Novidade abre portas para maior uso do grão no crescente mercado de alternativas vegetais, em especial para substituir a ervilha
Pesquisadoras da Embrapa Agroindústria de Alimentos desenvolveram um concentrado proteico a partir do feijão carioca que poderá ser usado como ingrediente de alta qualidade para produtos que vão desde pães, bebidas e suplementos alimentares até os plant-based – alimentos à base de vegetais que têm sabor e textura similares aos de origem animal, como hambúrgueres, empanados e linguiças, por exemplo.
Com quase 80 gramas de proteína para cada 100 gramas do produto, o ingrediente é resultado de um estudo com a proteína de feijão que começou em 2019 e contou com recursos da Embrapa e do Programa de Incentivo à Pesquisa do The Good Food Institute (GFI). Além de valorizar a produção do grão no Brasil, a iniciativa abre portas para o uso do feijão no crescente mercado de alternativas vegetais, principalmente como substituto da ervilha, que é muito utilizada pelo setor, mas precisa ser importada.
“Estamos trabalhando com uma matéria-prima de origem nacional que todo mundo conhece e está habituado. O concentrado de feijão funciona como um substituto de ingredientes importados e, também, da proteína de soja que pode ser produzida no Brasil, mas que alguns consumidores optam por não comprar”, afirma a pesquisadora Janice Lima.
Testes sensoriais
A equipe de pesquisa também realizou teste sensorial com voluntários para verificar a aceitação de alimentos feitos com o ingrediente de concentrado proteico de feijão. Para isso, ele foi incorporado em produtos vegetais análogos aos de origem animal.
“Usando o concentrado proteico que obtivemos e um já comercializado no mercado, não houve diferença de aceitação pelos participantes. Ficamos muito satisfeitos com o resultado alcançado”, diz a pesquisadora Ilana Felberg.
Em avaliações de laboratório, a Embrapa verificou que o concentrado de feijão tem características muito semelhantes a outros produtos existentes no mercado que são “clean taste”, ou seja, têm um sabor mais neutro que influencia menos o gosto final do produto.
“Outra característica interessante é que esses concentrados proteicos são a base para produzir as proteínas texturizadas, como a de soja, por exemplo. Isso significa que existe um potencial de produção de proteína texturizada de feijão a partir desse ingrediente”, afirma Janice Lima.
Oportunidade de mercado
De acordo com a especialista em ciência e tecnologia do GFI no Brasil, Graziele Karatay, o projeto desenvolvido pela Embrapa é de grande relevância porque oferece uma nova fonte de ingrediente nacional para a indústria de produtos plant-based.
“Inicialmente, um novo ingrediente pode ser mais caro quando comparado aos tradicionais, como soja e ervilha, devido ao pequeno volume de produção. Mas estudos de escalonamento podem tornar o produto competitivo, inclusive com oportunidade de exportação. O mercado de proteínas alternativas no Brasil vem crescendo e acreditamos que o ingrediente desenvolvido pela Embrapa tem aptidão para se tornar mais uma opção”, afirma.
A pesquisadora Janice Lima acrescenta que as indústrias que já produzem concentrado proteico de soja por via úmida, por exemplo, têm potencial para produzir o de feijão porque a linha de produção com máquinas e equipamentos é basicamente a mesma.
Uso integral do feijão
A pesquisa da Embrapa ainda estudou o aproveitamento dos resíduos gerados com a extração da proteína dos grãos de feijão carioca, visando otimizar o uso. Como resultado, foi possível obter três ingredientes com potencial de aplicação em produtos processados a partir do resíduo resultante da extração da proteína.
O primeiro deles apresentou 30% de fibra e poderia ter a mesma aplicação de farelos de cereais, como os de milho, trigo e arroz. O segundo é o amido do feijão, cujos estudos para entender melhor seu potencial de uso e aplicação estão em andamento e devem ser concluídos ainda em 2023.
“No momento, o amido de feijão e os de outras leguminosas não são muito utilizados. Mas, com os resultados preliminares das análises, estamos observando o potencial de aplicação em produtos de panificação como biscoitos, brownies e massa de tortas. Poderíamos direcionar esse amido para esses tipos de produtos”, diz a pesquisadora Melicia Galdeano.
Já o terceiro ingrediente resultou da extração da proteína e do amido, com um teor de fibra de 64%. “Essa quantidade é muito interessante e a fibra avaliada tem a capacidade de reter cinco vezes o seu peso em água, o que é uma característica muito desejada pela indústria de alimentos”, afirma a pesquisadora.
Texto: Redação Exame