Considero um privilégio estar imerso em um ambiente que me permite viver a realidade da inovação aberta diariamente. Isso porque é inspirador ver na prática a colaboração de empresas que perceberam que não precisam depender somente de recursos internos para aprimorar suas entregas, mas que atuar em conjunto com outras companhias que possuem os mesmos desafios, com startups, com o meio acadêmico e demais players, é benéfico para todo um setor, além de impulsionar todos para frente.
Como de costume, gosto de recorrer a obras literárias ou audiovisuais para contextualizar as ideias. Hoje peço apoio de Alan Turing, este britânico gênio matemático e criptoanalista, que, em “O Jogo da Imitação”, usou todo seu talento para unir forças e desenvolver um modo de decifrar os códigos da máquina Enigma, durante a Segunda Guerra Mundial. Este resultado só foi possível graças ao compartilhamento de expertises e muito trabalho conjunto. Talvez um exemplo prático de como essa união de conhecimentos surte efeito, comprovando que é uma estratégia válida para levar para o campo empresarial.
Vale ressaltar que, para que isso seja possível, é essencial que a estratégia de inovação esteja completamente alinhada à estratégia de negócio da companhia. Assim, há mais direcionamento para que as soluções desenvolvidas ao longo do tempo resolvam não somente os problemas atuais, mas também contribuam para objetivos de longo prazo da organização.
Em um ambiente repleto de incertezas em que tendências tecnológicas viram realidade num piscar de olhos, há de se ter velocidade para atender as novas demandas e expectativas de usuários e consumidores, fazendo com que a área de inovação seja demandada com frequência. De acordo com um estudo da PwC sobre inovação em escala global que entrevistou mais de 1,7 mil empresas em mais de 25 países, nos últimos 3 anos, as empresas campeãs em inovação cresceram em um ritmo 16% mais acelerado de que o grupo menos inovador da amostra. A projeção das mais inovadoras é que sua taxa de crescimento nos próximos anos chegue a quase o dobro da média global e mais que o triplo da projetada pelas menos inovadoras. Na média, isso significa para a empresa US$ 500 milhões a mais em receita no período de cinco anos.
Ou seja, as companhias que não estiverem prontas para atuar com inovação aberta dentro de sua estratégia terão mais dificuldade de se manterem competitivas. Um bom exemplo de quem aplicou esse conceito foi o Itaú BBA com Accountfy, startup de gestão financeira e contábil com automação avançada integrada ao Enterprise Resource Planning (ERP). No ano passado, as duas empresas, juntas, criaram uma plataforma para uso dos clientes do banco a fim de consolidar, automatizar e transformar dados gerenciais em informações para tomada de decisões estratégicas visando a saúde financeira das empresas. O aplicativo tem, inclusive, funcionalidades relevantes para perspectivas futuras, como modelagem para projeções de demonstrações financeiras, Demonstração de Resultado de Exercício, Balanço Patrimonial e Fluxo de Caixa, apoiando gestores financeiros no gerenciamento de tempo para direcionar as melhores estratégias para o negócio.
Entre os tipos de inovação que as empresas podem apostar estão a inovação incremental, inovação revolucionária e inovação radical, sendo a primeira relacionada a um aprimoramento em produtos ou serviços que já existem. A Nike constantemente aposta neste tipo de abordagem, com foco no design dos calçados e melhoria na disponibilidade dos modelos de tecnologia para a prática de esportes por meio amortecimento da pisada, materiais, conforto do atleta, entre outros tópicos. Isso interfere diretamente no desempenho dos atletas.
A segunda, intitulada revolucionária, altera tecnologias e modelos de negócio de uma maneira mais expressiva, de modo que pode mudar diretamente as regras do jogo com mais vantagem competitiva. Neste caso, a Apple é exemplo relevante quando lançou o iPhone no ano de 2007, o que mexeu com o modo de consumo da telefonia móvel e abriu um marco no mercado de smartphones.
Já a inovação radical é aquela que dá origem a mudanças drásticas em um produto ou serviço que está disponível no mercado, ou que abre uma possibilidade totalmente inédita. E um caso interessante neste quesito é a Netflix, que nasceu como uma locadora de filmes por correio e se transformou em uma das plataformas de streaming mais relevantes do mundo. As pessoas modificaram o modo de consumo de conteúdo audiovisual e passaram preferir o conteúdo disponibilizado pela plataforma de modo online e on demand. Posteriormente, passou a apostar em produções próprias, como o sucesso “Stranger Things”, “The Crown”, entre outras séries premiadas, marcando a indústria cinematográfica.
Voltando a citar os insights obtidos pela pesquisa da PwC, as empresas campeãs de inovação citaram que visam uma proporção maior de inovações revolucionárias e radicais, sobretudo em produtos, serviços, tecnologias e modelos de negócio, o que registra uma mudança de mindset importante, visto que, anteriormente, as companhias chegavam a dedicar até 90% do investimento total a avanços incrementais. Outro ponto é que, nas mais inovadoras, a parcela da receita gerada por novos produtos e serviços é significativamente maior. Cerca de 25% da receita das mais inovadoras vinham de produtos e serviços inovadores lançados no ano anterior. Nas menos inovadoras, a parcela era de apenas 6,6%. Isso mostra o quanto o investimento em inovação permite abrir novas possibilidades de avanço e crescimento.
Ainda de acordo com o levantamento da PwC, os maiores desafios enfrentados pelas corporações estão relacionados a levar ideias inovadoras ao mercado de forma rápida e escalável (54%) e encontrar e reter grandes talentos para que a inovação se materialize (53%). E é neste ponto que volto a trazer a importância da inovação aberta e do quanto estar disponível a receber contribuições externas pode ser a diferença para o sucesso de uma companhia. Estruturas menores, como as das startups, podem resolver as questões relacionadas ao desenvolvimento de soluções inovadoras prontas para escalar.
*Opinião: Paulo Costa
Paulo Costa iniciou sua carreira como empreendedor digital com a participação na fundação e desenvolvimento de diversas startups. Em 2015, passou a fazer parte do mundo executivo na Accenture, onde ficou por cinco anos como diretor de inovação, boa parte deles dentro do próprio Cubo. O atual CEO do hub de fomento ao empreendedorismo tecnológico do Itaú também foi um dos responsáveis por apoiar o fundo Neo Future, da gestora de fundos de investimentos Neo, onde conduzia desafios relacionados a estratégias digitais e inovação, tendências e comportamento de consumo.