Placa de cultivo de fungo exposta fez Alexander Fleming perceber que existia uma substância capaz de matar bactérias
Era o fim das férias do médico e bacteriologista escocês Alexander Fleming, que trabalhava no laboratório do hospital St. Mary’s, em Londres. Ele estava fazendo um estudo sobre fungos e percebeu que uma placa de cultivo havia ficado exposta. Em vez de arruinar sua pesquisa, esse acidente fez o médico descobrir, em 1928, o primeiro antibiótico: a penicilina.
Ao analisar a placa que havia ficado exposta, Fleming percebeu que, ao redor do fungo, as bactérias não cresciam, o que fez ele pensar que alguma substância que as matava estava sendo liberada – esta era justamente a penicilina.
A descoberta, porém, não foi encarada como algo com potencial médico inicialmente, sendo publicada no British Journal of Experimental Pathology, e não em uma revista médica. “Demorou um tempo para a comunidade médica perceber o que aquilo significava”, diz Luiz Vicente Rizzo, alergista e imunologista do Hospital Israelita Albert Einstein, em entrevista a Época NEGÓCIOS.
Foi só em 1938 que a penicilina foi isolada, ou seja, purificada e deixada pronta para o uso, pelos cientistas Howard Florey e Ernst Boris Chain, da Universidade de Oxford. Eles desenvolveram métodos para produzir a penicilina em vastas quantidades, o que permitiu seu uso em grande escala, especialmente durante a Segunda Guerra Mundial.
Com essa descoberta, começaram a surgir outras classes de antibióticos – muitos deles usados até hoje para combater as infecções. “A partir da descoberta da penicilina passou-se a procurar substâncias semelhantes em outros fungos, e também em algas. Isso permitiu a abertura de uma nova área da farmacologia”, afirma Rizzo.
A descoberta da penicilina rendeu o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina a Fleming, Florey e Chain, por revolucionar o setor e ajudar a salvar inúmeras vidas – já que, antes da descoberta infecções bacterianas eram muitas vezes fatais.
“Foram os antibióticos, as vacinas e o controle ambiental por meio do saneamento básico que fizeram com que a gente pulasse nos últimos cem anos de uma expectativa de vida média de 35 a 40 anos de idade para 70 a 80 anos. Dobrar a expectativa de vida média do ponto de vista biológico de qualquer espécie é muito significativo”, diz Rizzo.
Combate a bactérias resistentes
Em seu discurso ao receber o Prêmio Nobel, Fleming afirmou que o uso inadequado da penicilina poderia levar ao surgimento de bactérias resistentes. E, de fato, foi isso o que aconteceu.
Segundo Rizzo, o antibiótico exerce uma pressão evolutiva sobre a bactéria. Se ela for sensível ao antibiótico, será destruída pelo sistema imunológico. Caso contrário, ela pode se tornar resistente. “Se você usa o medicamento sem necessidade ou em condições subótimas, como na dose ou no tempo de uso errado, isso facilita o surgimento de bactérias multirresistentes”, diz.
Para combater essas bactérias resistentes, pode haver uma personalização de tratamento. Entre as possibilidades, está a utilização de anticorpos monoclonais específicos para a bactéria que a pessoa tem naquele momento.
“Hoje, através de técnicas de cultura de células e biologia molecular, é possível produzir um anticorpo monoclonal com grande rapidez. Então, com uma bactéria resistente, pode-se fazer uma engenharia reversa e construir um anticorpo que reconhece aquela bactéria. Depois, deve-se produzir esse anticorpo em quantidades suficientes para que funcione como um soro antibactéria”, diz.
Outra possibilidade é a utilização de fargos, que são vírus capazes de infectar bactérias. “Pode-se construir um fargo que mate especificamente a bactéria em questão”, afirma o especialista. Mas o melhor mesmo, adverte, é usar os antibióticos da maneira correta. “Se os remédios forem utilizados corretamente, a chance de a bactéria evoluir e se tornar resistente cai muito”, afirma.
Por Thâmara Kaoru