sábado,23 novembro, 2024

O que foi o evento Novos 52 na DC Comics?

Desde que as editoras norte-americanas de quadrinhos Marvel Comics e DC Comics começaram a organizar uma cronologia de histórias contínuas em seus universos ficcionais, há a necessidade de revisão recorrente sobre a consistência da sincronia entre todas suas propriedades. Para organizar melhor cada personagem e sua importância, elas costumam usar eventos que reúnem as principais franquias. E um deles foram os Novos 52, que causou um certo misto de amor e ódio entre os leitores.

Antes de falar sobre o evento em si, é preciso entender um pouco o contexto que levou a DC a realizá-lo. Para isso, é preciso voltar algumas décadas no tempo, a começar por Crise nas Infinitas Terras, o primeiro grande crossover entre todos os personagens da editora. Foi ali que a empresa entendeu como alinhar suas criações em um mesmo “parquinho” e brincar com uma história capaz de revisar, reposicionar e revitalizar cada propriedade e suas conexões.

Isso foi necessário porque, em 1985, os principais ícones da DC (Superman, Batman e Mulher-Maravilha), que servem como “gancho” para conduzir a cronologia na editora, apresentavam muitas inconsistências narrativas. Isso porque os personagens mudaram muito desde suas primeiras histórias, a partir dos anos 1930 — assim como o mercado e os próprios leitores.

Superman ficou mais jovem e agressivo nos Novos 52 (Imagem: Reprodução/DC Comics)

Como o Batman saiu de sua versão “vigilante”, passou a sorrir nos anos 1960, ganhou dois Robin e chegou a uma versão apocalíptica em Batman: O Cavaleiro das Trevas? Em que época exatamente ele conheceu o Superman? E de que maneira ele passou a interagir com a Mulher-Maravilha, que participou ativamente da Segunda Guerra Mundial? São questões como essa que precisavam ser respondidas em uma linha narrativa e temporal coerente, em que a Sociedade da Justiça também pudesse coexistir com a Liga da Justiça

Além disso, a DC adquiriu várias outras pequenas editoras e personagens ao longo das décadas, como a Charlton Comics, que teria suas criações convertidas em versões para o próprio Universo DC e também para a realidade alternativa de Watchmen; e Shazam, que antes chamado de Capitão Marvel e passou a ter maior importância entre os heróis da Liga da Justiça. Então, era necessário encontrar uma forma de encaixar essas propriedades na cronologia.

Com Crise nas Infinitas Terras, a DC encontrou sua melhor maneira de fazer isso, a partir de um reboot que pudesse explicar todas as incongruência e manter um universo mais adequado para o período de publicação.

O caminho para os Novos 52: a crise das HQs nos anos 1990 e a saga Ponto de Ignição

Os anos 1990 foram cruéis com o mercado de quadrinhos, que vivia um momento de intensas mudanças. Os leitores de uma época pós-Queda do Muro de Berlim e Guerra Fria, estavam cansados das fórmulas desgastadas do heroísmo “puro” da Era de Ouro de Quadrinhos e da ficção científica intensa na Era de Prata dos Quadrinhos. Os hábitos de consumo mudavam com a popularização dos computadores, da Internet e dos dispositivos eletrônicos. Cada dia ficava mais difícil competir com outras mídias, produtos, serviços e proteger propriedades intelectuais.

Inspirada pelo sucesso de histórias mais cruas e reais, em tom mais sombrio e adulto, a DC apelou para tramas chocantes e reformulações questionáveis. Batman ficou paralítico depois de ter sua espinha dorsal quebrada pelo Bane; Superman morreu, assim como o Arqueiro Verde e o Lanterna Verde; a Mulher-Maravilha aparecia cada vez mais sexualizada. A DC, e a Marvel também, não sabiam como manter os leitores veteranos interessados e fisgar uma nova geração, já que os consumidores haviam, nitidamente, envelhecido — e o pior, sem uma grande renovação.

Em Ponton de Ignição, Flash volta no tempo para salvar sua mãe e acaba alterando a realidade (Imagem: Reprodução/DC Comics)

Os anos 2000 foram de construção e aprendizado. As editoras de quadrinhos tiveram que entender como capitalizar a interação com outras mídias, a exemplo da TV e do cinema; além de compreender como combater a pirataria e lucrar com o comércio digital — algo que passou a ser debatido com intensidade no período do Napster e do iPod na indústria musical.

Já no fim dessa década, a DC percebeu que podia melhorar suas criações e narrativas a partir de melhor integração com os outros braços da Warner Bros, detentora da editora; e também olhar para os leitores na rede sociais, assim como o próprio sucesso da Marvel, que conseguia renascer com os Vingadores e a aclamação do filme Homem de Ferro.

Assim, a saga Ponto de Ignição (ou Flashpoint), que altera a realidade do Universo DC a partir da viagem no tempo do Flash Barry Allen, serviu como justificativa para editora mudar o que vinha dando errado e manter intacta as linhas narrativas de títulos que estavam dando certo. E, assim, um pouco depois, também em 2011, nasceram os Novos 52.

