas suficientes para cobrir a demanda de sua marca de roupas. Na verdade, Janessa diz: “Quando perguntei pela primeira vez aos meus fornecedores de couro de onde vinham as peles, poucos, se é que algum, conseguiram rastreá-lo até ao animal. Muitas marcas não sabem de onde vêm os materiais porque os intermediários na própria cadeia de abastecimento não sabem.”
Para ela, porém, era imperativo ter uma cadeia de abastecimento totalmente rastreável, uma vez que pretende obter no mínimo 80% dos materiais de explorações agrícolas regenerativas num futuro próximo. Nesse caminho estão postas, também, as preocupações sobre o greenwashing com a agricultura regenerativa, admite Janessa. “É por isso que estamos focados na rastreabilidade e nos dados. Nossos fornecedores monitoram o teor de carbono nos solos, coletam amostras anualmente e monitoram a atividade. É verdade que eles já estão começando de uma posição mais forte do que uma fazenda convencional. Mas estão provando que é possível e com dados.”
Jeanne Carver, por exemplo, relatou esses dados em reuniões do Textile Exchange, onde Janessa também compartilha feedback e ajuda a organização a construir seu padrão regenerativo. A última atualização foi que as fazendas sequestraram carbono o equivalente a 43.600 carros em um ano. (De acordo com a EPA dos EUA, um carro típico movido a gás de 22 MPG emite cerca de 5 toneladas de dióxido de carbono por ano). Além disso, os dados sobre as fazendas regenerativas são verificados por terceiros.
No entanto, hoje, Janessa reitera que Jeanne Carver e os fazendeiros precisam de mais apoio. Assim, ela está incentivando outras marcas com ideias semelhantes a fazer o mesmo. Por exemplo, ela trabalha com a marca de jeans Citizens of Humanity para obter algodão regenerativo e vice-versa, e eles descobriram cadeias de abastecimento de lã graças a Janessa. “Muitas empresas precisam se unir para que isso aconteça. Não será apenas uma empresa sozinha que conseguirá fazer essa transformação.”
*Esha Chhabra é colaboradora da Forbes EUA. Também escreve para San Francisco Chronicle, New York Times, Atlantic, Economist e The Guardian.
Texto: Esha Chhabra