No que depender dos jovens nascidos entre 1995 e 2010, a chamada Geração Z, o mundo será mais colaborativo e o ensino, voltado a soluções reais. Segundo levantamento promovido em cerca de 40 países, impactar a vida de outras pessoas está entre os principais objetivos desse público. Esta e outras descobertas impactam diretamente no modo de fazer Educação em sala de aula e fora dela.
“A gente precisa mudar a forma como a aula é realizada, trazendo atividades que tenham valor intrínseco para os alunos, que fazem com que eles tenham um senso de pertencimento e avancem com esse engajamento”, Gustavo Borba, professor da Unisinos.
O estudo do Institute for Generational Research and Education, dos Estados Unidos, foi conduzido pelas pesquisadoras Corey Seemiller e Megan Grace. No Brasil, a aplicação ficou a cargo da Unisinos, por meio do Instituto para Inovação em Educação.
Trata-se de uma pesquisa de percepção, ou seja, tem como principal objetivo entender como a Geração Z percebe a si mesma. Os entrevistados identificam, a partir de questionários, as características que eles têm, como preferem estudar, como se relacionam em grupo e as formas preferidas de comunicação, entre outros tópicos.
Coletividade
As descobertas destacadas pelo professor da Unisinos Gustavo Borba dizem respeito ao levantamento promovido no Brasil. Por aqui também foram feitas muitas revelações. Em linhas gerais, pode-se dizer que esta é uma geração que se vê e se mostra focada no coletivo e tem na lealdade a principal virtude. “Na sequência aparecem características como mente aberta, reflexivo, responsável e curioso. A partir disso a gente pode, de alguma forma, enxergar como eles se percebem em uma perspectiva de interação”, explica Borba.
No fim da lista, entre as características menos percebidas pela Geração Z, estão adjetivos como oportunista, conservador, visionário e inspirador. Segundo o pesquisador, esses elementos também são importantes porque fazem parte do mapeamento inicial. O passo seguinte é identificar os motivadores desses jovens.
É aí que aparece outra descoberta interessante: recompensas tangíveis, como notas de avaliação ou mesmo dinheiro, não figuram nem em um simbólico pódio – aparecem em sexto lugar. Antes disso, eles reconhecem oportunidade para avançar, ver os frutos do trabalho, fazer diferença para alguém, aprender algo e se tornar melhor naquele assunto, além de defender coisas em que acreditam. A preocupação está em contribuir para uma construção coletiva.
Futuro do trabalho
Com relação às soft skills, embora a pesquisa não tenha trazido perguntas específicas, foi possível perceber que existe a compreensão de que o avanço na formação vai além da questão técnica. Os jovens precisam de um caminho que os permita se desenvolver pela vida toda – e isso nem fica restrito à Geração Z, mas é fundamental que eles tenham autonomia para traçar o próprio caminho.
Para isso, eles esperam da instituição de ensino um espaço onde as atividades de formação possam promover o engajamento, a partir de coisas que façam sentido, com elementos que possam colocar a potência deles em prática, onde possam efetivamente crescer em seu aprendizado e causar impacto positivo na sociedade.
Sobre o estilo de trabalho, a maioria (quase 75%) garante preferir atividades em grupo. Apenas 3,5% referiram não gostar nem um pouco da modalidade, enquanto 22% não gostam muito, mas participam sem problemas.
Influencers caseiros
Em tempos de mídias sociais e a crescente presença de influencers, o estudo sobre a Geração Z apontou resultados curiosos. Além de preferirem a comunicação presencial, os jovens revelaram que na hora de tomar decisões importantes, a opinião que mais pesa é a de pai e mãe, seguida pela dos professores, irmãos e amigos. Nesta ordem. A importância dada à figura do professor traz uma série de implicações e leva a um dos pontos centrais do desenvolvimento da Educação: a formação dos quadros docentes.
Para Borba, as principais mudanças não estão relacionadas estritamente à aula, a decisões como usar ou não a tecnologia. “Não é isso que faz o caminho. É sobre os elementos que engajam os estudantes, que problemas sociais eles querem trabalhar, que formas de interação eles preferem. Esse é o ponto principal. A gente precisa mudar a forma como a aula é realizada, trazendo atividades que tenham valor intrínseco para os alunos, que fazem com que eles tenham um senso de pertencimento e avancem com esse engajamento”, defende Borba.
Segundo ele, o papel do professor se transformou ao longo do tempo e hoje é o de curador, mediador, conector, promotor de engajamento, alguém que precisa saber ouvir os alunos. “O professor sempre vai ter relevância nesse processo, independentemente do nível de tecnologia”, sustenta. Por isso, não se trata apenas de falar a mesma língua dos alunos, mas aproximar-se deles, de fato.
“A formação docente é o ponto-chave e deve considerar novas competências que o professor precisa ter no ambiente de ensino, especialmente as que fazem com que a gente compreenda melhor para quem a gente está projetando algo, que são os alunos, e abra espaço para uma cocriação, para projetar conjuntamente, e também para ensinar e aprender. O professor também é um aprendiz na sala de aula e precisa se colocar nesse lugar”, entende o professor da Unisinos.
Desinteresse pela carreira de docente
A mudança na relação com a figura do professor é acompanhada por um desinteresse em seguir carreira na sala de aula. Este é um dos recortes, que foi trazido pela pesquisadora Debora Barauna, do grupo Inovação Orientada pelo Design para construção de engajamento em ambientes de aprendizagem (IODA), ligado ao Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Design da Unisinos.
“A gente observou uma desvalorização na figura do professor, um desinteresse causado por diversos motivos. Não ser uma profissão valorizada, tanto financeiramente, quanto de outros tipos de valores, de reconhecimento, e a falta de autonomia do professor aparecem entre os primeiros pontos”, explica a professora. Na percepção dos entrevistados, a formação do professor ainda é muito voltada para um contexto de sala de aula, enquanto ele poderia atuar em diversos tipos de ambientes e contextos – até mesmo como professor autônomo, empreendendo.
Mudança imediata
Enquanto se discute as mudanças necessárias na formação dos professores para, ao mesmo tempo, otimizar o processo de ensino e atrair novos docentes, é preciso acelerar a adaptação dos que já estão em sala de aula. Debora propõe como estratégia mais imediata o cuidado com esse professor, que precisa trabalhar com a Geração Z e se depara com questões como a linguagem e a compreensão, de uma forma geral – como referiu Gustavo Borba, antes: é mais do que falar a mesma língua.
A conexão com os alunos depende de uma série de fatores. Entre os aspectos socioemocionais do processo de aprendizagem, o estudo apontou que os jovens estão muito sensíveis a questões como a ação do tempo e ansiedade. Muitos contam com acompanhamento psicológico e tratam transtornos como o déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
“A problemática é imensa, mas eu tenho praticado, nas minhas turmas, uma aproximação do aluno enquanto suas individualidades, e ao mesmo tempo proporcionando reconhecimento das individualidades dele em relação aos outros alunos”, conta Debora. Isso leva o jovem a acolher e se permitir ser acolhido, entendendo que outras pessoas também sentem coisas parecidas. Assim se faz um ambiente de escuta, fluindo melhor o relacionamento entre os alunos e deles com o professor.
“As habilidades técnicas acabam sendo trabalhadas de forma mais qualificada, existe engajamento e todos entram na mesma página. Todo mundo se reconhece e entende que é importante estar ali”, conclui a pesquisadora.
Texto: Pedro Pereira