Profissionais da pecuária foram surpreendidos, recentemente, com uma notícia sobre uma relevante empresa de laticínios europeia que estaria planejando colocar máscaras e fraldas nas vacas, visando controlar as emissões de metano. A repercussão negativa foi imediata. É bem provável que alguma fala descuidada, ou ideias em fase de planejamento a serem estudadas, tenham sido apresentadas de forma descontextualizada. 

O caso nos serve de exemplo para reflexão. As questões envolvendo emissões de metano estão sendo tratadas de forma sensacionalista. Há diversas ideias inexequíveis discutidas seriamente em mesas que não deveriam sequer cogitá-las. Um exemplo é a proposta de redução da produção de carnes por meio de uma suposta conscientização dos consumidores. Trata-se de uma afronta à biologia e à ciência, seja pela natureza nutricional humana, seja pelo desconhecimento em relação às técnicas já disponíveis sobre sistemas de produção altamente eficientes. 

Empresas de capital aberto (geralmente as maiores) e influencers têm tratado o assunto de forma leviana, comunicando projetos ou defendendo agendas sem antes analisá-las de forma criteriosa. No caso das organizações, o tema já foi tratado neste espaço sob o título “O risco do greenwashing involuntário”. Promessas não cumpridas poderiam embaçar a percepção da importância do tema.  

E é exatamente o que está ocorrendo. Ao enunciar a sua terceira lei, Issac Newton acabou, sem querer, também explicando a natureza do comportamento das massas. Para toda força de ação aplicada, surgirá uma força de reação com a mesma intensidade no sentido oposto.

Enquanto leigos divulgam e aplaudem ideias absurdas, insensatas e impraticáveis de um lado, do outro surge um movimento contrário a qualquer tema que envolva ações dentro das políticas de governança ambientais e sociais (ESG, em inglês). E, nesse conflito, entre dois extremos igualmente equivocados, a primeira vítima é o bom senso. 

Para facilitar o raciocínio, usaremos o exemplo recente de uma gigante do varejo, altamente engajada em campanhas de proteção do clima e inserção social. Os gestores da empresa, no entanto, simplesmente se esqueceram de cuidar da própria casa. Ao mesmo tempo em que agradavam clientes e acionistas, sinalizando ações alinhadas a políticas ESG, um conjunto de erros vinha sendo acumulado até se materializar em um rombo perto de R$ 20 bilhões no caixa, descoberto depois da contratação de uma nova diretoria que identificou o furo em menos de 10 dias. E em menos de outros 10 dias os acionistas amargaram perdas de até 85% no valor de mercado da empresa. 

Se pudessem voltar atrás e escolher, o que os investidores iriam preferir? Uma comunicação responsável em relação à agenda ESG ou o melhor controle financeiro dos negócios?  

Fundamental ressaltar que o problema não está em investir na responsabilidade ambiental e social. O problema está no fato de comunicarem ações que não serão possíveis de se implementar. Qualquer que seja a agenda previamente planejada, ou já em execução, ela não permanecerá de pé diante do colapso financeiro da organização. E os impactos sociais de um eventual colapso serão muito maiores, quando computadas todas as perdas das inúmeras famílias que vivem direta, ou indiretamente, das atividades do grupo. 

Apesar de constante em suas comunicações, esqueceram-se de que o “G” da sigla representa Governança. Prato cheio para que o outro extremo, em oposição às ideias surreais difundidas pelo sensacionalismo, entre em cena. 

A discussão em torno do caso leva a entender que a organização errou ao priorizar as políticas ESG. No entanto, o erro estava na execução (gestão) e não na estratégia da empresa. O rombo teria ocorrido com ou sem a comunicação de políticas socioambientais. 

Evidentemente que o raciocínio relacionando o fracasso financeiro às políticas socioambientais ganha força quando acompanhando de uma ideia tão idiota quanto vacas usando fraldas. 

Mas o fato é que as políticas ESG não são o problema. O problema é a forma com que o assunto está sendo conduzido.  

Na produção agrícola e pecuária moderna, os conceitos vêm sendo implementados há muito tempo, seja por força da lei, como o código florestal, seja pela necessidade. Mesmo sem entender o tema, qualquer produtor irá discorrer sobre a importância das boas condições de trabalho para os funcionários e suas famílias.  Não se obtém resultados financeiros com sistemas de produção cada vez mais sofisticados, sem investir na qualidade da equipe que irá conduzir a rotina da empresa. 

Dirão o mesmo sobre indicadores de produtividade, importância de preservar o solo, qualidade da água, economia no uso de recursos, investimentos em energias alternativas (fotovoltaicas ou biogás) etc. Produtores estão extremamente conscientes e aumentam constantemente a área conduzida com sistemas de produção que contribuem com as metas nas reduções das emissões líquidas de carbono: plantio direto, integração lavoura e pecuária, sistemas agroflorestais, manejo e adubação de pastagens, uso de moléculas melhoradoras de desempenho e outras tecnologias que aumentem a produtividade. 

As políticas ESG não representam uma ameaça ao agronegócio. A falta de compreensão em relação a elas, sim. Diante dessa constatação, a melhor alternativa para o setor é manter-se nas mesas de discussão definindo a melhor estratégia para estruturar a agenda de execução. Se implementadas com racionalidade e ciência, o agro brasileiro será um dos maiores beneficiados pela demanda alinhada às políticas ESG. 

Imagine a seguinte analogia. Sua casa, em uma planície aberta, está na rota de uma manada de búfalos em disparada incontrolável. Qual é sua melhor alternativa? Contar com uma cerca paralela ao sentido dos búfalos, que gradualmente desvie-os para uma rota em que não causem destruição ou tentar pará-los, forçando-os a recuar? 

Há também os que preferem simplesmente ignorar que os búfalos existem! 

Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária 

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