sexta-feira,22 novembro, 2024

Sem perder o brinde: bebidas não alcoólicas ganham mais espaço e sobem de nível

Para agradar um público que quer (ou precisa) diminuir o consumo de álcool, cada vez mais marcas e restaurantes investem no mercado promissor das cervejas zero álcool e dos mocktails

Gui Galembeck
No Tiktok, a hashtag “Mocktail” tem mais de mais de 1,2 bilhão de views; na foto, os drinks sem álcool do restaurante Chou, que aposta na categoria desde que abriu, há 15 anos

A ideia de consumir bebidas sem álcool ainda soa tão estranha que, diante da crescente oferta de cerveja sem álcool no mercado, a dúvida mais comum registrada sobre o tema no Google Trends nos últimos 12 meses é se essa tal de cerveja sem álcool… tem álcool? Sim, de acordo com o serviço da Big Tech, ainda é difícil entrar na cabeça do pessoal que uma das bebidas mais populares do happy hour pode existir sem a substância.

Mas se em um passado recente os adultos que pediam uma bebida sem álcool na confraternização da firma eram sempre questionados pelos colegas, hoje esse comportamento está ficando cada vez mais comum – e os números estão aí para provar.

Quem puxou a onda certamente foi a cerveja. Por muito tempo alvo de preconceito dos amantes da bebida fermentada, hoje a categoria não alcoólica experiencia um boom, atingindo públicos que vão desde a galera fitness, com um estilo de vida saudável, às grávidas. A demanda é crescente: as buscas por cerveja sem álcool bateram recorde no mundo em julho deste ano, segundo o Google Trends. Nos últimos cinco anos, a procura pelo assunto aumentou 80% globalmente e 60% no Brasil.

O setor se mostra promissor. Não é à toa que cada vez mais marcas estão entrando no segmento, de grandes players como Heineken e Budweiser às mais artesanais, como a Athletic Brewing (que promete ter menos álcool do que uma fatia de pão de centeio). E chegou até à alta gastronomia: o 12º melhor restaurante do mundo, o paulista A Casa do Porco, tem um menu degustação harmonizado com cervejas e até vinhos sem álcool, por exemplo.

Divulgação
A Athletic Brewing é uma das marcas de cerveja zero mais badaladas da América e vendeu US$ 60 milhões em 2022

A maior procura do público fez a indústria se mexer e 2023 será o ano que o Brasil vai vender o maior volume de cervejas non/low-alcohol da história: serão 480 milhões de litros, mais que o triplo dos 140 milhões de 2019, de acordo com projeções da Euromonitor International para a Sindicerv (Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja).

Já nos bares e restaurantes, outra categoria que surfa nessa onda são os mocktails, um nome adornado para drinks sem álcool. À mesa, quem não for beber não precisa mais ficar só na água ou no suco: os coquetéis sem nenhum tipo de substância etílica têm sido elevados para (bem) além do básico, com misturas dignas da mixologia. Pense em espumas, xaropes, bitters e especiarias, com nuances, texturas e aromas de um drink convencional, servidos em taças e copos à altura. Os tempos onde a opção principal era um mero chá (normalmente bem doce) com água gaseificada e gelo em um copo de refrigerante estão ficando para trás, puxados por uma mudança comportamental dos consumidores.

“Um coquetel, seja ele alcoólico ou não, tem que ter um sabor desenvolvido, precisa ter umami, salgado, doce, ácido, azedo. Por isso eu trabalho drinks não alcoólicos utilizando infusões e ácidos, para que eles fiquem acima dos com álcool em relação à salivação na boca”, afirma a chef Janaína Rueda, que há anos já nota uma forte tendência de redução do consumo de álcool.

Vanessa Civiero, sócia responsável pela parte de bebidas do restaurante Animus, em São Paulo, vai na mesma direção. “Percebo que a maior parte do público que pede [mocktails] são aqueles que estão temporariamente sem ingerir bebidas alcoólicas, como mulheres grávidas, mas que querem acompanhar as outras pessoas na mesa com uma bebida mais elaborada e elegante do que um suco”.

Por lá, a carta conta com pelo menos cinco opções de drinks não alcoólicos, onde as frutas nacionais – como a uvaia e a jabuticaba, que aparece em uma versão abrasileirada de moscow mule – são as protagonistas. “Vejo bastante satisfação das pessoas em descobrir esse universo. Como temos uma oferta variada, o que acontece muito é de o cliente pedir um, se surpreender e acabar pedindo outros para experimentar, como se estivesse explorando uma carta de coquetéis mesmo”, completa Vanessa.

Thays Bittar
O drink sem álcool Jabuticaba Mule, do Animus

A moda tem se espalhado, seja para atender um público que quer ser mais saudável, têm restrições médicas ou simplesmente não quer passar pelo estado de alteração etílica (ou a ressaca do dia seguinte), especialmente em um ambiente profissional – pense em um happy hour ou um almoço de negócios, por exemplo. “Com o passar dos anos, vemos um consumo mais consciente do álcool e a busca por mais experiências do que embriaguez. Como um excelente prato de comida pode ou não conter álcool, o drink funciona exatamente igual”, afirma Ricardo Takahashi, bar manager do Beefbar.

Nesse sentido, nos últimos quatro anos, a presença de mocktails nos cardápios de restaurantes ao redor do mundo cresceu impressionantes 223%, de acordo com o estudo MenuTrends, da Datassential. E deve aumentar ainda mais, prevê Daniel Estevan, head bartender dos cariocas NOSSO e do Katz-sū, com o desenvolvimento cada vez mais acelerado de destilados sem álcool, como vodkas e gins – tendência já forte no continente europeu, que o profissional aposta que chega em terras brasileiras nos próximos anos.

Quem investe nos coquetéis não alcoólicos desde que abriu, há 15 anos, é o Chou, também em São Paulo. Com uma procura considerável por eles desde sempre, a aposta parece ter valido a pena: a média de vendas da casa é de um drink sem álcool para três alcoólicos. Outros lugares sem uma carta de mocktails também começam a dar mais bola para a corrente. É o caso do Santana Bar, endereço de alta coquetelaria já eleito o melhor bar de drinks da capital paulista pela Veja Comer & Beber 2021. “Senti uma atenção maior sobre isso na Europa, com as casas dando valor pras bebidas não alcoólicas e fazendo destilados sem álcool. Aqui [no Brasil] não percebo tanto assim, mas queria começar a dar essa atenção, inclusive no nosso próximo cardápio”, afirma o sócio e bartender Gabriel Santana.

Uma pesquisa, do Pinterest Predicts, corrobora que a tendência chegou para ficar: em 2022, as pesquisas por “bar de mocktails” subiram 75% em relação ao ano anterior, enquanto as de “bebidas sem álcool sofisticadas” registraram uma alta de 220%. No Google Trends, a busca pelo termo “drink não alcoólico” atingiu seu pico da série histórica, iniciada em 2004, enquanto no app da Gen Z, o TikTok, a hashtag #mocktail acumula mais de 1,2 bilhão de views.

É inegável que exista uma mudança comportamental em andamento quando o assunto é o consumo de álcool, junto a uma demanda reprimida por opções mais sofisticadas de bebidas sem qualquer tipo de substância etílica. A hora é dos restaurantes, bares e marcas nadarem com a maré, em um mercado que ainda tem muita margem de crescimento – 31% até 2024, segundo a consultoria IWSR.

Texto: Giovanna Simonetti

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