Se você quer estudar astronomia e não sabe por onde começar, saiba que pode ser mais simples do que imagina. Os primeiros passos não precisam ser chatos ou complicados — isso, na verdade, afastaria muitos iniciantes. Aqui, você encontrará várias dicas para tornar sua “iniciação” na astronomia algo divertido e fascinante.
Antes de começar a se aventurar, é preciso ter em mente que astronomia é uma ciência multidisciplinar. Isso significa que o conhecimento astrofísico (astronomia e astrofísica são a mesma coisa) é construído com a colaboração de cientistas especializados em diferentes áreas. Contudo, você não precisa se especializar: é possível se tornar um cientista cidadão.
Cientistas cidadãos são aqueles que colaboram com os cientistas “profissionais” por meio de iniciativas criadas pelas próprias agências, como a NASA, ou institutos científicos. Um exemplo são as temporadas de “caça” aos asteroides, das quais qualquer pessoa do planeta pode participar — basta ter um computador com acesso à internet.
Caso seu objetivo seja ir um pouco além — observar o céu com telescópios, ou ajudar na análise de dados astronômicos de observatórios como o Hubble ou o observatório de raios X Chandra —, basta se dedicar. É possível se aprofundar ainda mais, porém, em certo ponto, será necessária uma iniciação científica, graduação em física, e cursos de pós.
Astronomia amadora
Os cientistas cidadãos que se dedicam a algum (ou alguns) dos ramos da astronomia são chamados de astrônomos amadores. A área de atuação varia bastante, e depende do quão disponível você está para contribuir com astrônomos profissionais com suas observações e análises de dados. Claro, depende também das suas condições financeiras para comprar telescópios e binóculos.
Por mais que pareça um pouco intimidadora, a astronomia é uma ciência bastante acessível, por vários motivos. O mais óbvio deles é que quase todos podem observar o céu (com ou sem equipamentos especiais) e aprender sobre os objetos celestes e seus movimentos. Além disso, o conhecimento nos dias de hoje é fácil de adquirir.
Seja por artigos e vídeos na internet, seja por meio de contatos com astrônomos mais experientes — a maioria é bastante acessível e ávida por compartilhar conhecimento —, qualquer um pode começar a estudar por conta própria. Por outro lado, existe um universo de informações por aí (literalmente) que podem confundir mais do que ajudar.
O problema com a disponibilidade de muitas informações é que, ao se deparar com explicações avançadas logo no início dos estudos, os iniciantes podem ficar confusos e frustrados. Dependendo das explicações e didática do comunicador científico, tudo pode parecer impossível de entender.
Por isso, vamos propor alguns passos para tornar a jornada, em primeiro lugar, divertida. Se este não for um processo prazeroso, as chances de frustração e desistência são grandes. Para ajudar, conversamos com o professor Prof. Rodolfo Langhi, doutor em Educação Para a Ciência.
Além disso, contamos com as dicas publicadas nas redes sociais de diversos divulgadores científicos — todos mencionados no final da matéria, junto de várias indicações de filmes, séries, livros e cursos online. Vamos lá?
Onde posso estudar astronomia?
Na internet encontramos informações, aulas, palestras e muito mais; contudo, a astronomia é um campo com muitas ramificações. Por exemplo, você pode passar uma vida inteira estudando a Lua, o Sol ou as estrelas visíveis no céu noturno, ou optar por investigar os mistérios da matéria escura e dos buracos negros.
Alguns astrofísicos escolhem a cosmologia — estudo da origem, estrutura e evolução do universo — como seu principal objeto de estudo, enquanto outros constroem suas carreiras observando quasares, supernovas e outros eventos energéticos do cosmos.
Mas todos têm algo em comum: eles passaram por um momento inicial de aprendizado no qual entenderam conceitos fundamentais. Isso inclui noções do céu visível, da física clássica, relatividade geral, mecânica quântica, evolução estelar, e até mesmo um pouco da história dos grandes cientistas, como Isaac Newton, Galileu Galilei e Albert Einstein.
A boa notícia é que podemos aprender todas essas coisas de modo divertido e com didática suficiente para que todos possam compreender — por meio de livros, filmes e documentários. O formato audiovisual é um excelente “pontapé inicial”, porque proporciona imagens deslumbrantes do universo, enquanto a leitura nos aprofunda nos temas de modo didático.
Assista filmes e séries
Professores costumam dizer que filmes e séries no idioma original ajudam a aprendê-lo. O mesmo é verdade para a linguagem da astronomia: quanto mais consumimos conteúdo de entretenimento sobre o assunto, mais nos acostumamos com os conceitos e os “jargões”.
Um exemplo sempre citado por divulgadores científicos é o filme Interestelar (2014), não apenas pela precisão científica da maioria dos conceitos apresentados, mas também por explicá-los. Claro, muitos ainda podem ficar confusos com o final, mas isso também é bom porque estimula o raciocínio.
