A ideia de democratizar a leitura é ainda mais recente. Como ele diz:
A linguagem escrita, associada à ascensão dos estados e à expansão do comércio, era vantajosa para os negócios, útil para a administração do governo e parte integrante de algumas práticas religiosas. A escrita era um meio para legislar, manter registros e criar escrituras, e a leitura era domínio dos religiosos e burocratas. Eles realizavam ritos, recitavam poemas e faziam circular informações dentro de uma esfera restrita e privilegiada.
Em termos históricos, a leitura era sinal de elite durante a maior parte desses seis mil anos. Mas tudo mudou em 1455, com Gutenberg, quando os livros se tornaram mercadorias e os leitores, consumidores.
Podemos notar que a contabilidade sempre esteve associada à escrita. Mas muito mais à escrita derivada de Gutenberg. Se as partidas dobradas surgiram antes da invenção da produção em massa de obras escritas – por volta de 1300 em alguma cidade italiana – a efetiva divulgação das partidas dobradas ocorreu através de um livro. Isso é tão relevante para a contabilidade que em muitos países o Dia da Contabilidade está associado à publicação do primeiro livro impresso que ensinava as partidas dobradas. E parece que teremos sempre a companhia de Lucca Pacioli, este segundo escritor, que publicou o primeiro livro impresso. (Lembro aqui que o primeiro autor de um livro de contabilidade, Benedetto Cotrugli, não publicou sua obra antes do Frei Pacioli e, por isso, não é mencionado em muitas resenhas históricas).
O livro de Pacioli possibilitou que muitas pessoas aprendessem a tecnologia contábil mais moderna da época e sua didática foi imitada e, muitas vezes, copiada em outras obras. Foi neste livro que muitas pessoas aprenderam contabilidade. Quando Benjamin Franklin decidiu divulgar as partidas dobradas entre as pessoas que usavam os correios dos Estados Unidos, ele escreveu uma cartilha para ensinar essas pessoas. Se durante muitos anos os brasileiros não tiveram acesso às partidas dobradas, isso é resultado da decisão de Portugal de proibir a imprensa no Brasil, decisão que será revogada somente quando D. João VI foge das tropas de Napoleão.
Somente trinta anos depois da chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro teremos a primeira obra de contabilidade feita por um brasileiro. Mais algumas décadas e teremos registradas algumas das discussões que os guarda-livros do reinado de Pedro II tinham no final do trabalho.
A leitura de obras estrangeiras em algumas bibliotecas iluminou a mente de alguns dos nossos mestres. Alguns deles aprenderam de maneira tortuosa alguns dos segredos contábeis através da popularização das obras, não apenas de livros, mas também de relatórios técnicos e artigos em periódicos. Nos dias atuais, nossa leitura talvez seja predominante em arquivos digitais, que acessamos de qualquer lugar do mundo. Mas isso certamente não tira a magia da leitura.
Fonte: CÉSAR TIBÚRCIO