Proposta ficou meses travada por causa de impasses e será agora analisada pelo plenário; texto regulamenta uso e desenvolvimento da tecnologia no país
A comissão interna do Senado sobre a regulamentação da inteligência artificial (IA) aprovou nesta quinta-feira (5), de forma simbólica, a proposta de marco regulatório da tecnologia no país. O texto ainda será analisado pelo plenário.
Nesta tarde, os senadores aprovaram, no plenário, o regime de urgência do projeto e marcaram a votação para terça-feira (10). Na comissão, depois de adiada diversas vezes ao longo do ano, a votação foi realizada após o relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), negociar ajustes no parecer com o governo e a oposição.
Na semana passada, o relator já havia apresentado uma nova versão do texto. Na terça-feira (3), o senador deu 48 horas para que novas sugestões fossem feitas.
A proposta estabelece os riscos e direitos relacionados ao uso e desenvolvimentos de IAs no Brasil. O texto, no entanto, enfrentava resistência da oposição que argumentava que a proposta restringia o desenvolvimento tecnológico e limitava a liberdade de expressão.
Segundo o relator, o governo também fez pedidos distintos e até conflitantes, conforme as solicitações de cada ministério interessado. Esses dois entraves atrasaram a análise da proposta, que também é alvo de interesse e pressão de plataformas digitais, as chamadas big techs.
Em seu parecer, alterado ao menos cinco vezes, o relator afirma ter buscado equilibrar a garantia da preservação de direitos fundamentais e das condições para o desenvolvimento tecnológico.
A matéria tramita desde o ano passado e é considerada prioritária pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que é o autor do projeto principal analisado na comissão.
O texto teve como base um anteprojeto elaborado por uma comissão de juristas.
Divergências
Integrante da oposição, o senador Marcos Rogério (PL-RO) elogiou o “ambiente de convergência” criado pelo relator, mas afirmou que o “debate não se esgota” na comissão, já que ainda será analisado no plenário. “Regular é necessário, mas sem criar mecanismos que impeçam o avanço. O Brasil está atrasado neste tema”, disse.
O senador destacou, porém, ter sido contrário à inclusão dos direitos autorais prevista na proposta. Para ele, o tema deveria ser tratado em outro projeto. “Não tenho divergência do ponto de vista de mérito dessa questão, tenho do ponto de vista de forma”, afirmou.
O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), fez elogios ao relatório e ao consenso criado. Segundo ele, o texto pode se tornar uma “referência para o mundo”. Randolfe adiantou, no entanto, que a bancada governista deve apresentar destaques (sugestões de mudanças) na análise no plenário.
O diz a proposta
O projeto estabelece as definições de sistemas de inteligência artificial, de agentes de IA (desenvolvedores, distribuidores e aplicadores da tecnologia) e de “conteúdos sintéticos” —imagens, vídeos, áudio e texto, que foram significativamente modificadas ou geradas por IA.
Também é definido que o sistema de IA de “alto risco” é aquele com potencial para impactar de forma adversa pessoas ou grupos. É o caso de dispositivos usados no funcionamento de infraestruturas críticas; em processos de seleção e avaliação; na administração da justiça; em veículos autônomos em espaços públicos; na área da saúde e entre outros.
A proposta cria o Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA) e determina que ele será coordenado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
Um dos principais pontos do texto é a previsão de remuneração pelo uso de seus conteúdos protegidos por direitos autorais e direitos conexos. Essa remuneração deverá ser paga pelo “agente de IA” que fizer uso dos conteúdos para treinamento ou desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial.
Além disso, o uso de conteúdos de imagem, áudio, voz ou vídeo que retratem ou identifiquem pessoas naturais pelos sistemas de IA deverá respeitar os direitos da personalidade.
Mudanças no texto
Entre as mudanças recentes no texto, o relator incluiu ampliação das “hipóteses de exceção” à lei, para não incidir sobre qualquer tipo de uso por pessoas sem fins econômicos e atividades de testagem e desenvolvimento. De acordo com o parecer, o objeto “primariamente regulado é o uso e aplicação dos sistemas”.
Também foi incluída a garantia de proteção dos direitos autorais como um dos fundamentos da lei, ao lado de propriedade intelectual e “segredo comercial e industrial”.
Além disso, Eduardo Gomes manteve no relatório o “risco à integridade da informação, liberdade de expressão, processo democrático e pluralismo político como critério para regulamentação e identificação de novas hipóteses de IA de alto risco”.