Inovar nunca foi fácil, mas hoje parece ainda mais complicado
Em meio a um cenário de pressão por resultados, cortes de orçamento e urgência operacional, muitas empresas têm se voltado para a eficiência como prioridade. Não por acaso, práticas de inovação como “labs”, “squads”, provas de conceito e mapeamento de tendências ganham protagonismo nas agendas corporativas.
O esforço é legítimo. No entanto, diante de tantas iniciativas, uma pergunta começa a se impor: será que estamos focando nas ferramentas certas? Ou apenas multiplicando práticas sem resolver os obstáculos estruturais?
De um lado, há avanços no repertório: mais práticas adotadas, maior familiaridade com modelos de colaboração e presença crescente de estratégias dedicadas à inovação. De outro, os principais desafios se mantêm praticamente inalterados: como a falta de tempo, a pressão por retorno imediato, a dificuldade de engajar pessoas e o baixo apetite ao risco.
O que isso nos diz? Que o problema pode não estar na ausência de práticas, mas na forma como as organizações estão estruturadas para lidar com elas. É nesse ponto que vale ampliar a lente.
Organizações que inovam de maneira consistente geralmente compartilham algo menos visível do que suas estruturas: uma forma distinta de pensar o trabalho. Elas não tratam a inovação como algo separado do dia a dia, mas como uma consequência natural de sua capacidade de aprender continuamente, resolver problemas reais e alinhar esforços em torno de desafios estratégicos. E isso não se conquista com soluções prontas, mas com intenção, método e disciplina.
Nesse contexto, abordagens como a gestão lean voltam ao centro da conversa, não como um conjunto de ferramentas, mas como uma filosofia prática de gestão. Ao priorizar a eliminação de desperdícios, o foco no cliente e a experimentação disciplinada, fazer lean ajuda as organizações a recuperar o recurso mais escasso de todos: o tempo. E em vez de apostar em grandes saltos de inovação, favorece o aprendizado contínuo e o avanço progressivo, conectando a operação à estratégia sem criar muros entre elas.
Mas o valor dessas abordagens não está em seus rótulos. Está no uso que se faz delas. Ter um “lab de inovação” ou um programa de ideias não significa necessariamente inovar. O que faz diferença é a clareza sobre o problema que se quer resolver, a forma como as decisões são tomadas e a qualidade do aprendizado gerado. Ferramentas são importantes, mas sem um pensamento crítico e sistêmico por trás, elas correm o risco de se tornar mais uma camada de complexidade.
Outro fator decisivo é a maneira como as lideranças se posicionam. Inovar sob pressão exige líderes que saibam criar espaço para a experimentação sem renunciar à responsabilidade. Que entendam como ouvir e incluir, mas também decidir com base em critérios claros. Que sustentem a inovação não como uma bandeira, mas como um modo de pensar e agir, mesmo diante das incertezas. O engajamento real das pessoas nasce dessa coerência — não de campanhas ou discursos prontos.
Por fim, é preciso lembrar que a inovação de maior impacto costuma nascer das perguntas certas — não das respostas rápidas. Em vez de buscar a “melhor prática”, talvez seja mais produtivo entender o que impede a organização de avançar. O que não está sendo visto? O que precisa ser desaprendido? Quais rotinas devem ser redesenhadas? Inovar, nesse sentido, é menos sobre adotar o novo e mais sobre revisar, com coragem, o que já se faz — e porque se faz.
A boa notícia é que isso está ao alcance de qualquer empresa disposta a refletir com seriedade sobre seu sistema de gestão. Não basta praticar inovação. É preciso gerenciar de forma que ela se torne possível. Em tempos de alta pressão, essa talvez seja a transformação mais estratégica que uma organização pode empreender.
Por: Flávio Battaglia