Por Vitor Nuzzi, da RBA – A “cabeça do eleitor” foi o tema de debate promovido na manhã desta terça-feira (26) pela Fundação Fernando Henrique Cardoso, com mediação do cientista político Sergio Fausto, diretor da entidade. Para os participantes, a economia terá um peso eleitoral bem maior do que nas últimas eleições presidenciais. Eles enfatizaram ainda a busca por um “centro” político como fator decisivo. E consideram que a disputa já está consolidada entre apenas dois candidatos.
Com inflação e desemprego elevados, a economia estará “muito presente na preocupação do eleitor”, como não se via talvez desde 1994 (ano de criação do Plano Real), avalia Maurício Moura. Segundo o economista, presidente do Instituto Ideia e pesquisador da George Washington University (EUA), é um assunto de responsabilidade direta do presidente da República, pelo lado positivo ou negativo. “É um tema que o presidente não consegue terceirizar.”
Caneta na mão
Segundo o analista, Jair Bolsonaro tem avaliação inferior à de seus antecessores em igual período. Por isso, parte “de um patamar menor”, embora mostre curva positiva, como costuma acontecer em ano eleitoral. “Ele tem a caneta e pode reagir à rejeição de forma mais contundente”, observa Moura.
De acordo com sua análise, o atual presidente tem uma “base forte” em torno de 20%, enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva consolida 30%. Ele acredita que a definição será apertada. E definida por aqueles que votaram em Dilma Rousseff no segundo turno em 2014 e no próprio Bolsonaro em 2018. Uma questão de cinco a 10 pontos percentuais, concentrada, principalmente, nas áreas metropolitanas da região Sudeste.
Eleitor indeciso e vulnerável
A socióloga Esther Solano vê ainda eleitores do Sul e do Sudeste, e das chamadas classes C e D, ainda muito indecisos e vulneráveis. Por fatores econômicos e também pelo que ela classifica de “existenciais”. Entre a raiva e o afeto, segundo a doutora em Ciências Sociais pela Universidad Complutense de Madrid e professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Por um lado, há uma visão negativa desse eleitorado em relação a alguns aspectos de Bolsonaro: desumano na pandemia, responsável pela instabilidade econômica, agressivo e autoritário ao governar. “São elementos ‘trabalháveis’ em certo sentido”, diz Esther, para quem a “raiva” diminui na medida em que também se reduz a percepção sobre a pandemia.
Tempos melhores anos atrás
Mas há a questão econômica, daquele que não consegue pôr comida na mesa e pagar as contas em dia. Era um eleitor que em 2018 tinha raiva alimentada pela retórica lavajatista e começa a repensar. Existe certa associação (“afeto”) com tempos melhores vividos em governos anteriores. “Essa reconexão com o Lula ainda é frágil”, acrescenta Esther. Existe, por exemplo, muita atenção por parte de evangélicos sobre a postura do petista no “campo moral”. E há também o “turbilhão comunicacional bolsonarista” nas redes sociais. Nesse aspecto, Moura vê desvantagem para o PT, pela “capacidade e competência” de apoiadores do atual presidente de espalhar narrativas. Mas com limites: “O Bolsonaro não é mais oposição, então, é muito mais difícil criar um fato sobre o Lula, por exemplo. Acho difícil criar uma fake news nova”. O maior risco, acredita, é o uso das redes para uma possível tentativa de deslegitimar o processo eleitoral.
O absenteísmo é outro fator importante na definição. Moura afirma que a abstenção costuma ser maior entre pessoas de mais escolaridade. Ele também considera importante saber se haverá segundo turno nos maiores colégios eleitorais, como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
O desafio, então, é manter o eleitorado de alguma forma já consolidado e buscar apoios mais ao centro. Para Esther, o apoio de Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira, por exemplo, afasta o público mais moderado. Para Moura, o atual presidente terá muita dificuldade se decidir falar apenas com sua própria base. “Não acredito em você ganhar a eleição radicalizando. Matematicamente, só tem perdido.”
Já com Lula, a aliança com o ex-governador e ex-tucano Geraldo Alckmin pode ser positiva, observa Esther. Desde que, na percepção de uma parcela do eleitorado, ele “desradicalize” o PT e aponte para o centro, em vez de caminhar para a esquerda. “A calibragem é muito complexa”, avalia.
Fonte: Poder