Em painel dominado por mulheres líderes em Inteligência Artificial, Microsoft, Meta, ServiceNow e Accenture falam da evolução do SaaS e dão recado às empresas: “sucesso será de quem tiver coragem de apagar o passado para redesenhar o futuro”.

Inteligência Artificial será absolutamente revista para “redesenhar processos de pequenas, médias e até grandes empresas”, em um projeto global que, no que depender das maiores big techs do planeta, deverá “virar o mundo de cabeça para baixo”.

Essa foi a avaliação de Raji Rajagopalan, VP da Microsoft Core AI, no painel ‘Aproveitando agentes de IA para o sucesso empresarial: insights de especialistas em IA’, ocorrido na GTC 2025, conferência global de Inteligência Artificial da NVIDIA.

A executiva não decretou necessariamente a “morte do SaaS”, mas disse que estamos à beira de uma nova era onde a capacidade de adaptação dos agentes redefinirá a forma como o software é construído.

“A maneira como escrevo código agora é muito diferente de como eu escrevia há 15 anos. Hoje, converso com o copiloto para escrever código, para depurar meus problemas. Agora, a linguagem natural é a maneira como vamos programar. Tudo vai mudar fundamentalmente”, disse, enfática.

Para a VP, a capacidade de evolução dos agentes de IA representa uma mudança de paradigma em relação ao software tradicional, que opera com base em regras e fluxos de trabalho pré-definidos.

“A essência da transformação impulsionada pelos agentes está na capacidade de aprendizado e adaptação contínuos. Nós, como humanos, fazemos isso o tempo todo. Estamos constantemente aprendendo, atualizando nossa base de conhecimento e nos adaptando ao mundo e ao que o mundo está nos pedindo para fazer. Isso é o que queremos que o software faça também. E esse é o poder que vamos desbloquear com os agentes”, afirma. 

Agentes de IA próprios para todo negócio

Rama Akkiraju, da Nvidia; Clara Shih, da Meta e Raji Rajagopalan, da Microsoft.

Dorit Zilbershot, Group VP of AI Experiences & Innovation da ServiceNow, avalia que, na nova realidade, especialistas não dizem mais ao software o que fazer, mas supervisionam suas ações – perspectiva que exige uma nova abordagem para o gerenciamento e controle de sistemas automatizados.

“A capacidade da IA de raciocinar, entender o contexto e se adaptar às mudanças elimina a necessidade de programação complexa. É possível passar de 20% para 70% ou até 80% de automação dos fluxos de trabalho que são altamente previsíveis em toda a empresa”, entrega a gestora. 

Nessa mesma esteira, Clara Shih, VP of Business AI na Meta, usa o exemplo da big tech, com 200 milhões de negócios de todos os portes no FacebookInstagram e WhatsApp.

“Falamos de empresas que se conectam com mais de 3 bilhões de consumidores que usam os aplicativos da Meta todos os dias. Essa vasta rede oferece uma oportunidade única para os agentes de IA facilitarem a comunicação e as vendas”, afirma.

Mas a executiva escancara uma realidade preocupante ao mencionar o trabalho de uma joalheira talentosa com atelier instalado no coração do Brooklyn.

“A artista cria peças únicas que encantam clientes em todo o mundo em seu Instagram, mas a avalanche de mensagens de clientes em potencial se transformou em uma barreira – em meio à criação de suas obras de arte, ela luta para acompanhar o ritmo das perguntas, perdendo oportunidades preciosas de venda a cada notificação não respondida”, explica.

Nesse cenário, a executiva prevê um futuro onde cada pequeno negócio terá seu próprio agente de IA – um assistente virtual incansável, capaz de responder perguntas, fornecer informações e até mesmo fechar vendas. Mas, para além da solução, reconhece que a tecnologia ainda é complexa demais para o pequeno empreendedor e aponta um desafio latente: a democratização e simplificação da tecnologia.

“Termos como ‘ajuste de modelo’ e ‘Blackwell’ (chip da Nvidia que permitirá às empresas evoluir da Inteligência Artificial generativa para uma IA mais avançada baseada em raciocínio) soam como grego para quem está focado em gerenciar o dia a dia do negócio. Por isso o grande desafio, é traduzir a sofisticação dos agentes de IA em uma ferramenta simples e acessível, algo que funcione como uma ‘chave na mão’. Se a Meta conseguir desmistificar a IA e colocá-la ao alcance de todos, os pequenos negócios poderão finalmente aproveitar todo o potencial da era digital”.

Mas para automatizar 80% de todos os fluxos de trabalho previsíveis, como mencionado por Dorit, todos os participantes da mesa concordaram com Rajendra Prasad, quando o Chief Information and Asset Engineering Officer da Accenture disse, pragmático: “é preciso, antes de tudo, coragem para reinventar processos do zero”.

