Um mutirão de limpeza com moradores voluntários realizado no estado do Rio de Janeiro já retirou de circulação cerca de 130 toneladas de lixo desde 2020. O Projeto Novo Mundo foi idealizado pela engenheira ambiental Thaiane Maciel, consultora do Movimento +Água do Pacto Global da ONU (Organização das Nações Unidas) no Brasil, e conta com a parceria da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana).
Graduada pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Thaiane sempre esteve envolvida com causas em prol do meio ambiente. “Quando decidi ir para a graduação, fiquei em dúvida entre seguir com a minha carreira de atriz no curso de cinema e minha paixão por questões relacionadas a sustentabilidade e recicláveis”, lembra a jovem, que optou pelo curso de engenharia ambiental.
“Tudo começou com um canal no YouTube, o Novo Mundo, um projeto de conscientização ambiental na internet com conteúdos de vídeos educativos, como um meio de comunicação. Nele falo sobre o porquê de separar o lixo, produtos orgânicos, aquecimento global, mudanças climáticas, entre outros temas”, diz.
De acordo com dados do Panorama dos Resíduos Sólidos Brasil 2021, em média, cada brasileiro produz, por dia, 1,7 kg de resíduos. Durante a pandemia da Covid-19 a geração de resíduos sólidos urbanos cresceu 4%.
Desde 2020 cerca de 130 toneladas de lixo já foram retiradas no Rio de Janeiro
CRÉDITO/ SARAH MACIEL
Nascida na Ilha do Governador, zona norte do Rio, a engenheira explica que as ações se iniciaram com o apoio da família e de amigos. “Durante as caminhadas que fazia com meu irmão, eu reclamava muito da sujeira do lugar”, conta. “Teve uma vez em que meu irmão chegou até a tirar uma foto dele recolhendo o lixo — ‘Catei aqui pensando em você, já que você só reclama’”, recorda a mensagem enviada pelo irmão.
A mobilização deu certo, e hoje o projeto já ultrapassa 1.500 voluntários. O advogado carioca Fernando Bourguy, 32 anos, um deles, já acompanha o trabalho de Thaiane há alguns anos. “Conheci o projeto pelo Instagram, eu me interesso por questões da área ambiental desde o ensino médio, quando tive a oportunidade de pesquisar formas menos faladas de poluição, como a eletromagnética”, relata.
Um ponto destacado pelo voluntário é a importância do trabalho dos catadores de lixo. “Bastam poucos dias de greve para que as cidades se tornem lixão a céu aberto. Indiretamente, o trabalho de coleta, reunião e separação é indispensável para uma logística circular que use materiais eficientemente, sem desperdícios nem poluição”, observa.
“Nesse cenário, vivo numa cidade contraditória em que uma das tradições do Carnaval é o gari Sorriso, mas em que, ao mesmo tempo, o concurso de gari é usado como exemplo de futuro para maus alunos no colégio”, relata.
Para Fernando, o Rio é singular quando se trata da integração cidade-natureza, mas também carece de higiene desde a fundação. “Milhões de cariocas sofrem com uma péssima qualidade de vida. Por isso muitas pessoas ainda morrem nas enchentes e, paralelamente, os turistas, fonte importantíssima de recursos, são afastados com medo de zika vírus e chikungunya”, diz.
Ainda segundo ele, o projeto dos mutirões é uma bandeira contra esse problema. “Em poucas horas de trabalho, centenas de quilos de lixo são recolhidos”, conclui.
Após coletados, os resíduos são pesados e os comuns são enviados para o CTR- Rio (Centro de Tratamento de Resíduos) para ser transformados em biogás e em chorume para o tratamento de água, ambos os procedimentos utilizados pela indústria. Já todo o material potencialmente reciclável é destinado às 26 cooperativas de catadores credenciadas na Comlurb, a fim de promover a economia circular do lixo.
Moradores voluntários se unem para retirada do lixo
CRÉDITO/ SARAH MACIEL
Outra voluntária é a bióloga Irene de Oliveira Lima, de 24 anos. “Vi no Twitter uma matéria sobre ações de mutirões em praias da Ilha do Governador e logo tive um grande interesse em conhecer o projeto e participar”, conta.
“Atuar na área em que moro foi o pontapé inicial para me dedicar com mais ações às comunidades. A Ilha do Governador é cercada por praias que, quando mais nova, ainda pude aproveitá-las integralmente. Hoje a balneabilidade de todas elas é imprópria, o que me motiva cada vez mais a continuar com mutirões de limpeza e levar a conscientização a todos”, diz. “Um lugar lindo e limpo é bem-visto, as pessoas têm vontade de morar, têm vontade de visitar, e tudo isso se perde quando o local não é um ambiente agradável”, conclui.
Dados do Cempre (Compromisso Empresarial para Reciclagem) revelam que 22% das cidades brasileiras têm iniciativa de coleta seletiva e apenas 17% da população tem acesso a algum tipo de coleta seletiva diferenciada para que esses resíduos possam ser destinados da maneira correta. Com 12 anos de existência, a lei nº 12.305, da PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos), determina que os setores público e privado realizem a gestão de resíduos para evitar que os materiais sejam destinados incorretamente aos lixões, organizando a forma como o país lida com o lixo.
Como participar
Os voluntários interessados nas próximas ações devem preencher um formulário eletrônico pela internet. O único critério exigido para se candidatar é a proatividade. Após a inscrição, os voluntários aprendem nos locais dos mutirões sobre coleta seletiva, decomposição de materiais e o impacto da poluição nos problemas crônicos do Rio de Janeiro, entre eles as enchentes. Também recebem materiais de proteção e de coleta para, então, iniciar as atividades.
A agenda de coletas até o fim do ano inclui: praia de Icaraí (17 de setembro), Rio das Pedras (22 de outubro), praia do Leme e praia do Pontal (12 de novembro) e praia do Flamengo (10 de dezembro). Segundo os organizadores, há planos de expansão do projeto para outras regiões do país. Entretanto, é preciso apoio de empresas e prefeituras dos municípios.
Por Alex Gonçalves, do R7*