O que foram os Novos 52

Uma das maiores reclamações dos leitores no início dos anos 2000 era que, desde Crise nas Infinitas Terras, a DC não vinha lançando eventos que realmente redefinissem bem a cronologia e os personagens. Ao mesmo tempo, os veteranos desaprovavam a maneira como os ícones da editora vinham envelhecendo.

Para tentar agradar a todos, a DC reinventou o Superman e a Mulher-Maravilha, incluiu mais diversidade em todas as linhas, afastou o que achava estar dando errado e manteve o que estava vendendo bem, como Batman e Lanterna Verde. Era como estivéssemos revendo os primeiros anos do Homem de Aço como herói, a descoberta de poderes de Diana Prince e o primeiro encontro entre todos os heróis da Liga da Justiça.

E tudo isso foi enxugado em uma linha mais “objetiva” de oferta de títulos, com apenas 52 revistas lançadas mensalmente — a DC sempre teve um apego pelo número 52, que também representava a quantidade de Terras paralelas existentes no Multiverso DC.

Os Novos 52 mostravam a primeira reunião da Liga da Justiça em uma nova era (Imagem: Reprodução/DC Comics)

Mas isso começou a resultar em muitos problemas. Primeiro, a linha temporal toda zoada: como Bruce Wayne se manteve o mesmo, enquanto Clark Kent estava mais jovem? Se todo mundo está mais jovem, por que Batman já tem três cinco Robin? O que aconteceu com a “velha guarda” da Sociedade da Justiça e da Legião dos Super-Heróis?

Some a isso a mudanças questionáveis, como transformar Wally West em um personagem negro, de maneira forçada, só para que ele ficasse igual ao seriado The Flash — a própria Marvel já tinha mostrado como fazer isso de maneira mais adequada, como com o Nick Fury. A aplicação da diversidade não foi tão bem pensada.

Para completar, os Novos 52 traziam um tom mais agressivo e sombrio, que espelhava bastante o que Zack Snyder estava construindo na DC Films com suas produções envolvendo a Liga da Justiça. Foi aí é que o escritor Geoff Johns reapareceu para dar um fim aos Novos 52.

Como os Novos 52 morreram?

Se criativamente a DC vinha balançando, nos bastidores as coisas eram ainda piores. O editor-chefe Dan Didio parecia estar perdido, apostando ainda em coisas ultrapassadas, com fórmulas que forçavam a continuidade retroativa (retcon), que, no final, nada mudava. E suas decisões limitavam também os negócios, já que acabar com o legado de heróis: ao ignorar o passado, com a Sociedade da Justiça; e o futuro, com a Legião dos Super-Heróis, ele deixava de explorar um “parquinho” muito mais amplo.

Os leitores detestaram a ideia de ver que ninguém mais era casado ou tinha filhos, e que não havia mais uma comunidade de Flash ou a “velha guarda” dos heróis, entre outras coisas. Essa visão irritava também roteiristas que ajudavam a DC a construir sua nova mitologia, a exemplo de Scott Snyder (não o Zack, Scott mesmo) e Geoff Jonhs, que, por sua vez, tinham atritos com Dan Didio.

A DC também vivia um momento de instabilidade, em meio de “limpeza de pessoal” sob acusações de assédio sexual e outros abusos nos corredores da editora. Para piorar, a AT&T já acenava com grandes mudanças no processo de aquisição da Warner Bros. Isso tudo enfraqueceu as ideias que Didio tinha para mais um retcon, inicialmente chamado de 5G. E aí Geoff Johns voltou para “consertar” as coisas e deixa o terreno preparado para a reformulação estruturada por Scott Snyder, a partir de conceitos já estabelecidos anteriormente por Grant Morrison nos anos 2000.

O Relógio do Juízo Final decretou a morte dos Novos 52 (Imagem: Reprodução/DC Comics)

Johns trouxe de volta o amor e o legado com Renascimento e O Relógio do Juízo Final. Ele trouxe de volta o Wally West original e a velha guarda da Sociedade da Justiça, assim como o futuro dos heróis em Legião dos Super-Heróis. O autor usou e integrou o universo de Watchmen com o da Liga da Justiça, explicando que o Doutor Manhattan trouxe sua visão de um mundo onde os heróis eram corrompidos para o tradicional Universo DC. Nos bastidores, Didio vinha sendo demitido.

Depois disso, os Novos 52 caíram: uma nova era, capitaneada pelos eventos Noite de Trevas, de Batman; e pela atual Fronteira Infinita, mantiveram todas as fases já vividas pela DC em muitos Multiversos, chamado de Omniverso. Assim, editora vem tentando aceitar o caos natural de sua cronologia sem ignorar ninguém — do seu jeitinho sempre torto e divertido, ela vem mostrando que sempre vão acontecer incongruências, já que os próprios personagens se mostram confusos com suas próprias versões em Terras diferentes e linhas temporais insanas.

Assim, atualmente, algumas coisas que deram certo nos Novos 52, a exemplo de Mulher-Maravilha e de The Flash, continua coexistindo com o Batman da Era de Ouro dos Quadrinhos e com a nova geração de heróis assumindo o manto de seus mentores. Meio complicado, né? Bem, esse é o jeitinho natural da DC.

Redação
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