Geralmente, esse é o nosso primeiro pensamento quando nos deparamos com uma inovação genuína, isto é, aquelas de eficiência inquestionável, aparentemente óbvias, e que nos transmitem a sensação de que a solução sempre esteve bem debaixo de nosso nariz.
Como assessor de imprensa e escritor, me deparei com algumas startups com esse perfil ao longo do tempo e muitas delas se tornaram unicórnios ou foram adquiridas por gigantes. E essas experiências me mostraram que uma solução simples e eficiente é alicerçada por uma cultura que propicia a inovação.
Mas afinal de contas, o que é cultura e o que é inovação?
Segundo o dicionário Michaelis, cultura é o “conjunto de conhecimentos, costumes, crenças, padrões de comportamento, adquiridos e transmitidos socialmente, que caracterizam um grupo social”. Em outras palavras, cultura não é estética, é modo de viver. Já o verbo inovar é descrito como “Introduzir novidades, produzir ou tornar algo novo; renovar, restaurar”. Ou seja, para inovar, não necessariamente é preciso criar uma coisa do zero. Inovar é resolver um problema complexo mal resolvido ou não resolvido, é tornar simples algo que era complexo e é possível juntar coisas que já existem, melhorá-las e transformá-las em algo novo.
Portanto, a inovação não é um evento isolado, mas sim uma cultura que deve ser cultivada em todos os níveis de uma empresa.
Neste artigo, elenco quatro dicas essenciais para criar um ambiente propício à inovação, onde a criatividade e a resolução de problemas se tornam parte do DNA organizacional. Todas elas foram colhidas em campo e são fruto de análise ao longo dos anos.
Conheça 4 dicas para criar um ambiente inovador:
1. Desenvolva autonomia no time
A autonomia é um pilar fundamental para a promoção da inovação. Quando os membros de uma equipe têm a liberdade de tomar decisões, eles se sentem mais motivados e engajados. Para desenvolver a autonomia em sua equipe, é importante estabelecer confiança, delegar responsabilidades e criar um ambiente onde os erros sejam vistos como oportunidades de aprendizado.
Até aqui, tudo muito bonito, mas existem desafios concretos para estabelecer essa cultura.
O primeiro ponto é bastante duro: nem todo mundo tem perfil autônomo. Muitas pessoas querem o bônus da liberdade, mas não o ônus. Porque resolver problemas sem receber uma ordem para tal também é uma característica rara. Portanto, estabelecer uma cultura de inovação requer um departamento de Recursos Humanos bastante afiado.
O outro ponto é compreender que, embora o erro faça parte do processo, a meta é o acerto o mais rápido possível pelo menor custo. Neste contexto, é preciso estabelecer indicadores, metas e modelos analíticos que conduzam o time e a empresa para a construção desse resultado.
Por fim, mas não menos importante, é o ambiente. Grandes empresas e indústrias possuem regras rígidas de governança e segurança que precisam ser seguidas à risca. E isso está correto, porque envolve a segurança dos seus clientes e consumidores. Por essa razão, bancos nunca serão tão ágeis como uma fintech em estágio inicial, mas fintechs podem errar, o banco não. Não se trata, portanto, somente de dinheiro, capacidade intelectual, estrutura ou necessidade: a inovação precisa de um ambiente para surgir.
2. Acostume seu time ao uso da tecnologia
Uma coisa que eu percebi ao longo do tempo é que as pessoas têm resistência para o novo, mas em determinado momento, elas começam a aceitar. Mas as coisas podem demorar a fluir, seja por mal uso, pela cultura do público-alvo, ou até porque a tecnologia é incipiente e ainda precisa de ajustes. No meu segundo livro, Ouvir, Agir e Encantar, o CEO do Grupo MOVE3, Guilherme Juliani, conta que instalou mais de 200 robôs AGVs no seu galpão logístico, o que triplicaria a capacidade de roteirizar encomendas, de 6 mil pacotes por hora para 17 mil na época.
Isso aconteceu com o tempo, mas os robôs precisaram ser adaptados para o peso e formato dos pacotes, houve necessidade de integrar a tecnologia com as pessoas, preparar o solo, entre outras coisas. Na prática, a introdução da tecnologia gerou um trabalho de treinamento, atrasou o ritmo da empresa em um momento inicial para, depois, acelerar o ritmo e atingir o objetivo. Valeu à pena, mas houve uma transição, porque a transformação digital é também cultural. E essa questão não é nova, muito pelo contrário:
Em 1929, um juiz mineiro optou por datilografar uma decisão utilizando sua máquina de escrever, aparelho que ainda não era totalmente popular no país. Algum tempo depois, a Câmara Criminal do Tribunal da Relação de Minas Gerais (correspondente do atual Tribunal de Justiça do Estado) anulou a decisão. O motivo? À época, não se aceitavam documentos judiciais que não fossem produzidos pelos magistrados com o próprio punho.
Ainda hoje – no universo administrativo, jurídico e contábil – é comum se deparar com gavetas de arquivos com toneladas de papéis ou então com pessoas usando calculadoras e preenchendo o excel, enquanto o próprio software poderia fazer isso com mais precisão e agilidade.
Por fim, a tecnologia é uma ferramenta poderosa para impulsionar a inovação, mas apenas se for utilizada de maneira eficaz e se as pessoas forem treinadas para seu uso.
3. Sometimes, the old way is the best way
Embora a tecnologia e as novas abordagens desempenhem um papel crucial na inovação, é importante lembrar que nem sempre a resposta está na última tendência. Às vezes, métodos mais antigos e tradicionais podem ser a chave para a solução de problemas complexos. A ideia aqui é manter um equilíbrio entre o tradicional e o moderno.
Muitas vezes, a maneira mais eficiente para o gerenciamento de uma crise é uma conversa olho no olho. A melhor estratégia de venda ainda é a indicação por resultado. Não é necessário estar presente em todas as redes sociais dando opinião sobre tudo ao mesmo tempo. O melhor investidor não está no mercado financeiro: a melhor estratégia é crescer com o dinheiro da satisfação do seu cliente.
Não descarte métodos e práticas que funcionaram bem no passado. Em vez disso, avalie cuidadosamente quando e como aplicá-los em conjunto com as inovações mais recentes.
4. Inovação precisa ser útil
A inovação não deve ser uma busca por novidade por si só, mas sim ser verdadeiramente útil para os clientes. E se isso parece uma afirmação óbvia, saiba que ela não é. A pesquisa Top 20 reasons Startups Fail, realizada pela Insights, aponta que em 42% dos casos, a startup vai à falência porque o produto ou a solução criada não resolve um problema real do mercado.
Não é incomum que empreendedores estejam tão apaixonados por sua ideia que simplesmente não consigam enxergar a falta de aderência. Muitas vezes, de fato, há uma inovação ali, mas ela precisa de ajustes para ganhar escala, o que se chama no mercado de pivotagem, isto é, quando uma empresa acaba mudando de rota.
Portanto, antes de investir recursos significativos em novas ideias, é fundamental avaliar como elas atendem às necessidades do mercado. Lembre-se: a inovação precisa ser orientada pela utilidade.
Texto: Eduardo Cosomano