O crescimento das plataformas de apostas alterou os hábitos de consumo, comprometendo a renda familiar, a saúde do trabalhador e, consequentemente, a produtividade das empresas. Consultorias, institutos de pesquisa e bancos apontam que parte da população tem deixado de priorizar a compra de itens essenciais, como alimentos e medicamentos, e de pagar contas básicas, para fazer apostas.
Levantamento do Instituto Locomotiva divulgado em agosto revelou que 52 milhões de brasileiros já fizeram apostas esportivas, as chamadas ‘Bets’, ao menos uma vez — um aumento significativo em relação aos 38 milhões registrados no primeiro semestre. O estudo mostra que 37% dos usuários de aplicativos de apostas usam recursos destinados a necessidades básicas, e 45% relataram prejuízos financeiros.
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Diante desse cenário, o Sistema Federação das Indústrias de Mato Grosso (Sistema Fiemt) está ampliando a discussão do tema com os empresários, e iniciará uma campanha interna para conscientizar os funcionários e sindicatos do setor. Neste sentido, o Sesi MT lançará em dezembro um programa de educação financeira que abordará questões de como lidar com o consumo e cuidados com a saúde mental.
O ambiente de trabalho moderno, muitas vezes marcado por estresse e pressão, pode levar indivíduos a buscar formas de alívio ou escape, e os jogos de azar online podem se tornar uma alternativa aparentemente acessível. O vício em apostas online está levando os trabalhadores a perderem dinheiro, pedir ajuda financeira para cobrir dívidas e pagar despesas domésticas.
“Este é um fenômeno recente e que nos preocupa profundamente. Temos visto o impacto das apostas online não apenas na produtividade, mas principalmente na vida pessoal e financeira dos trabalhadores e suas famílias. É uma questão urgente para o setor industrial e para a sociedade como um todo. O Sistema Fiemt está comprometido em ampliar o debate sobre este tema, promovendo uma conscientização que alcance tanto as empresas quanto os sindicatos, para que juntos protejamos a segurança e o bem-estar dos trabalhadores”, afirma Silvio Rangel, presidente do Sistema Fiemt.
O vício em apostas, o endividamento dos funcionários e a consequente queda de produtividade nas indústrias foram temas de discussão em reunião de diretoria da Fiemt. Dados apresentados pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), compilados pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), detalharam o impacto das apostas na economia nacional. Conforme o levantamento, o país lidera o ranking mundial de acesso à bets e os brasileiros acessam quatro vezes mais do que nos EUA e o dobro da população do Reino Unido.
De acordo o empresário e vice-presidente da federação, Gustavo de Oliveira, as apostas também colocam em risco a segurança dos trabalhadores. “Temos relato de funcionários que se isolam em banheiros para apostar e de outros que jogam enquanto operam máquinas ou dirigem veículos. Esse é um assunto que merece atenção redobrada porque coloca em risco saúde financeira das famílias e a segurança nas empresas,”, afirma.
Apostas causam endividamento
O Governo Federal está criando regras para regulamentar as empresas que operam nesse segmento no país, incluindo o banimento de sites e limitação. Em agosto, a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) divulgou um estudo que indica que 63% dos brasileiros que apostaram em bets comprometeram parte de sua renda. Entre esses, 23% deixaram de comprar roupas, 19% reduziram as compras no supermercado, 14% diminuíram gastos com higiene e beleza, e 11% reduziram despesas com saúde e medicamentos.
Bolsa Família e apostas virtuais
Já o Banco Central divulgou que 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família destinaram R$ 3 bilhões às casas de apostas virtuais apenas no mês de agosto.
“A falta de educação financeira é um grave problema em nossa sociedade. Precisamos ampliar esse assunto e torná-lo rotina nas escolas, famílias e empresas”, defendeu o empresário e vice-presidente da Fiemt, Frank Almeida, durante a reunião de diretoria.
O setor industrial sugere uma série de medidas para a regulamentação das apostas, incluindo a suspensão temporária do uso de PIX para esse fim e a imposição de limites por transação, visando controlar os fluxos financeiros.
Recomenda-se, ainda, a criação de uma força-tarefa dedicada à prevenção do superendividamento dos apostadores, além de proibir o uso de cartões de crédito para esses pagamentos. No campo da comunicação, propõe-se uma publicidade saudável e socialmente responsável, com alertas sobre os problemas sociais associados à compulsão por jogos e seu impacto na saúde mental dos apostadores. Por fim, as entidades industriais solicitam a proteção do usuário, monitoramento dos padrões de gastos dos apostadores e exclusão daqueles que desrespeitem a política do jogo responsável, para prevenir a compulsividade.
Texto: Eduardo Cardoso