Especialistas ressaltam a importância da formalização para garantir direitos e benefícios ao profissional.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase dois milhões de trabalhadores estavam na informalidade no Paraná, o que representa 30% da força de trabalho do estado.
No Brasil, mais de 38 milhões de pessoas trabalham na informalidade, segundo o IBGE.
Um estudo nacional da Fundação Arymax e B3 Social, conduzido pelo Instituto Veredas, aponta que a formalidade e informalidade estão sempre em interação.
Durante crises econômicas, empregos formais caem e os informais aumentam. Quando isso acontece, surge a possibilidade de contratações formais com salários menores.
A pesquisa também identificou quatro tipos de ocupação da informalidade. São elas:
- informais de subsistência: não exigem qualificação e são instáveis, sem possibilidade de crescimento. É a pessoa que faz “bicos” para sobreviver. O levantamento afirma que, no Brasil, 60% dos trabalhadores na informalidade se encaixam nesta categoria.
- informais com potencial produtivo: geram rendimentos maiores, mas ainda sofrem com as incertezas. Produzem mais, mas não o suficiente para se formalizar. Um exemplo são os pintores.
- informais por opção: não se formalizam para aumentar receitas. São trabalhadores que, apesar de qualificação e rendimentos maiores, não veem vantagens na formalização. Podem ser psicólogos e médicos, por exemplo.
- formais frágeis: quem empresa ou carteira assinada, mas os vínculos são instáveis, como contratos intermitentes. Apesar de regulares, se encontram em situação de vulnerabilidade.
O vendedor ambulante Benedito Vanderlei Cavalheiro, de 49 anos, sai todos os dias de casa por volta das 7h, em São José Dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), para trabalhar. Ele vende pipocas no centro de Curitiba.
O trajeto dura quase duas horas de ônibus e mais 15 minutos a pé até o vendedor chegar ao semáforo onde trabalha há três anos.
“Começo 9h30 e vou até 18h, 18h20. Vendo e saio com a meta de vender 100 kits com dois pacotes por R$ 2. Se vender os 100 kits, que nem todo dia vende… Se eu vender 100 kits, dá pra tirar R$ 80 limpo, mas se não vender, dá bem menos”, conta.
O trabalho no semáforo exige agilidade. O trabalhador conta que são 56 segundos para colocar o saco de pipoca no retrovisor de dez carros e recolher de novo.
Benedito trabalha nove horas por dia, de segunda a sábado, sem nenhum tipo de garantia ou segurança.
Benedito não terminou o ensino fundamental. Ele estudou até a sétima série e teve carteira assinada por menos de cinco anos, quando trabalhou como operador de máquina.
O trabalhador sofreu um acidente e ficou um ano e nove meses afastado. Depois voltou a trabalhar por mais um ano, fez outras funções e foi despedido.
“Hoje em dia eu nem entrego mais currículos de operador de máquina. Um dos dedos não movimento, mão não fecha integralmente e não tem força. Para peso não dá, no máximo é erguer um pacote de 20 quilos e, assim mesmo, sem erguer peso, quando está frio, dói muito”, relata.
Benedito também trabalhou como garçom, mas depois da pandemia de Covid-19, passou a trabalhar somente como ambulante. Essa é a renda da família, segundo ele.
Por isso, ele relata que não pode ficar doente, que precisa trabalhar no sol, na chuva com capa e guarda-chuva, se não as coisas ficam difíceis. O sonho dele é montar um trailer de lanches e ter estabilidade.
“Só que isso é sonho, né? Porque eu trabalhei muito tempo com isso, para os outros, de empregado fazendo lanche. Mas eu queria ter uma estabilidade pra família”, conta.
Informalidade ganhou força com a tecnologia
Sidnei Machado é professor de Direito do Trabalho na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e afirma comenta que a informalidade representa uma exploração do trabalhador.
“Vamos aos exemplos dos aplicativos, são muito bons para isso. São remunerados hoje por entrega, sob demanda, então a empresa só paga pelo trabalho realizado. Trata os trabalhadores como uma certa mercadoria e não dá nenhuma contrapartida.”
Anderson Canone tem 38 anos e trabalhava com turismo, mas ficou desempregado na pandemia. A alternativa que encontrou, há mais de três anos, foi trabalhar como motorista de carro de aplicativo.
Ele diz que atualmente há muitos motoristas no mercado, então, sobram menos corridas para cada. Anderson também sente falta de uma boa remuneração.
“Hoje meio que trabalha como motorista de aplicativo meio escravo, porque você trabalha 15h, 20h e a remuneração que você tem não chega perto do que você trabalha. Isso faz muita falta no final.”
O diretor de Projetos e Articulação Institucional do Instituto Veredas, Vahid Vahdat, ressalta ser importante ter um CNPJ ou carteira assinada para a formalização. Contudo, diz que não é algo redentor.
“Não é algo que agora tem a carteira assinada, CNJP e está tudo resolvido. Na verdade, o que a gente precisa fazer? Justamente trabalhar para criar horizontes de qualidade para as pessoas, para que a ocupação e os negócios tenham sustentabilidade e crescimento no tempo”, afirma.
Segundo o diretor, as pessoas optam pela informalidade porque veem que existe um espaço para crescerem.
A pesquisa identificou que a busca por autonomia muitas vezes não é encontrada em posições de entrada no mercado de trabalho formal.
Ele comenta que, se as pessoas quiserem resolver a informalidade, é necessário transformar o campo da formalidade para que ele faça sentido para o trabalhador.
Problemas da informalidade
Entre os problemas causados pela informalidade, está a redução de arrecadação pelo governo, o que impacta em políticas públicas que podem garantir direitos como saúde e educação.
O caminho para deixar o mercado de trabalho mais formal no país é cheio de desafios.
Segundo Vahid Vahdat, é preciso identificar quais setores podem criar oportunidades para as pessoas se inserirem no mundo do trabalho e crescerem.
Outro ponto, é ajudar as pessoas que estão na informalidade a aumentar a produtividade de forma que elas possam entrar na formalidade e aproveitar os benefícios.
A diretora de Fomento e Renda da Secretaria do Trabalho, Qualificação e Renda (Setr), Adriana Kampa, afirma que a secretaria está mapeando os trabalhadores que prestam serviços ou produzem, tanto na reciclagem, transformação, artes manuais ou envolvidos em associações e cooperativas, mas que não estão formalizados.
Victor Barth ,chefe do Observatório do Trabalho da Setr, afirma que a informalidade tira a autonomia do trabalhador de ter seguridade pessoal.
“Não pode tirar licença, se não trabalha, não recebe. Aqui na Setr temos diversas qualificações e capacitações para a pessoa aprender sobre o que está vendendo e empreendendo, para poder abrir um MEI”, diz.
As limitações do MEI
O professor Sidnei Machado reconhece a tentativa de formalização via Microempreendedor Individual (MEI), mas acha que a política não atende a finalidade e que é ineficaz no Brasil.
“Hoje cerca de 17 milhões de trabalhadores são MEI no Brasil, então, eles estão com uma formalização bastante limitada. Não atendem a demanda de um trabalho digno, decente, não têm direitos. O MEI basicamente faz uma contribuição básica para a previdência e tem acesso a uma aposentadoria de um salário mínimo por idade”, argumenta.
Fonte: G1