As tecnologias emergentes estão dando controle às pessoas? Talvez. Por outro lado, as marcas parecem estar gostando cada dia mais da possibilidade de “controlar” nossa vida enquanto fazemos uso de uma plataforma digital.
Tudo porque não há dúvidas que os dados digitais e a Inteligência Artificial (IA) permitem que mais e mais as empresas conheçam sobre nosso comportamento online (e offline!). A Web 3.0, nomenclatura que define e abarca todas as inovações deste novo mundo conectado, oferece não só a chance de ajudar a moldar marcas, mas, a capacitá-las a construírem um conhecimento maior sobre os consumidores – e até mesmo um controle sobre seus dados digitais.
Porém, num futuro muito próximo, os líderes empresariais deverão se perguntar: quanto de si mesmos os clientes estão dispostos a dar às marcas? Como as marcas criarão confiança e alavancarão novas tecnologias para esse crescimento?
Estes e outros questionamentos nortearam a construção do “Accenture Trends Life 2023”, um relatório global da Acentture que avalia tendências sobre vida e uso da tecnologia.
O relatório deste ano está enraizado na “centralização da vida” e examina as maneiras pelas quais as pessoas estão adaptando suas vidas e fazendo uso da tecnologia emergente para atender às suas necessidades em constante mudança – e claro, como isso tudo impactará líderes e empresas do futuro.
Aqui, separamos cinco tendências emergentes que, segundo a Accenture, alterarão a dinâmica de poder entre marcas e clientes nos próximos 12 meses e além.
Tendência 1: O mundo está em uma “crise permanente”,
mas vamos nos adaptar
O mundo está oscilando de uma catástrofe global para a próxima. Mas, como há milênios, as pessoas estão se adaptando à instabilidade alternando entre quatro respostas: luta, fuga, foco e congelamento.
Luta: as pessoas levantarão cada vez mais suas vozes contra as injustiças.
Fuga: as pessoas vão procurar opções alternativas.
Foco: as pessoas vão lidar concentrando-se no que podem controlar.
Congelamento: as pessoas vão desligar completamente.
Nessa tendência, o relatório entende que, considerada a pressão atual sobre as finanças das pessoas, as famílias que estão buscando sobreviver estão cortando gastos em serviços não essenciais (como mídia e assinaturas, por exemplo), resultando em um fenômeno apelidado de “Grande Cancelamento“.
As pessoas estão cancelando assinaturas de academias, contribuições para pensões e abandonando contas com saúde, por exemplo. Segundo o relatório, a “crise do custo de vida” também pode exacerbar a solidão, já que uma das primeiras despesas que as pessoas perdem são suas atividades sociais.
Ou seja, à medida que as pessoas internalizam a instabilidade como norma e como se adaptam, isso afetará aquilo que consomem e como elas veem as marcas (e seus empregadores) e as empresas precisam estar prontas para isso.
Tendência 2: Eu sou um crente!
Construir uma comunidade será essencial para o crescimento de uma base de clientes. Em um mundo instável, as pessoas procuram lugares onde se sentirão pertencidas. Como resultado, as marcas da próxima geração serão construídas como comunidades em primeiro lugar, remodelando a lealdade e a participação da marca.
A Accenture percebe que nesse movimento, uma maioria significativa de pessoas já experimentou novos hobbies ou se juntou a novas comunidades nos últimos seis a nove meses.
Três aspectos estão convergindo para habilitar essa tendência.
– Comunidades de pertencimento: em plataformas como Reddit, Discord e Twitch
– Token-gating: acesso exclusivo reservado para “somente detentores de token”
– Colecionáveis: artes digitais, autógrafos, cartões comerciais e muito mais
Por exemplo, a comunidade de esportes/cripto WAGMI United comprou o Crawley Town FC, um clube de futebol da segunda divisão da liga inglesa, com a missão de avançá-lo para a Premier League. Eles lançaram um condomínio fechado em NFT para o clube e os proprietários dos NFTs ganharam direitos a voto, além de seu ativo.
Veja, crucialmente, a tecnologia não é a coisa mais interessante sobre o modelo para os clientes: as empresas devem se concentrar nos benefícios proporcionados pelo uso e impacto dela.
