sexta-feira,22 novembro, 2024

Concessões e PPPs: desvendando os riscos fiscais

As concessões e parcerias público-privadas (PPPs) são alternativas para financiar e modernizar a infraestrutura e os serviços públicos, pois conseguem atrair para os projetos capitais privados e inovações técnicas que aumentam os resultados. No entanto, elas também podem apresentar riscos fiscais aos entes públicos e, muitas vezes, difícil identificação. É preciso, então, cautela e planejamento rigoroso por parte do Estado.

Esse risco pode se apresentar de diversas formas, como os decorrentes da incapacidade do parceiro privado em cumprir suas obrigações contratuais. O que pode levar à rescisão do contrato, gerando custos adicionais para o governo, como a necessidade de realizar novas licitações ou assumir diretamente a operação do serviço.

Mudanças inesperadas no cenário econômico, como crises ou alterações na legislação, podem elevar os custos do projeto, impactando o orçamento público. Principalmente com contratos mal estruturados onde o risco é parcialmente ou totalmente suportado pelo ente público. Tal situação pode gerar passivos contingentes para o poder concedente, com a necessidade de realizar pagamentos adicionais ao parceiro privado em caso de eventos específicos.

A transferência excessiva de riscos para o setor privado pode levar à ineficiência na prestação do serviço e à necessidade de intervenção estatal, o que gera custos não previstos. Da mesma maneira ocorre quando da transferência excessiva de obrigações e riscos ao governo. Instrumento que vem sendo usado por alguns estruturadores de projetos de concessão para viabilizar projetos que apresentam resultados negativos sem que seja feito uma análise de impacto fiscal.

A análise de experiências internacionais é fundamental para que os governos aprendam com os erros do passado e evitem os mesmos problemas no futuro. Neste sentido é salutar a evidenciação destes riscos fiscais nos demonstrativos contábeis e fiscais dos entes públicos. Esse é o primeiro passo – transparência e evidenciação.

No Brasil, infelizmente, há diversos entes subnacionais que estão evidentemente alavancados em riscos e assunção de obrigações que hoje não são evidenciados. O que leva investidores a tomarem decisões que não tomariam se os dados estivessem devidamente registrados. Deveriam deixar apontados no Anexo de Riscos Fiscais das suas Leis de Diretrizes Orçamentárias.

Na Argentina, a privatização de rodovias mal modeladas, na década de 1990, resultou em tarifas elevadas e inadimplência contratual das empresas concessionárias, gerando um alto custo para o governo. Já em Porto Rico, a crise fiscal do país foi agravada por contratos de PPPs mal estruturados, que transferiram obrigações ao país e geraram um endividamento excessivo para cobrir essas despesas. Dessa forma, foi necessário reestruturar a dívida pública. Já na Grécia, a privatização de diversos setores estratégicos da economia durante a crise de 2008 não gerou os retornos ambiciosos esperados e contribuiu para o aumento da dívida pública.

A construção de aeroportos na Espanha, durante o boom econômico da década de 2000, resultou em um excesso de capacidade. Com a crise de 2008, muitos aeroportos ficaram ociosos, gerando custos fiscais para o governo espanhol conforme previsão contratual. Nos Estados Unidos é emblemático O caso da ponte Golden Gate é um exemplo de custos fiscais subestimados. O projeto inicial foi subestimado em mais de 50%, o que gerou custos adicionais para o governo americano.

Nas Filipinas, a privatização da companhia aérea nacional resultou em inadimplência da empresa concessionário. O governo filipino teve que assumir o controle da companhia aérea e arcar com os custos de reestruturação. No Reino Unido, a privatização das ferrovias na década de 1990 resultou em tarifas elevadas e ineficiência no serviço. O governo britânico teve que intervir no setor ferroviário e arcar com os custos de reestruturação.

Para mitigar os riscos fiscais os contratos devem ser claros e objetivos definindo com precisão os direitos e obrigações de cada parte, incluindo mecanismos de mitigação de riscos. O monitoramento e avaliação dos resultados são fundamentais para o desempenho dos projetos e avaliar os resultados periodicamente para identificar e corrigir problemas.

Os projetos em parceria com o setor privado podem ser ferramentas valiosas para o desenvolvimento do país, mas exigem cautela e planejamento rigoroso para evitar os riscos fiscais. A análise de experiências internacionais e a implementação de medidas de mitigação de riscos são essenciais para garantir o sucesso e a sustentabilidade dos projetos.

As PPPs não são uma solução mágica para os problemas do Estado. É fundamental que o governo tenha capacidade de gestão e expertise para estruturar, acompanhar e avaliar os projetos de forma eficaz. É importante ressaltar que os custos fiscais das concessões podem ser minimizados com um planejamento adequado e uma estruturação cuidadosa dos contratos e das modelagens econômico-financeiras.

Entretanto, é necessário aprimorar o marco legal brasileiro para se exigir os registros de todos os tipos de obrigações e riscos assumidos pelos governos. Neste sentido, alguns países já avançaram como o Chile e Portugal que incluíram em seus marcos legais para as concessões, algumas regras fiscais que limitam o endividamento do Estado e garantem a sustentabilidade fiscal dos projetos. Também criaram um Conselho de Concessões que é responsável por avaliar os projetos e garantir que eles sejam compatíveis com a política fiscal do governo.

Já os Estados Unidos e o Reino Unido criaram um organismo independente que é responsável por auditar as contas das concessões. O Brasil precisa avançar na transparência através do controle contábil do compartilhamento de riscos e das compensações por desequilíbrios tarifários ou outros. Também para registro das contraprestações como uma espécie de endividamento, sendo. neste ponto bastante discordante o atual modelo brasileiro da maioria dos países.

A implementação de regras fiscais para concessões pode ajudar a garantir a sustentabilidade fiscal dos projetos no longo prazo, reduzir os riscos para o Estado e aumentar a confiança dos investidores.

George Santoro

Redação
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