Saiba como a Fractual Agriculture leva capital ao campo com um modelo de parceria financeira que pode durar até 10 anos
Os agricultores não são os únicos interessados em serem donos de terras agrícolas nos Estados Unidos. Essa classe de imóveis pode ser um ativo estável e com potencial significativo de valorização para os investidores de mercado. E mais: em uma era de mudanças climáticas, o valor da terra tende a refletir, cada vez mais, a sua “resiliência climática”, construída pelo agricultor que cuida da saúde do solo.
É por isso que há no mercado financeiro investidores interessados, e eles estão propondo soluções para aumentar o valor dessas terras. Um exemplo é a startup Fractal Agriculture, que, segundo seus fundadores, reúne agricultores e investidores em um acordo ganha/ganha/ganha, sendo o meio ambiente o terceiro beneficiário.
O que a startup oferece é a possibilidade de um agricultor vender uma parte minoritária de suas terras a investidores de mercado, mas eles continuam a ter controle total sobre sua exploração agrícola. Lá na frente, qualquer aumento no valor dessa terra é repartido entre as partes. Por exemplo, um crescimento obtido através de uma agricultura mais produtiva e que venha a melhorar a saúde do solo e a resiliência climática.
Esses investidores externos detém uma participação minoritária em novas propriedades em contratos por 10 anos, que podem ser renovados, ampliando assim o potencial de melhoria da terra com menos exposição financeira para o agricultor. No final do acordo, o produtor pode comprar a posição do investidor ou refazer o investimento por mais 10 anos. A empresa é apoiada por investidores em agricultura e clima, como a Trailhead Capital, a Serra Ventures, a LLC, a Groove Capital e a Virta Ventures.
Onde a história começou
A Fractal foi fundada em junho de 2022 por Ben Gordon, que tem formação agrícola em Dakota do Norte. É um veterano militar e passou vários anos nos setores de tecnologia agrícola e de investimento. Assim, ele criou laços e proximidade com as comunidades agrícola e financeira. A startup é focada em tecnologia e usa dados públicos (por exemplo, de imagens de satélite) para analisar o histórico agrícola da terra, hectare por hectare e, assim, concluir a subscrição da compra da propriedade.
Essa perspectiva pode ser combinada com a experiência local de um agricultor/parceiro, como forma de identificar as parcelas de terras com maior potencial de criação de valor para se tornarem parcialmente propriedade e totalmente controlada por um agricultor. Segundo Gordon, o investidor não precisa ter conhecimento profundo de tecnologias do campo e nem o acordo se baseia em motivos puramente altruístas. O que de fato ocorre é que o investidor obtém um ativo financeiramente sólido e o agricultor aumenta sua base de terras controladas, mas com menos risco financeiro.
O modelo de negócios busca reduzir o custo de capital aos agricultores que implementam práticas que visem a saúde do solo ao longo do investimento. A crença por trás dessa ideia é que a construção da melhoria da fertilidade do solo e de sua estrutura física leva a rendimentos mais estáveis e resilientes, o que, por sua vez, reduz o perfil de risco para os investidores. Outra possibilidade de renda é com a comercialização de créditos de carbono. A aspiração é ser o maior investidor em terras agrícolas na América do Norte, até 2030, mantendo 1.000 agricultores produzindo em terras próprias.
Entenda como é o mercado de terras nos EUA
Nos dias atuais, não há muitos americanos que ainda praticam a agricultura que alimenta o país e tantos outros povos em todo o mundo, como era antigamente. O legado do Homestead Act (a reforma agrária feita em 1862), persiste no sentido de que muitos agricultores ainda são donos de terras daquelas concessões de 65 hectares que foram transmitidas de geração em geração. Mas o fato é que em regiões de grandes culturas agrícolas é necessário uma fazenda muito maior para que o negócio seja economicamente viável. Em pequenas áreas, falta escala de produção.
As fazendas que cresceram significativamente o fizeram por meio da compra de áreas vizinhas, cujas famílias abandonaram a produção agrícola. Mas é arriscado estender demais as hipotecas de terras em função das incertezas econômicas que acompanham o negócio que é altamente impactado pelo clima e no qual o agricultor é um tomador de preços, sem alavancagem nos mercados de commodities. A indústria aprendeu essa dura lição na crise agrícola da década de 1980.
Por conta disso, a expansão das lavouras nos EUA se deu, em grande parte, através do arrendamento de terras, que tem sido uma solução lógica para conseguir escala de produção. De acordo com o NASS (National Agricultural Statistics Service Information), do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA), cerca de 50% das terras do país estão arrendadas por preços que variam de US$ 48 (R$ 239 na cotação atual) a US$ 98 (R$ 488) por hectare/ano, principalmente no cinturão do milho.
A estimativa é que as principais culturas (soja, milho, trigo, algodão, sorgo e arroz), ocupem 100,3 milhões de hectares nesta safra. Enquanto isso, o relatório anual de valores de terras, do USDA, mostra um avanço de preços das áreas agrícolas. A média neste ano está em US$ 1,6 mil (R$ 8,2 mil) por hectare, um aumento de 7,4% em relação ao ano passado. Segundo a Federação Agrícola Americana, este é o segundo maior aumento de valor por hectare desde que o levantamento foi realizado pela primeira vez, em 1997.
Melhorias em terras arrendadas não dão bons frutos
O preço alto das terras empurra ainda mais o produtor para o uso do arrendamento. No entanto, há algumas desvantagens no modelo de arrendamento de terras para a agricultura. Os métodos agrícolas que conduzem à melhoria na saúde do solo ao longo do tempo, e que levam a um maior rendimento e estabilidade dos cultivos no campo – particularmente sob as condições climáticas causadoras de estresse que estão se tornando mais comuns, como as secas mais prolongadas, por exemplo – estão ao alcance do produtor e são desejáveis. Como o plantio direto, por exemplo, um método que cultiva o solo sem revolvê-lo.
USDA/Divulgação
Plantio direto é uma das práticas agrícolas que melhora a saúde do solo
E mais: essas práticas também podem levar ao chamado sequestro de carbono, algo que poderia ajudar a mitigar significativamente os impactos climáticos globais. O problema, nos EUA, é que se um agricultor melhorar os nutrientes do solo de um campo arrendado e aumentar o seu potencial de rendimento, poderá não colher os benefícios. Os arrendamentos típicos são feitos anualmente, em regime de caixa, de modo que o arrendatário pode acabar perdendo o trabalho que foi feito na terra ou ter que pagar mais para manter o arrendamento.
Além disso, áreas arrendadas não são adequadas para o mercado de compensação de carbono, porque elas necessitam de permanência em em termos de métodos agrícolas mais inteligentes para o clima, e um arrendatário não pode assumir compromissos de longo prazo. A Fractual Agriculture propõe entrar nesse flanco e fazer com que o agricultor tenha alternativas para ir em frente.
*Steven Savage , colunista da Forbes EUA, é biólogo pela Universidade de Stanford e doutor pela Universidade da Califórnia, em Davis (tradução: ForbesAgroi).