Produção de energia e extração de petróleo e gás são os grandes vilões da mudança climática, segundo levantamento que compilou mais de 350 milhões de fontes de dados usando inteligência artificial
Desde 2015, os maiores aumentos nas emissões globais de gases estufa vieram da produção de eletricidade na China e na Índia, e da produção de petróleo e gás nos Estados Unidos (EUA). É o que aponta um estudo publicado neste domingo (3) pela organização Climate Trace, fundada pelo ex-vice-presidente dos EUA Al Gore.
O aumento das emissões destes setores apenas nos três países citados foi responsável por quase metade do aumento das emissões globais desde 2015, afirma o levantamento. Com apoio de inteligência artificial, os dados analisados pela Climate Trace consideram 352 milhões de fontes emissoras de gases que servem de combustível para a mudança climática e os eventos extremos do clima, como altas temperaturas, chuvas e secas prolongadas.
O colossal raio-X das emissões mundiais considera dados de empresas, setores industriais, cidades e países. “Compilando dados de satélites, outras formas de sensores remotos, dados públicos e comerciais, a Climate Trace fornece dados de emissões que não são relatados em inventários tradicionais”, afirma a organização em nota.
“Os líderes dos setores público e privado podem agora fazer o que nunca foi possível antes. Podem analisar claramente as causas da crise climática até à fonte individual. Eles podem identificar onde agir quase imediatamente”, afirmou Al Gore na divulgação da pesquisa. “Com este inventário ao nosso alcance, não há mais uma desculpa válida para ninguém – empresas, governos ou outros – fechar os olhos ao trabalho que deve ser feito para reduzir as emissões de forma significativa e rápida.”
De acordo com a ONU, o mundo deve reduzir as emissões de gases estufa em pelo menos 42% até 2030 para permanecer na trajetória dos 1,5°C de elevação na temperatura mundial até 2050.
Além de apontar poluidores, o nível de detalhamento do estudo permite que indústrias possam rever suas cadeias de produção para investir na descarbonização, segundo a organização, considerando fatores como matéria-prima, transporte de materiais, origem da produção de energia e outros dados considerados no relatório.
“O aço produzido pela fábrica Dofasco, da ArcelorMittal, no Canadá, tem uma intensidade de emissões de 1,5 toneladas de CO2 por tonelada de aço, enquanto o aço produzido pela mesma empresa na Polônia tem uma intensidade de emissões de 2,2 toneladas de CO2 por tonelada de aço”, exemplifica o estudo. Veja a seguir outros destaques do levantamento:
Emissões aumentaram em 2022: As emissões globais aumentaram 1,5% de 2021 a 2022 e aumentaram 8,6% de 2015 — o ano do Acordo de Paris — a 2022.
Metano em ascensão: No ano seguinte ao anúncio do Compromisso Global de Metano, as emissões do gás aumentaram 1,8%. As crescentes emissões de metano da China foram responsáveis por 39% desse aumento em 2022 – com o setor mineiro de carvão chinês responsável pela maior parte desse incremento.
Desmatamento cai em regiões-chave: Embora as emissões globais provenientes do desmatamento permaneçam elevadas (4,5 mil milhões de toneladas de CO2e) e tenham aumentado ligeiramente em 2022 (+5%), houve reduções significativas em regiões-chave. Na Indonésia, as emissões deste tipo diminuíram 56% de 2015 a 2022. Na Bacia do Congo, as emissões em 2022 diminuíram em comparação com 2021. Na América Latina, as emissões não mudaram significativamente ao longo de 2022, afirma o relatório.
Países ricos impulsionam emissões do transporte rodoviário: As emissões do transporte rodoviário aumentaram 3,5% em 2022. Apesar da crescente disponibilidade de veículos elétricos, os países de rendimento alto e médio-alto foram responsáveis por 68% desse aumento total nas emissões. 49% de todas as emissões do transporte rodoviário em 2022 vieram de países de alta renda.
Emissões da aviação atingem novos patamares: Em 2022, a recuperação contínua das viagens pós-COVID fez com que as emissões da aviação aumentassem, com o total dos voos internacionais crescendo 74% entre 2021 e 2022, e as emissões dos voos domésticos com alta de 18%.
Transporte marítimo impacta o Ártico: À medida que o gelo marinho do Ártico diminui, o tráfego marítimo na área aumenta. O número de semanas em que as emissões de CO2 dos navios foram superiores a 30 mil toneladas no Ártico duplicou entre 2018 e 2022.
Texto: Marco Britto, para Um Só Planeta