Uma nova onda de crescimento toma o mercado de geração de energia eólica no Brasil – a de utilização da eletricidade dos ventos para quebrar as moléculas da água e, a partir daí, produzir hidrogênio verde, o combustível do futuro. Não fosse isso, o setor entraria em uma fase de estabilização, com avanço de 33% no período de 2021 a 2026, como projeta a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao governo. Pare se ter uma ideia do quanto esse percentual é pequeno, basta comparar com 2022, quando, apenas em um ano, a capacidade eólica instalada avançou 27%.
“Chegamos a um estado de consolidação da energia eólica. Entraríamos, agora, em uma curva normal de produção. Mas o hidrogênio verde vai trazer um ponto de inflexão para aumentar a demanda”, avalia a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), Elbia Gannoum.
Ela acredita que, em um cenário de busca global por energia limpa, a eletricidade eólica saia na frente, por sua oferta abundante e preços competitivos. O diferencial, no entanto, não será apenas esse, mas também a capacidade de ser utilizada como matéria-prima na produção do combustível renovável, hoje considerado a melhor alternativa a fósseis como gasolina e óleo diesel, e essencial à eletrificação das economias.
Na fabricação do hidrogênio verde, a energia eólica é usada para separar as moléculas de hidrogênio das de oxigênio da água, em um processo chamado eletrólise. Essa tecnologia ainda é aplicada em baixa escala, o que impede a sua viabilidade econômica, por enquanto. A expectativa, porém, é que o quadro se reverta nos próximos anos. As empresas do setor eólico já se preparam para isso.
Segundo a consultoria McKinsey, em um cenário de desenvolvimento acelerado do hidrogênio verde, serão necessários investimentos de US$ 200 bilhões para adicionar 180 gigawatts (GW) de capacidade instalada de energias renováveis no Brasil, sobretudo eólica. Isso significa praticamente dobrar a potência atual instalada, de cerca de 200 GW.
“Temos a matéria-prima que todo mundo quer ter. Essa é uma oportunidade para o Brasil se reindustrializar, se tiver as políticas certas”, afirmou Lucas Araripe, diretor-executivo da Casa dos Ventos, maior desenvolvedora de projetos de geração eólica do país.
Para esta quarta onda de desenvolvimento do setor, a empresa desenvolve a estratégia de agregar valor à eletricidade. Além de produzir e comercializar elétrons, a Casa dos Ventos se prepara para vender também soluções verdes, utilizando para isso a energia eólica. Um pré-contrato foi assinado, em dezembro do ano passado, com o Complexo Portuário de Pecém, no Ceará, para a construção de uma unidade fabril que terá capacidade de até 2,4 GW de eletrólise para a produção de hidrogênio e amônia verdes.
A ideia, portanto, é transformar a energia eólica em produtos de baixa emissão para serem consumidos no mercado interno e internacional. O início da primeira fase da operação está previsto para 2026. Enquanto isso, o projeto passa pela etapa de licenciamento e engenharia básica. Esse é, portanto, um movimento já em curso e não de longo prazo, como pode parecer.
A comercialização dos dois produtos é considerada uma via de exportação das energias renováveis e de descarbonização de países do hemisfério norte. O foco da Casa dos Ventos é a participação em leilões na Europa e também o atendimento a um mercado de menor porte no Brasil. Não há limites de investimento nessa quarta onda da geração eólica, de acordo com Araripe, porque a transição energética vai gerar uma demanda de proporções gigantescas.
A percepção do executivo é, no entanto, de que essa nova fase do setor não vai substituir por completo a anterior, de participação no mercado livre, em que o consumidor de grande porte contrata a energia diretamente do gerador e comercializador. A segunda etapa havia sido a de participação intensiva das eólicas nos leilões de compra de capacidade da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
O pontapé do setor foi o Programa de Incentivos às Fontes Alternativas (Proinfa), criado pelo governo em 2002, para ampliar a presença das fontes renováveis na matriz energética nacional. Atualmente, o setor eólico possui capacidade instalada em operação comercial de 25 GW, em 890 parques, instalados em 12 estados. Esse volume representa 13,1% da matriz elétrica, segunda maior participação, atrás apenas da fonte hidrelétrica (54,3%).
Fonte: Revista Forbes