Além de nos fazer “quebrar a cabeça” para entender alguns elementos do enredo, filmes como Interestelar também nos ajudam a aprender a pesquisar. Por exemplo, se você não entendeu a viagem dos astronautas através do buraco de minhoca para chegar aos planetas perto de Gargantua, há muitos cientistas explicando a ciência por trás disso.
Também podemos pesquisar sobre o efeito de dilatação do tempo, que faz cada hora na superfície do planeta Miller equivaler a sete anos na Terra. Tudo isso é baseado na Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein, e há vários vídeos e matérias sobre o tema.
Então, a dica é assistir a filmes e séries, anotar os temas científicos apresentados e pesquisar um pouco sobre eles. Existem alguns canais confiáveis em plataformas de vídeos que provavelmente explicarão sobre esses assuntos, e mencionaremos alguns deles no final da matéria.
E, claro, você pode acabar descobrindo que os cientistas não concordam com uma coisa ou outra apresentada nos filmes. Por exemplo, ninguém sabe o que existe dentro de um buraco negro, mas as suposições e escolhas de Christopher Nolan em Interestelar são interessantes e, de certa forma, fazem algum sentido.
Assista documentários
Existem muitos documentários disponíveis nas plataformas de streaming, como Amazon e Netflix. O legal é procurar, primeiro, aqueles a respeito do Sistema Solar e seus planetas, sobre o Sol, a Lua, ou mesmo sobre as viagens à Lua.
Também há documentários sobre as missões robóticas em Marte, sobre telescópios como o Hubble e astronautas que entraram para a história. Mas alguns deles são fundamentais, senão obrigatórios, começando por Cosmos (1980). Trata-se de uma série do famoso divulgador científico Carl Sagan, com temas que vão desde o Big Bang à formação e evolução da vida na Terra.
The Most Unknown (2018), documentário disponível na Netflix, também é muito elogiado pela produção e inovação em sua abordagem. Seu foco é mostrar a colaboração interdisciplinar entre cientistas, dando um gostinho de como a ciência é feita nos grandes institutos e centros de pesquisa.
Por fim, temos Black Holes: The Edge of All We Know (2021); um documentário um pouco mais avançado mas incrível, pois nos coloca dentro das salas onde os cientistas do Event Horizon Telescope (EHT) trabalharam por dois anos na primeira imagem real de um buraco negro já registrada pela humanidade.
Leia livros
Livros sobre astronomia não precisam ser chatos. Na verdade, muitos divulgadores científicos se esforçam para fornecer a informação de maneira didática e divertida. Entretanto, alguns dos mais populares podem ser um pouco avançados caso você ainda não esteja familiarizado com os principais conceitos da física e astronomia.
Por isso, é importante não dar “passos maiores que a perna”, ou seja, comece pelos livros mais introdutórios. Alguns autores como Carl Sagan e Neil deGrasse Tyson cumprem bem esse papel. Aqui no Brasil também há excelentes autores, como o prof. Langhi. Você encontrará alguns deles na lista de indicações no final da matéria.
Se inscreva em cursos online
Outra forma de aprender são os cursos online, oferecidos às vezes por iniciativas pessoais, às vezes por universidades. Um deles é ministrado pelo professor Langhi e está com inscrições abertas até 21 de maio de 2022.
Também há cursos completos grátis no YouTube, em português, e alguns mais avançados em plataformas como o Coursera, em inglês com legendas em português. Esses cursos podem ser um pouco mais raros, mas são a melhor oportunidade de ter contato direto com os professores e acesso a conteúdos organizados, indicações de leitura e exercícios para revisar sempre.
Por fim, não podemos deixar de incluir em nossa rotina de estudos a própria Wikipedia. Embora essa enciclopédia colaborativa tenha alguns problemas ao tratar de outros assuntos, a comunidade científica “cuida” muito bem das informações sobre ciência e astronomia. Em geral, esse tipo de conteúdo disponível por lá é confiável.
Participe de grupos de astronomia amadora
Os grupos de astrônomos amadores são uma oportunidade incrível de conversar com pessoas mais experientes e ávidas por compartilhar conhecimento. Além disso, alguns possuem instrumentos como binóculos e telescópios que seus membros podem usar para observações.
Por falar em observações, esses grupos também são importantes para organizar noites em locais mais afastados da cidade, onde a poluição luminosa não atrapalha. Muitas cidades têm seus próprios grupos.
Entrevista com o Prof. Dr. Rodolfo Langhi
Para completar a lista de dicas, conversamos com o Prof. Dr. Rodolfo Langhi, do Observatório Didático de Astronomia da UNESP, autor do livro Aprendendo a ler o céu: pequeno guia prático para a astronomia observacional — que, aliás, também é muito indicado para iniciantes.