Reinvenção de processos “do zero”?

Rajendra Prasad, Chief Information and Asset Engineering Officer da Accenture

Na mesa acalorada com a presença de apaixonados (para não dizer obcecados!) por tecnologia, Rajendra fez um apelo e pediu: “confiem em mim!”.

Tudo isso porque o executivo avalia que a mera aplicação de IA generativa em processos de negócios já em andamento é uma estratégia que raramente traz ganhos significativos de eficiência ou produtividade

“A IA, por sua natureza disruptiva, exige uma abordagem mais radical. A verdadeira chave para o sucesso está na reinvenção total dos processos, utilizando a IA como uma ferramenta de inovação para redesenhar fundamentalmente a forma como os negócios operam. Em vez de simplesmente automatizar tarefas existentes, as empresas devem abraçar uma mentalidade de ‘tábula rasa’, questionando premissas antigas para explorar novas possibilidades impulsionadas pela IA”, disse.

Para defender seu argumento, Prasad destacou que a identificação de casos de uso com Inteligência Artificial é a parte fácil e que o verdadeiro desafio é superar a resistência à mudança, rompendo com a mentalidade de que os processos atuais são otimizados e eficientes com o uso da tecnologia.

O especialista ainda adverte que as lideranças de processos de negócios são, na maioria das vezes, as mais resistentes. Cenário em que dá uma dica:

“A pessoa responsável por redesenhar um processo não pode ser a mesma que o executa atualmente. Isso nunca vai funcionar. Troque de pessoa! É preciso desafiar o status quo para realmente desbloquear o potencial transformador da IA, para que empresas possam alcançar novos níveis de otimização, eficiência e inovação em diversos setores, como saúde, farmacêutico, varejo, viagens, transporte e bancário”, assinalou.

Agentes “superinteligentes”

As lideranças do painel trouxeram exemplos que ilustram o potencial transformador dessa combinação. Caso da Meta, que prevê um futuro que elimine as inúmeras etapas que separam o consumidor do produto desejado até hoje.

Clara Shih descreveu um cenário em que a compra se resume a uma conversa natural em que o agente de IA guia os usuários “end to end” – apresenta opções, tira dúvidas, faz recomendações e finaliza a transação de forma integrada. Caminho que, segundo a especialista, eliminará o atrito de tantos cliques e, consequentemente, aumentará as taxas de conversão.

“Muitos de vocês já clicaram em um anúncio do Instagram ou Facebook, mas, e se pudessem, ali mesmo, sem mudar de contexto, conversar com o anúncio? Você poderia estar cozinhando ou estar multitarefa, como muitos de nós ficamos ao telefone e, de repente, poderia só conversar com o anúncio, algo como – ‘Me mostre isso. Você tem esse produto para meu banheiro em roxo?’. Ou, ‘minhas medidas são essas. Qual o número ideal desse vestido para mim?’. ‘Ok. Faça a compra e me envie na noite de terça-feira’”.

Já Rajendra preferiu ilustrar a reinvenção de processos e o uso dos agentes de IA de forma “revolucionária” nos processos de recrutamento de RHs.

“Tradicionalmente, um recrutador, diante de 50 currículos para uma vaga específica, todos repletos de palavras-chave relevantes como ‘GenAI’ e ‘LLM’, se vê em uma encruzilhada: como identificar o talento genuíno em meio a tantas promessas no papel? A solução comum é usar um software para filtrar os currículos, mas embora útil, não altera a essência do processo, que continua centrado na análise de documentos estáticos”, explica.

Nesse cenário, a Accenture, rompeu com paradigmas. Em vez de pedir currículos, a empresa exige que todos os candidatos conversem com um agente de IA por 15 minutos.

“Essa conversa inicial serve como uma triagem inteligente, onde o agente avalia não apenas o conhecimento técnico, mas também a capacidade de comunicação, o raciocínio lógico e a adequação cultural do candidato. Os aprovados avançam para etapas subsequentes, que incluem avaliações técnicas e comportamentais, também conduzidas por agentes de IA especializados”, complementa.

Ao final do processo, a decisão de envolver um recrutador humano se baseia em uma pontuação gerada pela IA que “otimiza o tempo dos profissionais de RH e garante uma seleção mais justa e eficiente”.

Com a abordagem, a Accenture “se livra dos currículos e transforma o recrutamento em uma conversa inteligente”, onde o talento se revela por meio da interação e da capacidade de solucionar problemas.

“Eu tenho muitos exemplos, mas compartilhei esse porque é simples, fácil de entender. Se você conversar com seus parceiros de RH, eles dirão que isso não vai funcionar, mas vai funcionar se você mudar o processo. E é aí que o envolvimento humano e o aspecto de gestão da mudança entram em vigor. Confiem em mim”, brinca.

Por: Nayara de Deus