Foi pensando assim que a Starbucks criou seu programa de fidelidade tokenizado, o Odyssey. Ele está na Web 3.0 para um cliente de massa, concentrando-se na comunicação de recompensas e engajamento da marca (não na tecnologia). O CMO da Starbucks, Brady Brewer, comentou para o relatório da Accenture. Ele diz: “O cliente pode nem saber ao interagir com a tecnologia blockchain. Ela é apenas o facilitador”.
Tendência 3: Trabalho
Segundo o relatório, o retorno ao posto de trabalho não foi para todos. Por outro lado, alguns sentiram a perda de benefícios intangíveis do escritório, como encontros casuais e orientação próxima para talentos júniores.
Para muitos, sem engajamento presencial, as empresas podem perder: Orientação, Inovação, Cultura e Inclusão. No entanto, o relatório aponta que, os líderes devem se reinventar. As empresas devem reimaginar completamente o trabalho, abordando novas intenções tanto para os aspectos tangíveis quanto para os intangíveis dessa relação.
Por isso vale destacar que há uma tensão se formando entre aqueles que desfrutam da autonomia do trabalho remoto e aqueles que anseiam pelas recompensas de estar juntos. Os líderes precisarão voltar à prancheta de desenho e criar planos lógicos e “benéficos mutantes” para todos.
Tendência 4: Criatividade
A IA está se tornando o copiloto das pessoas para a criatividade. Enquanto a Inteligência Artificial tem sido amplamente usada por empresas e marcas como um serviço para as pessoas, ou sobre as pessoas, as redes neurais foram amplamente disponibilizadas para criar linguagem, imagens e música, colocando a IA diretamente nas mãos das pessoas como uma ferramenta para a criatividade. E tudo o que está sendo desenvolvido deverá chegar ao mercado numa velocidade espantosa.
Já para a linguagem, o relatório aferiu que as redes neurais estão sendo usadas para gerar estruturas de sentenças em texto com base em um modelo de linguagem com 175 bilhões de parâmetros. É sofisticado o suficiente para gerar blogs, e-mails e artigos (embora, ainda uma cópia que possa exigir alguma edição humana).
As empresas precisam então pensar em como se destacarão no mar de conteúdos gerado por IA. Como você pode usar a IA para melhorar a velocidade e a originalidade da sua inovação em conteúdo? Por exemplo, as imagens utilizadas neste relatório da Accenture são uma colaboração entre designers de IA e Accenture.
Tendência 5: Identidade digital
As carteiras digitais podem acabar com a crise da identidade digital. O uso (e uso indevido) de dados pessoais ainda está muito atrasado para haver uma transformação, aponta o relatório, com isso, a transparência e a confiança nas experiências de marca online estão diminuindo rapidamente em conjunto. Veja, 86 % das pessoas sentem preocupações crescentes sobre a privacidade de seus dados, segundo a empresa G2, um marketplace de software.
Mas o controle poderá muito em breve mudar de mãos. As carteiras digitais que contêm tokens, por exemplo, (representando métodos de pagamento, ID, cartões de fidelidade e muito mais) permitirão que as pessoas decidam a quantidade de dados que desejam compartilhar e até vendê-los para as organizações. Essa é uma ótima notícia para as marcas: os dados que as pessoas entregarão serão ainda mais valiosos do que as informações de terceiros.
Enfim, construir a confiança do cliente nas carteiras digitais pode ser um desafio, porém, embora seja cedo para afirmar isso, o relatório aponta que as empresas podem acelerar a adoção com algumas ações:
– Mostrando às pessoas que o controle de dados vale o investimento de tempo;
– Tornando os tokens fáceis de obter e usar nas transações do dia a dia;
– Ajudando as pessoas a entender a função de uma carteira digital além dos pagamentos;
– Entendendo os níveis de permissão que as pessoas podem conceder às empresas.
Certamente toda essa nova dinâmica e suas implicações apontadas no relatório Accenture Life Trends 2023 apresentam grandes desafios e grandes oportunidades para pessoas e empresas. São caminhos que levarão a um desenvolvimento do relacionamento entre clientes e marcas nunca imaginado. Talvez, a reflexão aqui é entendermos que a lealdade e a colaboração estão em um ponto de inflexão em CX – já a criatividade flerta com possibilidades infinitas.
Por Marcelo Brandão