Às vésperas do Enem, grupo afirma que órgão vive ‘crise sem precedentes, com perseguição aos servidores, assédio moral, uso político-ideológico da instituição pelo MEC e falta de comando técnico’. Inep não se manifestou.

Servidores do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) reuniram em um documento, nesta sexta-feira (19), uma série de denúncias de assédio e interferência, em meio à crise vivida pelo órgão. Na lista, está “possível intervenção e risco ao sigilo” na prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2021, marcada para este domingo (21).

O documento, de 36 páginas, foi compilado pela Associação dos Servidores do Inep (Assinep) e entregue a entidades e órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU).

Segundo os servidores, o instituto vive uma “crise sem precedentes, com perseguição aos servidores, assédio moral, uso político-ideológico da instituição pelo MEC e falta de comando técnico no planejamento dos seus principais exames, avaliações e censos”.

Questionado sobre o relatório, o Inep não havia se manifestado até a última atualização desta reportagem. Ao todo, o documento foi entregue para:

Comissão de Educação da Câmara do Deputados
Comissão de Educação, Cultura e Esportes do Senado Federal
Frente Parlamentar Mista da Educação
Frente Servir Brasil
Tribunal de Contas da União
Controladoria-Geral da União
Ouvidoria do INEP
Comissão de Ética do INE

Uma das denúncias apontadas diz respeito ao risco de quebra de sigilo e de intervenção ideológica no Enem deste ano, organizado pelo Inep. Segundo o documento, desde as eleições presidenciais de 2018, se vê “uma diretriz do presidente da República [Jair Bolsonaro] para indução ideológica no exame, com críticas reiteradas a diversas questões […]”.

Os servidores citam declarações do presidente e do ministro da Educação, Milton Ribeiro, que disseram que o Enem agora teria “a cara do governo”. Ambos negam acesso à prova.

Segundo o dossiê, “depoimentos de servidores indicam pressão política oriunda da presidência do órgão para retirada de questões, sem motivo idôneo, como relatado na imprensa”. Os servidores pedem que haja uma investigação para determinar se houve acesso de pessoas alheias ao processo de montagem da prova e se existiu pedido de retirada de questões.

“Além da quebra de sigilo, a censura a questões por motivos sem fundamento estatístico-pedagógico representa desvio de finalidade – implicando nulidade do ato administrativo”, diz o documento.

Interferência em exames
No relatório, a Assinep também afirma que, além do Enem, há desconsideração de critérios técnicos no planejamento e execução de outras provas de responsabilidade do órgão, como o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) e o Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida).

“Infelizmente, há repetidos exemplos de situações que indicam aparente desconsideração imotivada dos fundamentos técnicos em favorecimento a medidas de apelo político ou ideológico, colocando em risco o atendimento às atribuições legais do instituto.”
Entre os exemplos, o documento cita escolha de profissionais em discordância com os procedimentos de praxe no planejamento do Revalida, invasão de competências e até apagamento de dados contrários ao posicionamento da presidência do Inep.

Denúncias de assédio
Os servidores denunciam ainda terem sido submetidos a “procedimentos constrangedores”, sobrecarga de trabalho, jornadas acima de oito horas diárias e atuação aos fins de semana, além de “clima de insatisfação e adoecimento”, rotatividade de profissionais e “dificuldade de reter pessoal em virtude do aquecido mercado de tecnologia da informação”.

Segundo o documento, “desde situações macro como pronunciamentos públicos da Presidência da República e do Ministro de Estado da Educação, até no âmbito interno de gestão, há um aparente processo de silenciamento, criação de barreiras burocráticas, alongamento de processos e intervenções não fundamentadas de assessorias presidenciais sobre as áreas técnicas”.

“Estes procedimentos, alguns com aparência de legalidade quando isolados, se acumulam para criar um clima organizacional de insegurança e de ataques à capacidade dos servidores de desempenharem as funções do Inep.”

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