Somente um equilíbrio entre Estado e iniciativa privada garantirá que a América Latina não perca novamente o bonde do crescimento econômico promovido pelas novas tecnologias.
A avaliação é da pesquisadora Carlota Perez, para quem o Brasil ainda tem a capacidade de liderar esse salto de desenvolvimento.
A economista abriu nesta segunda-feira (29) o curso Nova Economia para Jornalistas promovido pelo iFood com o jornal Folha de S.Paulo. Perez é considerada uma das grandes especialistas nas relações entre as mudanças tecnológicas e o desenvolvimento econômico.
Para ela, há um padrão nos ciclos das grandes inovações e que podem nos ajudar a entender o momento atual e identificar oportunidades para o futuro. Isso porque, antes da consolidação de uma revolução tecnológica, há um momento de colapso -e o mundo vive hoje o fim desse período de quebra e recessão, diz Perez.
“Cada revolução é um conjunto distinto de oportunidades”, afirma. “Importante entender a complexidade de cada revolução e como elas abarcam processos, sistemas –e muito deles são revolucionários por si próprios.”
Um dos padrões observados pela pesquisadora é que, ao fim dos períodos de quebra e recessão, os saltos de produtividade dependem de uma atuação combinada dos governos com as empresas.
O livre mercado, diz, abre muitas oportunidades, mas não resolve o problema da desigualdade. O Estado sozinho também não dá conta do desenvolvimento.
“Nenhum país saltou à liderança e ao desenvolvimento sem uma promoção forte, clara e inteligente em inovação por parte do Estado”, afirma. “Todos tinham um Estado forte e ativo, e um setor privado dinâmico.”
Ela cita os exemplos dos países asiáticos que tiveram saltos de desenvolvimento a partir dos anos 1980, como Coreia do Sul e Singapura. Nesse último, afirma, o governo buscava na iniciativa privada os agentes de mais alto nível e experiência e com condições de lidar com a complexidade dos processos de desenvolvimento.
“Nem ao Estado, nem ao mercado”, diz Perez. O que é necessário, segundo ela, é um consenso no qual todas as instâncias governamentais atuem e atraiam as comunidades locais, permitindo a criação de redes capilarizadas de especialização.
Para Perez, o Brasil é fonte de grande preocupação justamente pela desarticulação entre as empresas e as políticas públicas.
“Há muita inovação, mas elas estão isoladas. É necessário ter um rumo claro, uma ambição de como trabalhar”, afirma. “Chama atenção a desigualdade, uma das piores do mundo, com exceção da Venezuela [Perez é anglo-venezuelana], mas creio que o Brasil tem um potencial tão grande, é um líder nato.”
A fuga de cérebros -nome dado à imigração de profissionais, que vem se intensificando no setor de tecnologia- é um drama, na avaliação de Perez, e um movimento difícil de ser revertido. “Como querem que eles fiquem aqui se não dão oportunidades verdadeiras?”
Com o Brasil a pouco mais de um mês de eleições presidenciais, Perez vê pouco espaço para diálogo caso Jair Bolsonaro (PL) seja reeleito, mas aponta que cabe à iniciativa privada “fazê-los entender, com universidades, sindicatos. Uma ação de pressão sobre os políticos.”
Participam do curso sobre a Nova Economia jornalistas, professores e estudantes de comunicação de todo o país. Serão 30 horas de treinamento em encontros semanais nos formatos online e presencial. Estão na programação discussões sobre comportamento, novos negócios, capitalismo consciente, sustentabilidade, papel do estado e relações de trabalho.