Canaltech: Além de começar a observar o céu, como uma pessoa leiga pode iniciar os estudos de astronomia?
Prof. Dr. Rodolfo Langhi: Eu indicaria algumas obras cuja linguagem fosse mais acessível ao leigo, ao invés de começar com leituras mais densas ou aquelas que apresentam teorias complexas.
É como comprar o primeiro telescópio! Se você comprar um telescópio difícil de montar, transportar, alinhar, fixar, apontar e seguir o movimento do astro, não vai querer mais saber de Astronomia. O resultado é a decepção da pessoa que mal conseguirá apontar para a Lua e acompanhar seu movimento aparente no céu com os ajustes do telescópio.
O mesmo se dá com os primeiros contatos de livros sobre Astronomia. Há vários autores que publicam sobre o tema, porém, muitas vezes a linguagem e o modo como o texto é apresentado pode decepcionar o leitor pela falta de compreensão, devido à complexidade das explicações e da fraseologia empregada pelo autor.
Assim, na minha opinião, os melhores livros para o interessado em começar a aprender astronomia são aqueles em que o escritor se preocupa com o leitor e usa linguagem simples. Além de facilitar o entendimento da Astronomia, o livro motivará a pessoa a querer aprender mais ainda. A boa leitura não fornece apenas a oportunidade de aprender, mas dá prazer neste aprendizado.
Portanto, considero como sugestão alguns destes autores, que me ajudaram pessoalmente e me motivaram: Isaac Asimov, Rodolpho Caniato, Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, e, seguindo a pretensão de tentar cumprir o que escrevi aqui nesta resposta, gostaria de sugerir o meu livrinho também (Aprendendo a ler o céu: pequeno guia prático para a astronomia observacional), cujo objetivo foi o mesmo: tentar explicar com palavras simples a Astronomia e motivar o leitor a aprender mais por observar o céu.
CT: Como o sr. começou seus estudos?
RL: Não me lembro de um momento específico que tenha despertado meu interesse, mas minha mãe me conta que desde antes de começar a falar, eu ficava olhando para o céu estrelado, para as nuvens de dia, e ficava fazendo perguntas para eles.
Sabendo disso, eles sempre me incentivaram, me levavam ao Planetário do Ibirapuera (sou do ABC paulista) e observatórios, me deram uma luneta na formatura de 8.ª série, e me inscreveram em vários cursos de astronomia curtos e me levavam em reuniões de astrônomos amadores e clubes de astronomia.
Então, essa relação com a Astronomia foi crescendo cada vez mais…
CT: Inclusive, planetários e observatórios também são ótimos para quem está começando, certo?
RL: Sim! Quem quer começar deve visitar um clube de astronomia, um astrônomo amador, um vizinho ou alguém que já tenha um telescópio, um observatório aberto ao público, ou um planetário no horário das apresentações — e deve aproveitar para encher os participantes de perguntas, pois, em geral, quem atende as pessoas nestes lugares são profissionais que gostam de explicar e sentem prazer em tirar as dúvidas da comunidade e ajudar os interessados.
CT: Sobre cursos livres, existe algum site ou página em redes sociais para nossos leitores seguirem e ficar sabendo quando os cursos acontecem?
RL: Posso indicar o Instagram do nosso Observatório, o canal no YouTube chamado AstroTubers, do Rubinho, e o canal Céu Profundo (links no final da matéria). Estes estão sempre fazendo ampla divulgação de tudo o que acontece em astronomia em cursos e lives
Recomendações
Filmes
- Interestelar (2014): Teoria da Relatividade Geral; gravidade; buracos negros; buracos de minhoca; hipercubo e a quarta dimensão; singularidade; cilindro de O’Neill
- Gravidade (2013): missões espaciais em órbita terrestre
- Estrelas Além Do Tempo (2016): exploração espacial
- O Mar da Tranquilidade (2021): exploração espacial
- Apollo 13 (1995): exploração espacial
- Perdido em Marte (2015): exploração planetária
Documentários
- Stephen Hawking‘s Universe (1997)
- Ciência de Tudo com Stephen Hawking (2016)
- O universo (2009)
- Apollo: Missão à Lua (2019)
- A Conquista da Lua, com introdução comemorativa do 51º aniversário da Apollo 11 (2020)
Livros
- Cosmos (Carl Sagan)
- Do átomo ao buraco negro (Schwarza)
- Aprendendo a ler o céu: pequeno guia prático para a astronomia observacional (Dr. Rodolfo Langhi)
- Astrofísica Para Gente Com Pressa: Uma Viagem Rápida Ao Cosmos (Neil deGrasse Tyson)
Divulgadores científicos para seguir
- Céu Profundo
- AstroTubers
- Observatório Didático de Astronomia da UNESP
- Ciência Todo Dia
- Astrofísica Para Todos
Por: Daniele Cavalcante