Uma pesquisa recente de um banco de investimentos sugeriu que a IA generativa poderia gerar um aumento de 7% no PIB global. Mas, e se essas afirmações esbarrarem em um tipo de falácia? E se a IA for tão transformadora que torne conceitos como o PIB obsoletos?
E se esse conceito se tornou um vestígio de um passado em que precisávamos de instrumentos de medição simples porque não tínhamos as ferramentas para medir o mundo de forma complexa e porque o próprio mundo era menos complexo e multifacetado?
O PIB mascara muitos dos maiores desafios econômicos:
– Não leva computa os efeitos mais amplos da atividade econômica;
– Mede a produção total de uma economia, mas não leva em conta a distribuição dessa produção;
– Não capta nada sobre a qualidade e a variedade de bens e serviços que uma economia produz;
– Não mede alguns dos aspectos mais importantes do bem-estar geral de um país, desde a saúde até a felicidade dos cidadãos;
– Principalmente, o PIB não capta a totalidade das transações não-mercantis, que são parte fundamental da vida.
Em 1968, o senador norte-americano Robert F. Kennedy afirmou que o PIB media “tudo, menos o que faz a vida valer a pena”. Desde então, várias formas alternativas de medição foram propostas. O GPI (Genuine Progress Indicator ou Indicador de Progresso Genuíno) talvez tenha sido o modelo mais convincente.
O GPI procurou refinar o PIB ajustando o medidor à qualidade de vida e ao impacto ambiental. No fim das contas, ele foi descartado – os atrativos de uma medida amplamente compreendida, facilmente comparável e conveniente, como o PIB, mostraram-se mais fortes.
No Reino Unido, o governo de David Cameron lançou o Measuring National Well-Being Program (Programa de Mensuração do Bem-Estar Nacional), uma tentativa de coletar dados sobre áreas como saúde, satisfação no trabalho e segurança econômica. Embora o programa ainda esteja em andamento e tenha produzido uma série de insights interessantes, seu impacto foi limitado.
Isso nos deixa diante da necessidade de encontrar maneiras de atualizar o PIB para a revolução da IA. São necessárias métricas mais abrangentes e inclusivas, que levem em conta os aspectos intangíveis da vida econômica para avaliar plenamente o crescimento e a prosperidade de um país.
“O PIB MEDE TUDO, MENOS O QUE FAZ A VIDA VALER A PENA.”
O mundo que estamos medindo é diferente e as ferramentas à nossa disposição são diferentes, o que exige um método revolucionário de avaliação do crescimento econômico.
A IA pode nos ajudar a atualizar as formas de processamento de dados e melhorar a eficiência, tornando o PIB (ou o que poderíamos chamar de IA-PIB) uma ferramenta mais dinâmica, detalhada e, principalmente, mais útil para avaliar o desempenho econômico.
A inteligência artificial poderia nos ajudar a capturar uma gama muito maior de dados cada vez mais específicos, fornecendo uma medição aprimorada por IA que vai equivaler a medir o mundo do presente e do futuro.
Economia informal
A IA poderia analisar fontes de dados alternativas, como imagens de satélite, pagamentos móveis, atividades de mídia social e mercados online, para estimar o tamanho e a dinâmica da economia informal, que normalmente não é considerada nos cálculos do PIB.
Melhorias na qualidade
Ao processar grandes quantidades de dados de avaliação de produtos, feedbacks de usuários e outras informações qualitativas, a IA poderia desenvolver métricas para medir melhorias na qualidade de bens e serviços que podem não estar refletidas nos índices de preços tradicionais.
Atividade econômica em tempo real
A IA pode analisar dados de alta frequência, como pesquisas na internet e padrões de tráfego, para fornecer insights em tempo real sobre a atividade econômica. Isso poderia complementar as medições tradicionais do PIB, que geralmente estão sujeitas a atrasos e revisões.
Atividades fora do mercado
Ao utilizar dados de pesquisas, mídias sociais e outras fontes, a IA poderia estimar o valor do trabalho não remunerado, como o trabalho doméstico e o trabalho com cuidados.
Bem-estar pessoal
A IA poderia analisar publicações em mídias sociais, pesquisas e outros dados subjetivos para criar índices que medem o bem-estar emocional, a satisfação com a vida e outros aspectos do bem-estar pessoal. Países como o Butão já usam medidas como a Felicidade Nacional Bruta (FIB) para captar esses aspectos da qualidade de vida. A ONU também adota o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que busca pontuar os países em medidas de bem-estar que não são detectadas pelo PIB.
Impacto ambiental
A IA pode processar dados ambientais complexos de várias fontes, permitindo o desenvolvimento de índices que medem a sustentabilidade ambiental da atividade econômica.
Se continuarmos focando obsessivamente no PIB, não estaremos reconhecendo como o mundo mudou radicalmente nas últimas décadas e como continuará mudando drasticamente sob o impulso da IA.
Algumas dessas medidas já existem, mas, com essas novas ferramentas, o potencial de especificidade, detalhamento e precisão aumenta a cada dia.
A medição é um dos elementos fundamentais de qualquer economia. Precisamos garantir que as ferramentas que usamos para avaliar o desempenho estejam na vanguarda da sofisticação.
Texto: IGOR TULCHINSKY