Pat Naoum não tinha a intenção de pintar um jogo inteiramente à mão. Muito menos esperava passar sete anos inteiros fazendo isso. Mas, em 28 de julho, o pintor – que se tornou designer gráfico e, posteriormente, designer de jogos – lançou seu primeiro título, que está disponível para Nintendo Switch e no Steam, com versões para Windows e Mac.
The Master’s Pupil, que pode ser traduzido como “a pupila do mestre”, é um puzzle de aventura que explora o olhar artístico do famoso pintor impressionista francês Claude Monet (daí o nome). Os jogadores viajam por suas obras e o ajudam a concluir suas pinturas resolvendo quebra-cabeças fantásticos.
Até o momento da publicação deste artigo, a hashtag #themasterspupil já acumulava mais de nove milhões de visualizações no TikTok. Não é surpreendente que um jogo independente esteja causando tanto alvoroço na internet, especialmente considerando que foi lançado no auge da febre da inteligência artificial.Crédito: The Masters Pupil
Hoje em dia, qualquer pessoa pode usar um software de IA generativa para criar jogos decentes em questão de minutos. Porém, Naoum passou três anos inteiros aprendendo a programar, e vários outros pintando à mão, usando um scanner de filme e trabalhando exaustivamente no Photoshop.
O jogo faz parte de uma onda recente de animadores que estão abandonando o 3D de alta fidelidade em prol de um visual propositadamente menos polido. Em The Master’s Pupil, o resultado é uma estética com textura única que aparenta ser tridimensional, apesar de ser plana.
Embora não seja hiper-realista, a sensação é de estar próximo do mundo real, como se uma pintura tivesse se desprendido dele e fosse reconstituída dentro da tela.
“Trabalho com Photoshop há mais de 20 anos, mas sabia que, na verdade, seria mais rápido pintar à mão e depois digitalizar, porque existe um certo nível de composição de textura que só é possível alcançar dessa forma”, explica Naoum.
Para obter esse efeito, ele primeiro desenhou a lápis um esboço dos diversos elementos que comporiam o jogo – como as plataformas por onde o personagem pode caminhar e objetos com os quais pode interagir.
Naoum testou o design no motor de jogo Unity para garantir a jogabilidade do game. Depois, imprimiu o que se tornaria o template do jogo e pintou cada detalhe com tinta acrílica. Em seguida, digitalizou e montou tudo no Photoshop.
O processo de digitalização teve um papel importante no visual final do game. “As partículas de poeira na superfície do scanner foram digitalizadas, criando toda a textura que vemos”, explica Naoum.
Enquanto a lente do scanner percorria a pintura, ela até capturava pequenos pedaços de tinta que projetavam sombras sobre a superfície do papel. “Parecem objetos de verdade em um mundo estranho e abstrato”, acrescenta.
OS JOGADORES VIAJAM PELAS OBRAS DE MONET E O AJUDAM A CONCLUIR AS PINTURAS RESOLVENDO QUEBRA-CABEÇAS FANTÁSTICOS.
O motivo pelo qual essa inusitada abordagem deu certo é porque Naoum optou por pintá-lo à mão por uma razão específica. Ele escolheu fazer isso porque toda a trama gira em torno da vida de um pintor. A inspiração surgiu, na verdade, de imagens em close de olhos humanos.
E se o jogo pudesse acompanhar a jornada de um personagem fictício, começando na borda de sua íris e terminando no “grande vazio escuro” da pupila?, ele pensou. No entanto, esse personagem logo se transformou em uma figura histórica, e Naoum encontrou inspiração em Monet, que teve catarata por volta dos 60 anos e acabou ficando cego do olho direito.
O game consiste em explorar várias pinturas do artista: é possível passear pela ponte arqueada de sua famosa tela “A Lagoa de Lírios d’Água” ou empurrar uma grande bola laranja até perceber que está levando o sol para o seu lugar acima de um horizonte enevoado.
À medida que o jogador avança de nível, o estilo de pintura também muda para retratar o próprio estilo Monet, que, segundo Naoum, se tornou cada vez mais abstrato conforme o artista começou a perder a visão.
O jogo leva cerca de cinco horas para ser concluído, embora Naoum tenha ouvido falar de pessoas que levaram quase o dobro desse tempo para terminá-lo. “Várias me disseram: ‘estou indo devagar para aproveitar ao máximo’”, diz ele, rindo.
Texto: ELISSAVETA M. BRANDON