Assim como em algumas outras profissões, o ingresso da mulher na carreira militar acontece a passos lentos. As construções tradicionais de gênero atrelaram o conceito do feminino à vulnerabilidade e fraqueza, fazendo com que, dessa forma, o militarismo fosse visto por muitos como uma opção apenas para homens. No entanto, o potencial feminino vai contra esses estereótipos sociais.
A Coronel BM Luciana Bragança, Corregedora Geral e Diretora de Segurança Contra Incêndio e Pânico, foi a primeira mulher a ocupar esses cargos dentro do Corpo de Bombeiros Militar do estado de Mato Grosso (CBMMT). A militar teve sua inclusão iniciada na primeira turma de bombeiras em 09 de março de 2001, coincidentemente, um dia depois do Dia Internacional da Mulher. Desde então, o número de mulheres vem crescendo dentro da corporação militar.
Luciana foi a primeira mulher Comandante de um batalhão (1° Batalhão, o Cacique), a primeira mulher Comandante Regional, ocupou diversos cargos e funções e em 2021 passou a ocupar o mais elevado posto, a patente de Coronel, fazendo história em Mato Grosso.
O CBMMT possui mais de 1.300 militares, sendo apenas cerca de 90 mulheres, pouco mais de 6% do efetivo total. A Lei Complementar nº 530, de 31 de Março de 2014, prevê 10% de vagas destinada ao público feminino.
Dentro do militarismo existe uma estrutura hierárquica que define como as atividades desenvolvidas serão divididas, organizadas e coordenadas. Ao todo, são 12 postos. O posto de Coronel é o mais alto no Corpo de Bombeiros Militar.
“Ao longo da minha carreira, acredito que todas as oportunidades que eu tive, com certeza não foi pelo fato de ser mulher, mas sim por ser uma profissional com competência para exercer as funções. O nosso atual Comandante Geral, Coronel BM Alessandro, coloca em prática a meritrocracia dentro da Corporação. Não é fácil, mas nós já temos muitas oficiais exercendo função de comando e liderança. Isso foi conquistados com esforço e dedicação”, diz.
A maternidade é um assunto que sempre é colocado em pauta quando falamos da carreira profissional de uma mulher, principalmente se essa carreira for no militarismo, que requer 100% de entrega a serviço da sociedade. “Eu tenho uma filha de 10 anos, e eu sei que todos os meus desafios e conquitas também foram vividos por ela. Na nossa carreira, conciliar a maternidade com o militarismo é um dos maiores desafios que enfrentamos.”
A Coronel BM Luciana é graduada em Gestão em Segurança Pública e Privada, com três especializações dentro da mesma temática. Além disso, possui formação em mais de 10 cursos de especialização na área militar.
A militar explica que os espaços existem e precisam ser ocupados também por mulheres, mas é necessário estar preparada para isso. Nenhuma função ou responsabilidade aparece sem o devido preparo. “Ter alcançado o alto escalão e fazer parte dele é de grande reprentatividade”, relata ela, orgulhosa do feito. O alto escalão é composto por 14 militares que ocupam os mais importantes cargos e alcançaram o maior posto dentro do CBMMT.
“Uma coisa muito importante de se falar sobre Mato Grosso é que as nossas legislações, em comparação a outros estados, estão bem avançadas. Eu participei do último Encontro Nacional de Bombeiras Militares e percebi que enquanto umas estavam discutindo legislações sobre maternidade, nós já tínhamos isso aqui desde 2011 que foi, inclusive, quando eu mesma estive gestante”, conta.
De acordo a Coronel, os espaços estão sendo ocupados naturalmente e, segundo ela, o que precisa progredir é a proporcionalidade do efetivo feminino. Ela relata que sente o peso da responsabilidade pelo cargo que ocupa. Segundo ela, é como se fosse uma espécie de projeto piloto e que muitas mulheres se inspiram no seu trabalho.
A Corregedora conta que a sua maior inspiração veio de seu pai que também é militar e conta que recebe muito apoio da família para seguir por esse caminho. Inclusive, chega a brincar que, devido ao orgulho que sente, sua mãe prefere sair com a mesma estando fardada.
“Nada veio fácil, meu pai me incentivou a não desistir. A maternidade é um desafio ainda maior que o militarismo. Quando a minha filha nasceu, por exemplo, foi muito desafiador, Não sentir culpa por deixá-la algumas vezes foi difícil. Sempre que acontece alguma solenidade ou algo tipo e eu levo minha filha comigo, eu quero que ela entenda a importância do meu trabalho. Quando fui nomeada foi tão bacana receber esse retorno das pessoas que torceram por essa conquista”.
A Coronel cita ainda que é um desafio das corporações de maneira geral proporcionar espaços, equipamentos e EPI’s adequados para o corpo feminino, mas que já existem discussões sobre o assunto a fim de trazer melhorias nesse sentido. As estruturas militares por todo Brasil ainda carecem por exemplo, de vestiários adequados, mas conforme os espaços forem sendo ocupados, as mudanças irão surgir.
Texto: Victória Oliveira