A biodiversidade de insetos terrestres no Brasil, que inclui animais como borboletas, abelhas e besouros, está em tendência de queda. Esse é um dos resultado de um levantamento feito por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e das universidades federais de São Carlos e do Rio Grande do Sul. As informações foram reunidas a partir de 45 pesquisas científicas sobre o tema, além de questionários enviados a pesquisadores que já estudam insetos ao longo dos anos.
“Se você acaba com os insetos, você quebra todas as cadeias alimentares da natureza na base. Se você não tem lagartas para os passarinhos comerem, as aves vão diminuir. Se você não tem insetos para vespas se alimentarem, elas vão cair e, uma vez que caiam, elas começam a causar um desequilíbrio que pode levar, por exemplo, ao aumento de pragas, tanto nas cidades quanto na agricultura”, alerta André Freitas, professor do Instituto de Biologia da Unicamp e um dos pesquisadores do projeto.
O estudo apresenta 75 tendências – a maioria delas de queda – ao longo de 22 anos para insetos terrestres. Para os insetos aquáticos, o estudo apresenta 75 tendências ao longo de 11 anos, em média. A maior parte indica redução no número de animais. O trabalho teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O texto foi publicado hoje (23) no periódico internacional Biology Letters.
Entre os insetos terrestres, por exemplo, os estudos apontaram tendência de declínio populacional ou perda de diversidade de espécies. A situação é diferente nos grupos aquáticos, nos quais o número de indivíduos ou de espécies permaneceu estável ou, em alguns casos, aumentou. Os pesquisadores, no entanto, chamam a atenção de que essa diferença deve ser reavaliada futuramente.
Tendência mundial
Freitas destaca que outros estudos, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, já vinham demonstrando o declínio de insetos nessas regiões, mas havia poucas informações sobre a situação nos países de clima tropical.
“Lá, eles têm dados de décadas levantados, mostrando que existe declínio de todos os tipos, não apenas polinizadores”, aponta. Ele lembra que a diversidade de insetos é muito maior por aqui, com uma variedade de espécies de 10 a 20 para um em relação aos países de clima temperado.
O pesquisador explica que, para entender a situação dos insetos, é fundamental a existência de estudos a longo prazo, pois esses animais apresentam ciclos de vida curtos. “[A análise do] inseto é quase igual a um eletrocardiograma, cheio de picos e vales. Assim, para você conseguir saber, vai ser sempre uma linha zig zag com grandes amplitudes, mas você pode ver se está subindo ou descendo. Para ter isso, você precisa de séries temporais muito longas, e a gente tinha muito pouco [no Brasil]”, explica.
Nesse sentido, foram considerados estudos com pelo menos cinco anos de análises. “O que a gente percebeu é que a maior parte dos trabalhos indica que está havendo, sim, declínio de insetos no Brasil. Tem vários trabalhos que indicam estabilidade, até alguns que mostram aumento. Mas o que é preocupante, se a gente pegar só pelo número de trabalho que tem aumento, estabilidade ou declínio, os que mostram declínio são mais comuns”, aponta Freitas.
Os motivos que explicam o declínio não fazem parte do levantamento, mas o pesquisador apresenta algumas hipóteses para esse quadro, considerando dados já encontrados em outras partes do mundo. Ele cita: “o uso indiscriminado de pesticida; o aumento das cidades e de áreas agrícolas e agropecuárias, que diminuem a área de habitat nativo; e, perto de grandes cidades, a iluminação urbana, porque os insetos tendem a ser atraídos pelas lâmpadas, ficam girando e morrem”.
Abelha poliniza flor do Viveiro Manequinho Lopes no Parque do Ibirapuera. – Rovena Rosa/Agência Brasil
Insetos e meio ambiente
O pesquisador reconhece que, muitas vezes, os insetos são associados a coisas negativas, como transmissão de doenças, mas é fundamental lembrar da importância desses animais para o equilíbrio do meio ambiente.
“O declínio dos insetos, de modo geral, vai favorecer poucas espécies-praga. Essas, sim, vão ter um impacto muito maior na nossa vida”, alerta. Ele lembra que grandes desequilíbrios podem fazer com que apenas pragas associadas ao ser humano, como baratas, mosquitos e determinadas formigas, permaneçam, tendo em vista que terão comida e ambiente disponíveis.
A polinização feita pelas abelhas é o exemplo mais conhecido do papel de insetos na manutenção da biodiversidade. Mas há outros benefícios dos insetos para o meio ambiente, como o fato de que eles são o primeiro passo para a decomposição de matéria orgânica.
“Sejam folhas que caem no solo ou animais mortos. Vários besouros, formigas e cupins fazem a primeira degradação desse material. Sem insetos, por exemplo, as florestas seriam cada vez mais troncos e folhas acumulados em cima do outro, porque as bactérias que fazem a decomposição final dependem de uma primeira fragmentação”, explica Freitas.