quinta-feira,19 setembro, 2024

Em meio a debates sobre “nova fronteira de petróleo” no Brasil, pesquisa mostra que presença de diesel na água mata espécie de mangue

Cientistas avaliaram, em laboratório, os efeitos do óleo diesel na germinação de espécies de plantas de mangue – análise importante para entender a sensibilidade às fontes poluidoras na costa

As sondagens para a possível exploração de petróleo e gás na Bacia do Pará-Maranhão e na foz do Rio Amazonas têm se intensificado na última década, aumentando o risco de vazamentos de derivados do petróleo nestas regiões. O diesel, por exemplo, está presente em todo o processo de extração: no transporte, na carga, nos equipamentos. Pesquisadores da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) testaram em laboratório os efeitos da presença do combustível na germinação de plantas de mangue e concluíram que a Laguncularia racemosa, conhecida como mangue-branco, sofre intensos efeitos do contaminante.

Em experimento, os especialistas observaram que o contato com crescentes volumes de óleo diesel na água matou 80% dos propágulos da L. racemosa, que são estruturas que se desprendem de uma planta adulta e funcionam como sementes. A velocidade de germinação também diminuiu à medida que a quantidade do contaminante aumentou. Outra espécie estudada, a Avicennia germinans, não apresentou mortalidade significativa no mesmo contexto. As conclusões estão publicadas na edição desta sexta-feira (27) da revista “Acta Amazônica”.

Os propágulos das duas espécies foram mergulhados em uma emulsificação do óleo em água de mangue com diferentes percentuais de óleo diesel e comparados com uma amostra de controle, sem o óleo. Após o tempo característico de germinação de cada espécie, foi verificada a taxa de propágulos germinados, indicador do impacto da contaminação.

Os manguezais não apenas mitigam os impactos negativos das mudanças climáticas, regulando o clima e estocando carbono, como também ajudam as comunidades locais a se adaptarem aos seus efeitos, funcionando como uma barreira para protegê-las de enchentes, erosão, elevação do nível do mar e outros eventos climáticos extremos. Os mangues são ainda fonte de uma enorme biodiversidade, que se converte em alimentos e outros recursos naturais. Além disso, cerca de 70% das espécies comerciais marinhas realizam pelo menos uma etapa do seu processo de reprodução nesse ambiente.

Segundo Josélia Martins, primeira autora do artigo, o diferencial da pesquisa da UFMA é mostrar o efeito da poluição por óleo diesel no processo de germinação enquanto os propágulos estão imersos nas águas de estuário. “O conhecimento do que ocorre na fase de germinação dos propágulos é muito importante, pois é uma fase primordial. Sem ela, as demais não são possíveis. O que nos surpreendeu foi a ausência de resposta significativa da espécie Avicennia germinans durante a germinação em contato com o óleo diesel nos volumes utilizados neste estudo, ao contrário do que ocorreu com a Laguncularia racemosa. Esse resultado denota maior resiliência da outra espécie”, comenta Martins.

Os pesquisadores apontam que o conhecimento de que uma ou mais espécies de mangue não consegue germinar adequadamente na presença de óleo emulsificado na água estuarina pode auxiliar na formulação de políticas públicas de conservação e restauração do manguezal, ecossistema importante para manter a qualidade da zona costeira para a população e para os animais e também para a absorção de carbono. Os resultados também podem orientar profissionais em situações de desastres com derramamento de óleo. Neste caso, saber quais espécies são mais afetadas pode mudar a forma de atuação dos especialistas durante os esforços para a limpeza da área atingida.

O próximo passo do grupo de pesquisadores será plantar os propágulos das duas espécies — a que obteve sucesso na germinação e a que teve uma alta taxa de mortalidade — enquanto mergulhados em água e óleo diesel e acompanhar o seu desenvolvimento. Com esse processo, eles vão poder observar os efeitos do óleo durante o crescimento das plantas.

“Também queremos dar continuidade aos estudos com outros tipos de derivados de petróleo, como o óleo diesel marítimo e o óleo bunker”, conclui Martins.

Texto: Um só Planeta

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