O crescimento da energia solar no mundo ganhou os holofotes recentemente, depois que a Agência Internacional de Energia (AIE) estimou que, em 2023, pela primeira vez na história, os investimentos em energia solar deverão superar o total de recursos destinados à exploração e extração de petróleo.
A energia solar deverá atrair US$ 380 bilhões neste ano, enquanto o petróleo vai receber um pouco menos, US$ 370 bilhões, de acordo com as estimativas da AIE – a agência é vinculada à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Há dez anos, vivíamos em outro mundo: em 2013, o petróleo recebeu US$ 636 bilhões em investimentos, enquanto a energia solar ficou com 5 vezes menos: US$ 127 bilhões.
A AIE também destacou que os investimentos mundiais em energia vão alcançar um valor recorde de US$ 2,8 trilhões em 2023. Desse total, 60%, ou US$ 1,7 trilhão, deverão ser destinados para projetos das chamadas ‘energias limpas’, aquelas que são neutras em carbono, como renováveis, nuclear, baterias de carros elétricos, entre outros. O US$ 1 trilhão restante será destinado a petróleo, gás e carvão.
Ou seja, para cada US$ 1 gasto com petróleo, gás e carvão, US$ 1,7 está sendo destinado para a energia limpa. Há apenas cinco anos, essa relação era de 1 para 1.
O investimento em energia solar é o que mais se destaca dentre as opções de energia limpa. Os veículos elétricos também mereceram destaque da agência – já que os investimentos no setor dobraram desde 2021 e devem ficar próximos a US$ 129 bilhões em 2023.
Desde a pandemia, o mundo intensificou os esforços rumo a uma maior consciência ambiental, com o apoio de programas e investimentos de grandes economias, e também como uma consequência da disparada dos preços do petróleo e do gás natural por conta da invasão da Ucrânia pela Rússia.
Mas uma informação relevante do estudo da AIE ficou abaixo das manchetes: apesar de os números indicarem que o mundo está seguindo cada vez mais em direção à energia carbono zero, o caminho ainda tem grandes desafios porque o processo está muito desequilibrado.
Em nota, a Ember, um think tank de energia europeu, comentou que ao mesmo tempo em que a energia solar está emergindo como uma ferramenta principal para a descarbonização das economias, alguns dos lugares mais ensolarados no mundo registram os menores níveis de investimento em energia solar. E esse é um problema que precisa ser enfrentado.
No Brasil, a energia solar vem tendo cada vez mais a atenção que merece. Segundo a Absolar, a energia fotovoltaica responde por 14,8% da matriz elétrica brasileira, atrás apenas da hídrica, com 50,8%. A participação da energia eólica estava em 12%. A perspectiva é que a energia solar continue crescendo, por suas características específicas: é um investimento mais barato, que demanda menos espaço físico, não agride o ambiente nem traz poluição sonora, e permite uma redução acima de 90% na conta do consumidor.
O vasto e ensolarado território brasileiro garante muitas possibilidades para esse segmento, que ainda tem um grande potencial de crescimento a ser explorado no país. Nos últimos anos, a geração distribuída sentiu o baque dos juros brasileiros muito elevados e da alta dos insumos no mercado internacional, mas nunca deixou de estar na ordem do dia e está apta a aproveitar a melhora do cenário que já se desenha.
Em agosto, o Banco Central reduziu os juros brasileiros pela primeira vez em três anos; e as pressões de preço sobre os insumos estão se reduzindo — isso deverá ser suficiente para impulsionar ainda mais os investimentos no setor.
Em seu estudo, a AIE também compilou dados de investimentos por países e regiões do globo e observou que mais de 90% do aumento do investimento em energia limpa desde 2021 veio da China – o crescimento por lá e em economias avançadas, como Estados Unidos e Japão, e em alguns países da União Europeia, supera o investimento total em energia limpa no resto do mundo.
A agência chama a atenção para o fato de Brasil, Índia e Oriente Médio estarem fazendo grandes progressos em energia limpa; já na Indonésia e na Rússia, os investimentos recuaram nos últimos anos. Em muitas regiões, a AIE observa que o investimento está praticamente parado e pede a mobilização da comunidade internacional para remediar a situação. Entre as razões para atrasos em energia limpa em todo o mundo estão altas taxas de juros, estruturas políticas e projetos de mercado ainda pouco claros e elevados custos de capital.
O tema é relevante. Apesar do crescimento da energia limpa, a agência também apontou que os gastos em exploração de petróleo e gás deverão subir 7% este ano, retomando o patamar de 2019. Essa é uma tendência que pode afastar o mundo da possibilidade de alcançar a neutralidade de carbono até 2050.
Apesar de a energia solar continuar a crescer pelo mundo, o pipeline de projetos para outras tecnologias é mais errático: a eólica vem oscilando ano a ano nos principais mercados; a energia hidrelétrica, fonte chave para baixas emissões, vem diminuindo; mas o investimento em energia nuclear segue crescente. (Texto publicado na Revista 3S)