Cientistas descobriram como a música ajuda a reduzir a dor e as condições para isso acontecer, como volume baixo, por exemplo. Indo mais a fundo, foi revelada uma conexão entre o córtex auditivo e o centro de processamento da dor, o que nos permite entender ao menos um dos mecanismos em funcionamento no cérebro para que o alívio da dor aconteça.

Já se sabia que a música conseguia diminuir a sensação de dor: profissionais como o dentista Wallace J. Gardner, nos anos 1960, utilizavam fones de ouvido para acalmar a percepção dos pacientes ao invés de óxido nitroso e outros métodos. Segundo Gardner, mais de 5.000 procedimentos utilizando música para efeitos analgésicos foram realizados, sendo que 90% deles não precisaram de anestesias extras. Mas como isso funciona?

Já sabíamos que a música acalma a dor, mas como o processo funciona ainda era desconhecido (Imagem: twenty20photos/Envato)
Já sabíamos que a música acalma a dor, mas como o processo funciona ainda era desconhecido (Imagem: twenty20photos/Envato)

Música, dor e roedores

Desde os anos 1960, cientistas já descobriram as propriedades anestésicas da música: ela pode aliviar dores agudas, como a de cirurgias e partos, e crônicas, como as do câncer. Tudo o que faltava era descobrir como, e uma equipe de pesquisadores chineses e estadunidenses testaram essas propriedades em camundongos, já que manipular circuitos neurais humanos é eticamente questionável.

Utilizar roedores, no entanto, é complicado, já que não sabemos como os animais percebem músicas. Primeiramente, foi preciso notar se eles sentiam os mesmos efeitos analgésico. Um adjuvante que causa dores inflamatórias foi aplicado nos camundongos, e então eles foram expostos a três sons: uma música sinfônica — a Réjouissance de Bach —, uma remixagem desagradável da mesma música e ruído branco.

Todos os sons reduziram a sensibilidade à dor — testada ao tocar os membros inflamados dos animais até que os movessem —, mas só se eram tocados a 50 decibéis (dB), o volume de uma conversa baixa. Como consultórios odontológicos são barulhentos, os cientistas acharam a descoberta curiosa: como Gardner conseguia diminuir a dor dos pacientes?

O som ambiente do laboratório estava a 45 dB. Suspeitando que o volume da música fosse menos importante do que a diferença entre seu volume e o do som ambiente, eles aumentaram o som da sala para 57 dB; assim, a sensibilidade dos roedores diminuiu ao tocar música a 62 dB. Com o volume ambiente a 30 dB, a música a 35 dB funcionava. O som, então, só reduz a dor se está levemente mais alto do que o som ambiente.

Ao serem expostos a música e até mesmo ruído branco, contanto que fosse apenas um pouco mais alto do que o som ambiente, os camundongos tiveram uma redução na sensação de dor (Imagem: twenty20photos/envato)
Ao serem expostos a música e até mesmo ruído branco, contanto que fosse apenas um pouco mais alto do que o som ambiente, os camundongos tiveram uma redução na sensação de dor (Imagem: twenty20photos/envato)

Como o cérebro processa isso?

Para investigar mais a fundo, os cientistas injetaram uma tinta traçante no córtex auditivo dos camundongos, que revelou uma rota entre essa parte do cérebro e o tálamo, uma estação de retransmissão para o processamento de sinais sensoriais, como dor, gosto e som. Todos os órgãos sensoriais têm uma conexão com o tálamo, mas essa conexão em particular era incomum.

Ao ouvir música, imaginava-se que a comunicação neural do córtex auditivo com o tálamo aumentasse — mas, quando a música toca no volume baixo determinado pela pesquisa, a conexão neural em questão parava de transmitir informação. Para confirmar o envolvimento desse caminho no alívio da dor, os pesquisadores bloquearam o circuito neural envolvido. Os roedores passaram a sentir menos dor: bingo!

Assim, descobriu-se que ouvir música baixa, um pouco mais alta do que o som ambiente, prejudica a comunicação entre o córtex auditivo e o tálamo, diminuindo o processamento da dor e servindo de forma analgésica. Embora se espere que as conexões neurais envolvidas no cérebro humano sejam mais complicadas, identificar esse fenômeno pode ajudar no desenvolvimento de formas alternativas para tratar a dor no futuro.

Fonte: Pain Manag Nurs.Science 12

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