terça-feira,01 outubro, 2024

“As cidades devem ser olhadas pelos seus potenciais e não pelos problemas”, diz Bill Reed, arquiteto referência mundial em design regenerativo

Membro fundador do Conselho de Construção Sustentável dos Estados Unidos, Reed defende o potencial das construções verdes por uma abordagem regenerativa e não apenas de zero impacto

Já imaginou se a construção de prédios, casas e hotéis levasse em consideração não apenas a sustentabilidade dessas obras, mas o potencial de regeneração do entorno? É nesta realidade que o arquiteto Bill Reed trabalha há mais de 40 anos. Autor, palestrante e consultor de projetos de design sustentável, incluindo edifícios e planos diretores de cidades, e reconhecido internacionalmente no campo do design regenerativo e da arquitetura sustentável, Reed concentra seu trabalho no desenvolvimento regenerativo, que visa não apenas zerar o impacto negativo, mas regenerar os ecossistemas.

“O conceito de desenvolvimento e de design regenerativos honra os processos evolutivos da vida. Queremos ir além da sustentabilidade – o que queremos realmente sustentar? Não podemos apenas limitar o estrago, precisamos ir além: focar no processo contínuo de evolução, de adaptação e de mudanças das formas de vida”, afirma o membro fundador do Conselho de Construção Sustentável dos Estados Unidos (USGBC).

Segundo o arquiteto, que também é um dos cofundadores do sistema de classificação de construção sustentável LEED, que certifica edificações em mais 160 países a partir de critérios como economia, eficiência e impacto, a regeneração dentro da construção civil busca engajar as comunidades ao redor do empreendimento e garantir a preservação e multiplicação das espécies. “Precisamos pensar em projetos que construam uma dinâmica estável para que a vida na Terra persista. Sabemos que existe uma forma saudável do ser humano habitar a Terra; sabemos de povos que realizavam queimadas que eram positivas para o solo. O ser humano tem um papel importante a ser desempenhado no planeta, mas se esqueceu de como fazê-lo”, afirma Reed.

Na obra “Design para culturas regenerativas”, que sintetizam os pensamentos de Bill Reed, o pensador e ativista alemão Daniel Wahl explica que a noção de desenvolvimento regenerativo compreende não apenas os seres humanos, mas as estruturas sociais e culturais, sendo uma visão sistêmica que contribui para a manutenção da diversidade e para o fortalecimento da conexão entre as pessoas e os lugares, garantindo a integridade da natureza e o bem-estar social.

Um caso que exemplifica o design regenerativo foi criado pela organização Regenesis Group, liderada por Reed, que busca integrar sistemas vivos e realizar o desenvolvimento comunitário em todo o mundo. “O caso da Playa Viva, no México, foi um sucesso porque pudemos ler o contexto local e trazer inúmeros benefícios para o ambiente e para as pessoas da região. Em vez de construir um resort que ‘extraísse’ os recursos do vilarejo, fizemos o contrário”, explica o arquiteto.

Um caso que exemplifica o design regenerativo foi criado pela organização Regenesis Group, o La Playa Viva. — Foto: LR Architecture Photography
Um caso que exemplifica o design regenerativo foi criado pela organização Regenesis Group, o La Playa Viva. — Foto: LR Architecture Photography

Reed analisa que, em 2006, o resort ecológico Playa Viva, localizado em um vilarejo de 500 pessoas em Juluchuca, Guerrero, no México, foi palco de um processo bem sucedido de desenvolvimento comunitário e regenerativo. Construído em uma plantação abandonada de palmeiras na costa do Pacífico, as casas do ecoresort foram construídas em cima de árvores com metros de altura e as raízes serviram para dar firmeza na areia das dunas. Playa Viva ofereceu uma série de oficinas de agricultura orgânica e de redução de resíduos para a comunidade local, entre outras iniciativas estabelecidas em conjunto com a escola local.

“O projeto trouxe vida e movimento a uma área que havia sido abandonada. Através da educação pública, os membros dessa comunidade sentiram novamente o propósito de viver ali e o nosso melhor indicador foi a volta dos adolescentes e dos jovens ao vilarejo”, constata Reed. O ecoresort foi construído a partir de técnicas de menor impacto ambiental e possibilitou a criação de empregos, a resolução de problemas de saúde e de nutrição e a educação sobre novas técnicas agrícolas para solos e alimentos mais sustentáveis.

Atividades de reconexão com a natureza no Viva la Playa. — Foto: Divulgação
Atividades de reconexão com a natureza no Viva la Playa. — Foto: Divulgação

Reed também defende a importância de que mais pessoas conheçam o conceito e as práticas do design e do desenvolvimento regenerativo para ampliar a atuação deste movimento. “Além de falar sobre e praticar, precisamos de pessoas fazendo o papel educacional, que é o nosso foco hoje no Regenesis Group. Queremos compartilhar nossos conhecimentos sobre o que significa trabalhar em comunhão com a natureza e colaborar com sistemas vivos. Os melhores resultados são aqueles esperados pelas próprias comunidades, que participam ativamente de todo o processo de construção. São eles que darão o suporte necessário para que a regeneração de fato aconteça”, enfatiza o arquiteto.

A construção verde implica, portanto, no trabalho a partir de uma visão sistêmica e conjunta às necessidades apresentadas pela região e pelas pessoas que vivem nela. “Trata-se da mudança de uma visão de um mundo fragmentada para um modelo mental de sistemas abrangentes. Não tem como entender a cidade se a dividimos em partes, assim como não podemos entender as pessoas se as analisarmos pelos seus órgãos. Precisamos entendê-las pelas relações que estabelecem com o meio onde estão”, diz.

Terra Manglar — Foto: Divulgação
Terra Manglar — Foto: Divulgação

Reed é também conselheiro do Instituto SEVA, organização sem fins lucrativos dedicada ao desenvolvimento dos biohubs, modelos de ocupação que permitem que a natureza se regenere em harmonia com a presença humana. O primeiro biohub criado pela organização é o Terra Manglar, localizado em uma área de 135 hectares em Acaraú, na costa do Ceará, no Brasil. O projeto inclui métodos como arquitetura biomimética e construção bioclimática que, em conjunto com o ambiente natural, garantem que a biodiversidade local seja protegida e fortalecida à medida que o biohub é construído.

“O nome biohub é uma forma que encontramos de caracterizar os projetos regenerativos. Trata-se de como lidar com ele sem apenas extrair dele. São modelos de ocupação de territórios que usam design regenerativo, tecnologias sofisticadas e metodologias ancestrais, harmonizando ocupação humana e respeito à natureza. Já temos tecnologia suficiente, agora precisamos aproveitar as construções para buscar novas formas de trabalhar em cooperação com os ecossistemas”, conclui.

Terra Manglar — Foto: Divulgação
Terra Manglar — Foto: Divulgação

Texto: Um só Planeta

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